sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

O novo trailer do filme da Branca de Neve ficou muito melhor do que eu imaginava

Desde que as primeiras informações sobre o live action da Branca de Neve começaram a sair, foi só polêmica e derrota, por assim dizer (*fiz post sobre isso*).  Houve rechaço em relação a escolha de uma atriz de ascendência latina para o papel e Rachel Zegler não ajudou ao emitir uma série de opiniões que, à guisa de parecerem empoderadoras, acabaram sendo equivocadas e apressadas, ajudando os reacionários de plantão a começarem a campanha contra o filme.  

A escolha de Gal Gadot para rainha má atiçou ainda mais os críticos, porque, bem, a atriz israelense parece aos olhos de muitos muito mais bonita que Zegler.  Fora isso, Gadot tem uma militância muito forte e polêmica em relação seu país natal, isso agrada aos reacionários e, claro, desagrada aos progressistas.  Zegler se posicionar publicamente a favor dos palestinos, no que ela e outros artistas fizeram muito bem, atiçou ainda mais a cizânia.  Outro problema ligado ao filme, foi a crítica antecipada feita por  Peter Dinklage, o mais importante ator com nanismo da história do cinema, ter feito declaração quanto contra o caráter estereotipado dos anões da Branca de Neve.  A resposta da Disney, em minha opinião, foi a pior possível.  

Sete atores e atrizes (*sim, por qual motivo, não?*) poderiam ser escalados para o filme e o papel dos anões poderia ganhar nova dimensão.  mas a escolha do estúdio foi transformá-los em criaturas mágicas e usar CGI.  Os primeiros teasers e trailers foram particularmente ruins ao retratar as criaturas mágicas, porque, sim, poderiam ser seres mágicos, há essa possibilidade, e eu fiquei esperando pelo pior.  

O fato é que eu, Valéria, gosto da leitura feita no filme Branca de Neve na Floresta Negra (Snow White: A Tale of Terror), minha releitura favorita do conto no cinema, que abandona o aspecto mágico e coloca os anões como proscritos, pessoas perseguidas (o anão, o surdo mudo, o sujeito que matou seu senhor, o cruzado que traiu seus votos etc.) e a floresta como o lugar da liberdade, algo que faz parte do imaginário medieval e do início da Idade Moderna.   Branca de Neve acaba ficando com um dos "anões", aliás, já que o príncipe acaba sendo morto pela Rainha Má depois de dar uns pulinhos com ela.

Enfim, a ideia de guerra cultural como negócio, e muita gente já analisou isso, pode ajudar um filme a vender, vide o caso de Barbie, mas assustou a Disney que atrasou o filme em meses.   Ao invés de colocar mentes aguçadas e que compreendem esse jogo para trabalhar a favor do filme, o estúdio se mostrou covarde e perdeu a chance de lucrar com todas as polêmicas possíveis de um lado e alimentar a ideia de que o filme seria lindo, uma bela homenagem ao clássico de 1937, e "para toda a família" do outro.  Comunicação é um problema da Disney em nossos dias, sabe?  Mas vamos ao trailer que saiu ontem.  Ele está abaixo, depois, eu volto.

Já começa trazendo uma informação sobre o nascimento da princesa, o que é importante e didático, porque os racistas estão babando pelos cantos da boca desde o anúncio do filme.  No conto original dos Irmãos Grimm (1812), é dito que a rainha estava bordando sentada a janela, quando fura o dedo e três gotas de sangue caem na neve que se acumulara na madeira escura.  Ela deseja então ter uma filha com a pele branca como a neve, lábios vermelhos como o sangue e cabelos negros como o ébano.  

Acabei de abrir o filme da Disney de 1937 e nada é dito sobre a origem do nome da protagonista.  A história já começa com a mocinha órfã e sendo maltratada pela rainha que teme por sua crescente beleza.  ZERO informação sobre pai, mãe e origem da princesa.  O filme de 2025 será uma nova leitura, então, pouco importa, até por não importar em 1937, essa origem da mocinha.

O trailer do filme mostra que a princesinha aparentemente nasceu em uma carruagem durante uma nevasca, por isso, seu nome e o rei, seu pai, acreditar que sua filha seria forte e com um caráter impressionante, por isso, o "fair" será usado, também, como sinônimo de "justa".  Se bem me lembro, porque faz muito tempo que não assisto, em Floresta Negra, a princesa também nasce na carruagem.  Há um acidente, a mãe dá à luz e morre, deixando o rei viúvo com uma filha recém-nascida nos braços.  

Depois disso, é mostrado que Branca de Neve teve uma família amorosa, isso foi feito no live action de Cinderella, também, embora o foco no novo filme seja no pai.  Não vemos a princesa em andrajos, mas em conflito com a rainha má que é excessivamente cruel com todos.  E, sim, vamos para o espelho.  Zegler, nas suas falas desastradas, defendeu que o "fair" do original não seria "bela", mas "justa".  Os dois significados são possíveis, mas no contexto do conto e da animação de 1937, não fica dúvida alguma do significado escolhido. A rainha, não a princesa, era obcecada pela beleza e pela juventude.

Mulheres não deveriam disputar para serem a "mais bela", como feminista, concordo, mas veja que a Rainha Má é assujeitada a esse contexto de feminilidade ideal e o conto original, a seu modo, e a animação de 1937, colocam isso em questão.  Essa discussão é muito importante e não deveria ser escanteada.  Quantas loucuras as mulheres fazem para parecerem belas, jovens e desejáveis... para quem?  Um?  A beleza de Branca de Neve vem de seu coração, mais do que de seu exterior, ainda que ela seja inegavelmente bela e mais bonita ficará conforme cresça e amadureça.  

Claro, isso dá um nó na cabeça dos redpills e assemelhados que valoram uma mulher pela sua beleza exterior, pela sua juventude (*fertilidade*) e pela sua inexperiência sexual (*o que não vem o caso na guerra contra o live action da Branca de Neve*), mas o trailer mostrou uma cena juntando espelho mágico, joias e uma Branca de Neve revestida de simplicidade, que foi feita para ser didática.  Eles não vão querer entender, mas as pessoas que não estão dentro do espectro dessa perversão ideológica devem captar a mensagem.  A Rainha é bela, sem dúvida, mas somente por fora, ela é vaidosa e superficial.  Temos Branca de Neve bela, modesta, bondosa, justa e uma Rainha que é inegavelmente bela, mas é má.  

Por fim, introduziram o príncipe como interesse romântico da mocinha e fazendo mais coisas que no conto, ou no filme de 1937, no qual ele e Branca de Neve cantam, se apaixonam e só se reencontram no final.  E, vejam bem, eles se conhecerem antes da cena da floresta com ela "morta" é uma das boas sacadas da Disney (*veja o primeiro link do post, discuto isso lá*).  No conto original, o príncipe não conhece Branca de Neve, nunca interagiu com ela, ele se apaixona por um CADÁVER e pede aos anões que lhe deem seu corpo belo e morto.  Isso é muito, muito, bizarro.

A Disney não deu personalidade para o príncipe, ele é um lugar social, um ponto de fuga e segurança para a nossa mocinha.  Teremos que esperar por Filipe da Bela Adormecida, meu príncipe favorito, para que ele tenha nome, tenha personalidade e faça alguma coisa importante na história.  Em Branca de Neve e Cinderella, nem nome o príncipe tem.  Depois de sei lá quantos anos, a Disney inventou que o príncipe se chamava Florian. 

No filme, ele será Jonathan (Andrew Burnap) e não será um príncipe, mas um plebeu que se torna da nobreza ao se casar com a princesa.  Um herói das camadas populares, será?  Talvez, depois das falas problemáticas de  Zegler que ressaltou que a princesa não seria salva pelo príncipe e que não se tratava de uma história de amor.  Essa seja uma ideia.

Como já reclamei de outros produtos da Disney (Ex.: Wish, Divertidamente 2), amor faz parte da vida de maioria das pessoas, tirar o amor da vida das mulheres não vai torná-las mais fortes e empoderadas.  Por outro lado, uma mulher não é forte somente quando está com uma espada na mão.  Algo que me deixou com o pé atrás no trailer é Branca de Neve cavalgando (*como um homem, claro, mesmo que usando vestido*) e liderando seu povo. Jonathan diz que ela precisa fugir, a mocinha retruca dizendo que ela pretende lutar.  

Ela não está com uma arma na mão, não é Branca de Neve e o Caçador, mas se tornou comum de forçar esse tipo de protagonismo, quando, efetivamente, Branca de Neve não precisava ser assim.  Já temos Pocahontas, Mulan, e a cavalgada louca do live action da Bela e a Fera já foi meio desse jeito.  Se ela fosse salva pelo príncipe (*que não é príncipe*), se ele se mostrasse parceiro (*como no novo a Pequena Sereia*) e se sacrificasse por ela, qual seria o problema?

Pelo trailer, se Branca de Neve comer a maçã envenenada, isso não será o final da história, mas algo antes do confronto com a Rainha Má, eu suponho.  E, falando em maçã envenenada, a fala mais problemática de Zegler em relação ao príncipe, foi associá-lo a um stalker.   Em 1937, eles se conhecem no poço e o lugar é importante no live action, também, ele está em destaque no trailer.  Florian estava de passagem e se apaixonou pela mocinha.  Ele continuou a procurá-la, porque a amava e a encontrou "morta" na floresta.  

O beijo naquele contexto sempre me pareceu um ato de adoração, de homenagem final, carregado de grande ternura e expressão de dor até.  Florian não era um stalker.  De onde as pessoas tiram essas ideias?  Deve ser do mesmo lugar em que imaginam que esse beijo foi um ato não consentido por parte do cadáver e, não, uma despedida carregada de sentimento.

Faltou falar de músicas.  No trailer, vemos que há mais de uma canção nova no filme.  Imagino que seja duas ou três, Branca de Neve não era tão cheio de canções, acredito, como outras animações da Disney que vieram depois.  E o CGI, algo que eu não sei julgar bem, pareceu muito, muito, muito melhor.  Os bichinhos estavam simpáticos, diferentemente do que ocorreu com A Pequena Sereia, e os anões pareciam bem melhores.  Espero que o investimento resulte em um bom filme e ele se saia bem nas bilheterias, apesar da gritaria do povo que acredita em cultura woke.

Sim, sei que terei muito a falar do filme, aliás, espero ter, quero vê-lo no cinema e será do jeito que der, muito provavelmente, dublado.  Minha filha, contaminada pelo disse-me-disse e por concordar comigo que todos esses live actions são desnecessários, avisou que não quer ver.  Economizarei.  Agora, algo bom é que os comentários, seja no trailer dublado, ou legendado, são menos nojentos e racistas que os anteriores.  

Espero que isso aponte para um comportamento menos doentio por parte do público que frequenta a caixa de comentários do Youtube, mas eu não tenho esperanças e já imagino escrevendo um post ano que vem sobre comentários horrorosos e o ódio destilado na internet contra o filme, como foi no caso de A Pequena Sereia.

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