domingo, 30 de março de 2025

RIP Richard Chamberlain: um ator que "parecia ter sido esculpido por um deus amoroso a partir de manteiga, mel e graça"

Esta frase brega (*"parecia ter sido esculpido por um deus amoroso a partir de manteiga, mel e graça"*) apareceu no jornal The Guardian como um elogio ao então jovem ator Richard Chamberlain (1934-20025), estrela da série de TV Doutor Kildare.  Achei boa o suficiente para colocá-la no título e não poderia deixar de falar de um dos atores que eu mais amava na passagem da minha infância para a adolescência.  Richard Chamberlain morreu ontem, a notícia foi divulgada hoje, e ele faria aniversário amanhã.  Quase 91 anos é uma longa vida.

Chamberlain era ator e cantor.  Começou no teatro, mas explodiu como estrela ídolo das adolescentes no seriado Doutor Kildare, quando já tinha 27 anos.  Antes de poder se dedicar à carreira, serviu na Guerra da Coreia e se formou em História (*descobri agora que ele era historiador*) e Artes.  Fez muitos papéis na TV, e quem trabalhava na televisão até o início do século XXI não era bem visto como hoje, era o destino de quem não conseguira brilhar no cinema ou estava em fim de carreira mesmo.  Chamberlain, para ser respeitado como ator, dedicou-se ao teatro por vários anos, foi para a Inglaterra, mas terminou retornando para a TV, sendo aclamado por papéis marcantes.  O Padre Ralph de Bricassart de Pássaros Feridos (1983) pode não ter sido o seu melhor papel, mas o transformou em ídolo mundial.  Na época em que o SBT exibiu com grande alarde a série, eu era criança e não pude assistir, só pude ver mesmo quando adulta.   Na casa dos meus pais era obrigatório que a televisão estivesse na Globo na hora do Jornal Nacional e das novelas.  Não havia discussão.  Graças à série, li o livro, que é muito bom, por causa da série, mas, como sempre acontece comigo quando assisto um filme antes, as personagens têm a voz e o rosto da adaptação, salvo raras exceções.

Em  2003, ele publicou a sua autobiografia chamada "Shattered Love: A Memoir" e confessou que ea homossexual.  Quem acompanhou essa saída do armário e as falas do ator (*o G1 reproduziu algumas, hoje*), sabe o quanto foi difícil para ele, aliás, ele escondeu um casamento por mais de duas décadas.  Em 2014, ele disse em uma entrevista "Quando você cresce nos anos 1930, 1940 e 1950 sendo gay, não é apenas difícil, é simplesmente impossível".  Em 2010, ele deu entrevista na qual aconselhava atores gays a não saírem do armário pelo bem da sua carreira.  Lembro que quando ele se assumiu, eu fazia parte de um grupo sobre romances de época no Orkut e criou-se uma confusão enorme, muitas das mulheres da comunidade dizendo que era um absurdo, que não assistiriam mais Pássaros Feridos, foi um festival de horrores.  

Ainda é possível encontrar vídeos de Pássaros Feridos no Youtube, coisa antiga, com esses comentários repulsivos.  Lembro de um que dizia que agora entendia por qual motivo ele parecia ter nojo nas cenas de beijo e intimidades na série.  Não havia nada disso, simplesmente, os avanços e recuos do Padre Ralph estavam ligados diretamente ao seu drama mais íntimo.  ele não podia ter nada com a Maggie, ele era padre (*depois, bispo, arcebispo, cardeal*).  

Enfim, é por isso que acho tão espetacular que o Jonathan Bailey consiga estar no lugar em que está, fazendo vários tipos de personagens, inclusive o galã hetero, sem sofrer o rechaço ou ser humilhado.  Pelo menos em nossos dias, parece, e espero não estar sendo otimista demais, que as pessoas estão conseguindo separar melhor a orientação sexual de um ator ou atriz da personagem que a pessoa está interpretando.  Em décadas passadas, e nem faz tanto tempo assim, vide o Leonardo Vieira (*da Renascer original*), era armário e a obrigação de manter relacionamentos públicos de fachada, casar até, para conseguir se manter como galã, seja em Hollywood, ou em qualquer outro lugar.

Enfim, vocês já sabem que eu gosto muito do ator.  Richard Chamberlain era uma figurinha fácil na Sessão da Tarde ou na programação de filmes do SBT.  Ele foi Aramis nos Três Mosqueteiros (*foi aí que caí de amores por ele*), foi Filipe e Luís no Homem da Máscara de Ferro, foi Allan Quatermain (*que é uma personagem literária*) em dois filmes (*As Minas do Rei Salomão e A Cidade do Ouro Perdida*).  Ele foi, também, o Conde de Monte Cristo (*devo ter assistido, mas não lembro detalhes*), estrelou Shogun (*mas eu não vi a minissérie*), foi Casanova (*que minha mãe não me deixou assistir por causa do horário, mas o ângulo da minha cama era quase perfeito para ver a televisão e eu assisti vários fragmentos*).   A última vez que o vi atuando foi no episódio Steams Like Old Times da série Will & Grace, no qual ele fingia que era um homem gay.  

Mas por qual motivo comecei a pensar em Richard Chamberlain ontem?  Eu estava me lembrando da resenha que fiz de The Slipper and The Rose, uma versão de Cinderela na qual Chamberlain é o príncipe solteirão que quer se casar por amor.  É um musical, é bonitinho, e tem a melhor fada madrinha de qualquer adaptação live action de Cinderela.  Eu recomendo.  A resenha está aqui.  

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