Este é um dos posts políticos que não faço faz tempo. Se não quiser continuar, basta pular. Há muitos outros posts no Shoujo Café que podem lhe interessar. Sigamos!
A Copa América terminou no domingo, 14 de julho, data da Revolução Francesa. A Argentina venceu a Colômbia. Até ontem, sabia somente da confusão e do quebra-quebra que atrasou e muito a final. Nada que quem acompanhe futebol não tenha visto acontecer em algum momento, mas nos Estados Unidos, nunca tinah rolado uma selvageria assim no futebol, eu imagino. OK.
Ontem, porém, fiquei sabendo que o o subsecretário Julio Garro afirmou em entrevista que canto colocava país em 'situação ruim' e pediu que a seleção se retratasse. O resultado foi a demissão de Garro com a seguinte mensagem partida do gabinete do presidente Javier Milei: "A Presidência informa que nenhum governo pode dizer o que comentar, o que pensar ou o que fazer à Seleção Argentina, Campeã Mundial e Bicampeã Americana, ou a qualquer outro cidadão. Por isso, Julio Garro deixa de ser Subsecretário de Esportes da Nação.". Mas o que havia na música que foi puxada e divulgada pelo jogador Enzo Fernández, contratado pelo Chelsea na Inglaterra?
"Eles jogam pela França, mas são de Angola. Que bom que eles vão correr, se relacionam com transexuais. A mãe deles é nigeriana, o pai deles cambojano, mas no passaporte: francês"
Vocês conseguem entender o quanto esses versinhos são horrendos, repulsivos, absurdos? Eu fiquei enojada mesmo, como é possível gravar isso e colocar com orgulho na internet? Racismo, aliás, é coisa antiga no futebol argentino, os brasileiros volta e meia são chamados de monos (*macacos*), mas deveria ter ficado no passado. Segundo o UOL, ela tinha sido cantada por torcedores argentinos na copa do Catar em 2022 (*citando Mbappé, inclusive*), a letra está até amenizada. Mas qual o motivo disso tudo? Não foi a Colômbia o adversário derrotado?
Muito bem, para você que mora em outro planeta, assim, tipo meu marido que não liga para futebol e evita o noticiário político por motivos de saúde, a extrema-direita na França, cuja bandeira mais visível é o discurso racista contra imigrantes e seus filhos e filhas, sofreu um revés espetacular, porque tinha vencido o primeiro turno, nas eleições legislativas francesas. Para a extrema-direita local, a seleção de futebol do país não representa a França adequadamente, porque é majoritariamente negra e formada por filhos de imigrantes. Aliás, o líder maior da extrema-direita francesa, Jordan Bardella, também é, porque é de ascendência italiana e argelina, mas quem se importa, não é mesmo? Ele tem a cor de pele adequada e a religião certa.
Durante o segundo turno, vários jogadores da seleção francesa tiveram um papel importantíssimo na campanha contra a extrema-direita, em especial, Kylian Mbappé, estrela do time. Ele fez campanha contra a extrema-direita, assim como nosso craque Raí, que mora na França e vai carregar a tocha olímpica. Vou colocar o vídeo dele no final do post, porque raramente via alguém sintetizar tão bem os ideais da Revolução Francesa e do Iluminismo.
Muito bem, Mbappé já foi apontado como tendo namorado uma mulher trans. A França perdeu a final da Euro para a Espanha, cuja principal estrela é um adolescente filho de imigrantes, mas a extrema-direita mundial se sentiu representada, porque, sim, os neofascistas estão em um eixo internacional, na vitória espanhola. Para quem não sabe, algo que incomoda muito os racistas é o fato de na França, nos Estados Unidos, no Brasil, também, enfim, funcionar o jus soli (lei do solo), quem nasce no país é seu cidadão por lei e direito. Fora isso, países colonialistas, caso da França, estão ligados de alguma forma as suas ex-colônias, no caso da França, de forma muito efetiva até hoje. A imigração tem a ver com esses laços e uma dívida histórica, por assim dizer.
Acredito que o tal Enzo Fernández se sentiu estimulado a fazer a gracinha, afinal, ainda era a data da Queda da Bastilha, e o resto da seleção acompanhou e Messi, grande estrela do time, está em silêncio. Foi horrendo. O subsecretário se pronunciou e foi punido. Por fim, a vice-presidenta, Victoria Villarruel, que é ligada à grupos que defendem a ditadura militar argentina, saiu defendendo a seleção de seu país, seu racismo e sua transfobia e cito o UOL, mas o artigo traz o post da autoridade:
"Victoria Villarruel se manifestou no X (antigo Twitter), nesta quarta-feira (17). A vice-presidente afirmou que "nenhum país colonialista vai intimidar" a Argentina. Ela também chamou os franceses de "hipócritas" e pediu que as pessoas "parem de fingir indignação". Por fim, Victoria afirmou que "banca" Enzo Fernández, jogador que gravou o momento do cântico racista e transfóbico e agradeceu a Messi."
Enfim, a vice argentina instrumentalizou o imperialismo da forma mais livre possível para justificar o direito ao racismo. O próprio presidente argentino postou em sua conta no Twitter que criticava a cobrança de "desculpas a alguns europeus colonizadores por uma música que também diz a verdade". Absurdo, enfim. O Chelsea, time de Fernández se pronunciou em nota oficial, após o pedido de desculpas do jogador:
"O Chelsea Football Club acredita que todas os comportamentos discriminatórios são completamente inaceitáveis. Nós nos orgulhamos de ser um clube diverso e inclusivo, em que pessoas de todas as culturas, comunidades e identidades se sentem bem-vindas. Tomamos conhecimento e valorizamos o pedido público de desculpas do nosso jogador e usaremos essa oportunidade para educar. O clube instaurou um processo disciplinar interno.", comunicou a equipe inglesa.
Pode dar ruim para o engraçadinho, não é? O salário de Enzo Fernández não é pago por Milei. E como foi o pedido de desculpas de Fernández e cito da BBC:
""Quero pedir desculpas sinceras por um vídeo postado no meu canal do Instagram durante as comemorações da seleção. A música inclui uma linguagem muito ofensiva e não há absolutamente nenhuma justificativa para essas palavras", disse o atleta" "Oponho-me à discriminação em todas as suas formas e peço desculpas pela euforia das comemorações na Copa América. O vídeo, aquele momento e essas palavras não refletem as minhas crenças ou o meu caráter”, acrescentou."
Se arrepende NADA, só vai colocar a mão na consciência se pesar no bolso. Mas bobo ele não é, porque, na Inglaterra, onde ele trabalha, a coisa não pegou nada bem. Como teremos Olimpíadas na França, o técnico da seleção argentina veio à público tentar colocar panos quentes, mas piorou as coisas, eu diria:
"Se existe algo que nós argentinos não somos é racista, longe disso. Acho que tudo foi tirado de contexto", disse o ex-Barcelona, à agência AFP." " Eu conheço o Enzo, é um bom garoto e não tem nenhum tipo de problema com isso. O que acontece é que muitas vezes, dentro de uma comemoração, pegam uma parte de um vídeo e tiram de contexto – insistiu Mascherano." "Muitas vezes é preciso entender a cultura de cada país e muitas vezes o que entendemos como uma brincadeira pode ser mal interpretado em outro lugar", disse o treinador."
Argentinos não são racistas, mas é preciso compreender a cultura do país. Aham... Daí, vem e diz que a coisa foi tirada de contexto e isso quando o próprio autor da façanha, Enzo Fernández, já tinha se desculpado. O fato é que a Federação Francesa de Futebol se pronunciou com dureza, não esperava menos, e pediu punição à FIFA, alguns jogadores também se posicionaram, e a FIFA abriu investigação. E, claro, podemos ter violência nas Olimpíadas.
Depois desse posicionamento do governo argentino, do silêncio (*se alguém se posicionou, me passem o link, por favor!*) do Messi e outros membros da seleção, e a tentativa de naturalizar como "parte da cultura do pais" essa nojeira, a FIFA e o Comitê Olímpico fariam bem em punir a Argentina. Multa e uma bela suspensão de eventos internacionais. E espero que o tal Enzo Fernández passe um aperto na Inglaterra, que ande certinho daí para frente, ou volte para casa, onde, ao que parece, passou a ser admissível ser aberta e orgulhosamente racista e escroto por conta de um governo de extrema-direita. E, como disse que faria, abaixo está o vídeo do Raí. Isso, sim, faz a gente se orgulhar:
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