Não assisti a final da ginástica artística por equipes. Estava tão nervosa que acreditei que não iria suportar. Olhei o Twitter e os trend topics falavam em injustiças da arbitragem. Normal, normalíssimo, para que os brasileiros cheguem ao topo em determinados esportes em que a avaliação pode ser um tanto subjetiva (*ginástica artística e rítmica, nado sincronizado etc.*) é preciso trabalhar dobrado. O erro conta mais do que o cometido por atletas de países com tradição nesse tipo de esporte.
Enfim, por essas e outras, eu não tive coragem de olhar até que veio a notícia da medalha. Bronze que vale ouro, porque acompanho faz tempo as lutas da ginástica brasileira. Acredito que foi em Seul (1988), eu era criança, e me lembro de uma reportagem com Luisa Parente, única representante do Brasil, caminhando com sua mochila rumo ao estádio. Sozinha, parecia não ter nem técnico.
O momento q as meninas descobriram q conseguiram a primeira medalha olímpica por equipes, da história da ginástica artística brasileira nas olimpíadas!!
— may (@sfvrigth) July 30, 2024
ESSE MOMENTO É HISTÓRICO!! 🇧🇷 pic.twitter.com/xIs7ED1f73
Faz algum tempo que temos uma equipe de competentes ginastas. Sim, EQUIPE. Jovens que podem contar umas com as outras, que tem técnicos, algumas conhecidas do grande público, e inspirando novas gerações a ingressarem no esporte. Não somente meninas brancas parecidas com as soviéticas, romenas e norte-americanas da minha infância e adolescência, mas garotas com todas as cores do Brasil, algumas delas vindas das periferias do país.
Fui buscar o que publiquei sobre a ginástica, aqui, no blog e achei vários posts. Lá de 2008, um que falava da dissolução do centro de treinamento da seleção de Curitiba por pressão dos clubes, afinal, não houve medalhas em Pequim. Outro, de 2009, falava de quando o Flamengo cortou verba da ginástica deixando Jade Barbosa e Diego Hypólito sem salário. Em 2012, comentando a crueldade da torcida brasileira com os atletas que não conseguiram medalha em Atenas, dentre eles, Daiane dos Santos e Diego Hypólito. Em 2016, fiz um post sobre a prata de Diego Hypólito e lembro de não ter tido coragem de assistir, estava nervosa, também. E, em 2021, dois posts sobre Rebeca Andrade, afinal, ela ganhou prata e ouro. Sim, eu acompanho a ginástica e comento por aqui. Até deixei uns dois posts de fora do parágrafo, porque esses resumem bem a história da modalidade aqui.
Torcia pelas nossas atletas, que, como alguém pontuou, representavam três gerações Jade Barbosa era iniciante quando Daiane e Daniele Hypólito estavam no auge e é a ginasta mais velha das Olimpíadas; Rebeca Andrade, talvez a segunda melhor ginasta do mundo hoje (*Simone Biles não está em discussão*), Lorrane Oliveira e Flávia Saraiva estão no auge, enquanto Júlia Soares, que já tem um movimento da ginástica registrado com seu nome, está começando. Fosse na época em que eu era jovem, aos 18 anos, a chamariam de velha. Muito bom terem colocado limite na idade de participação e estendido a carreira das ginastas mulheres, que dependeu, também, de mudanças nas formas de preparação das atletas. Algo importante, pelo menos no caso do Brasil, parece ter sido o suporte psicológico dado às atletas.
O que definiu o bronze foi o salto de Rebeca. Já havia gente que não acreditava na virada, mas ela veio. E eu não chorei, mas fiquei com a voz embargada ao recontar para a minha filha o quanto foi difícil a caminhada até aqui. Ela parece ter entendido, mas não sentido, ela não se liga muito em esportes, talvez, no futuro, ela consiga compreender a grandeza daquilo que essas meninas fizeram. Que a Rebeca já tinha feito, que Daiane tinha desbravado e Daniele Hypólito tinha sofrido para alcançar, da coragem solitária de Luísa Parente e tantos outros e outras. Venceram em um esporte subfinanciado, contra (pre)conceitos que foram derrubados.
A Jade Barbosa finalmente com sua medalha olímpica. Mais de 20 anos de dedicação. pic.twitter.com/A2WXHKWq1e
— Sérgio Santos (@ZAMENZA) July 30, 2024
Hoje, a melhor ginasta do mundo é uma mulher negra. Nossa equipe é majoritariamente negra. Vocês, jovens, talvez não consigam imaginar o quanto isso é incrível. Agora, basta que o governo deixe de investir nas bolsas de patrocínio, que poderiam ser maiores, mas para um atleta de ponta são boas, que os clubes deixem de se interessar e, rapidamente, podemos retroceder uma década. Estou muito feliz por nossas atletas, orgulhosa delas, e ainda teremos mais, porque a disputa individual ainda está por vir. Torçamos por Rebeca e por suas companheiras, porque será duríssima a final por aparelhos.
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