domingo, 17 de setembro de 2023

Entrevista com Mari Okazaki ou ainda temos pais que não sonham com a carreira de mangá-ka para suas filhas

Estava passando pelo Twitter e vi o link para uma entrevista com Mari Okazaki, mangá-ka que começou no shoujo para meninas mais velhas (*revista Cookie, a mesma de Nana*) e josei, tem um traço lindo, usa muito bem as cores.  Faz algum tempo que ela está publicando seinen.  Enfim, meu japonês é indigente e usei o Google Translator.  O link da entrevista na página do Jornal Asahi é esta aqui. Minhas observações estão entre colchetes e em negrito. Para quem quiser, basta checar lá, e me sugerir correções, caso vejam necessidade.  A entrevistadora se chama, Kaori Terada.

O caminho de Mari Okazaki para se tornar uma artista de mangá foi desencadeado pela oposição de seus pais. Quais são algumas dicas para encontrar o amor?

A artista de mangá Mari Okazaki está atualmente serializando seu último trabalho, Haibaiyoushi Mizuiro (胚培養士ミズイロ) que retrata o tratamento da infertilidade, em uma revista seinen. Até o momento, ela produziu inúmeras obras, incluindo o mangá Sapuri (サプリ), que se passa em uma agência de publicidade. Depois de se formar na escola de artes, trabalhou em uma grande agência de publicidade. Perguntamos ao Okazaki-san, que estreou como artista de mangá enquanto ainda trabalhava [com publicidade], sobre sua carreira, como criar os filhos e como ela lida com a vida.

Trabalhando em uma agência de publicidade e trabalhando como artista de mangá

──Depois de se formar na escola de artes, você ingressou em uma agência de publicidade e fez sua estreia como artista de mangá enquanto trabalhava lá. Você pode nos contar sobre o caminho que você percorreu para chegar lá?

Mari Okazaki (doravante denominada Okazaki): Comecei a desenhar mangá quando estava no ensino médio e me inscrevi em concursos de ilustração realizados em vários lugares. É surpreendente agora, mas naquela época era uma bolha e você poderia ganhar um prêmio de 1 milhão de ienes por uma ilustração. Ganhei dinheiro enquanto era estudante.

Depois de terminar o ensino médio, usei minhas economias para me mudar para Tokyo e ingressar na escola de artes. Me inscrevi em um concurso e, se ganhasse, conseguiria um emprego fazendo mangá e, graças a isso, fui abordado por muitas pessoas de todo o mundo. [Aqui não sei se o final da frase está correto.]

Porém, nunca pensei em não conseguir um emprego e trabalhar de forma independente como artista de mangá. Sou uma pessoa solitária. Não consigo fazer isso sem pessoas ao meu redor, então definitivamente pensei que seria melhor ingressar em uma empresa.

Quando eu estava procurando emprego em uma escola de arte, imaginava que primeiro iria para uma agência de publicidade, depois para o departamento de publicidade de uma grande empresa e depois para um escritório de design. Então, a primeira empresa que aceitou meu currículo foi a Hakuhodo, onde mais tarde ingressaria. Eu realmente não fui bem na primeira prova, mas quando trouxe o mangá que desenhei na época, as pessoas acharam interessante, então passei para a segunda prova.

Para o segundo exame, os participantes receberam uma palavra-chave e tiveram que passar uma semana desenhando de 500 a 600 ilustrações em um caderno e enviando-as. Eu gostava de desenhar ilustrações, então passei no exame em primeiro lugar, consegui uma oferta de emprego e entrei na empresa.

Entrei na empresa como designer, mas um dia meu chefe me disse: “Você é ruim em design e entrou na empresa por causa de sua criatividade, então deveria se tornar uma planejadora comercial” [Achei esse posto no Brasil, mas não sei bem o que faz, não deve ser um cargo gerencial ainda.]. Quando comecei minha carreira pensando que não era tão boa nisso, me disseram que eu deveria parar de fazer mangá. Como você disse, continuei desenhando mangá enquanto trabalhava como planejadora comercial, e então fiz minha estreia, e sou mangá-ka ate hoje.

──Você alcançou o que hoje chamaríamos de carreira dupla e se aposentou da empresa quando se casou. Quando você acha que foi o ponto de virada em sua vida?

Okazaki: Foi quando larguei meu emprego? Até então, eu tinha feito o que queria com o mangá e a empresa. Porém, quando me casei e quis ter filhos, percebi que não conseguiria equilibrar mangá, trabalho [na empresa] e criação dos filhos ao mesmo tempo.

Então, pela primeira vez na vida, pensei nas coisas e decidi me aposentar. Nesse sentido, foi um ponto de virada.

“Eu amo crianças, mas odeio criar filhos (risos)”

──Você construiu uma carreira baseada em dois eixos: o trabalho que você começou como artista de mangá porque adorou, e o trabalho que lhe foi dado como planejadora.

Okazaki: Sou o tipo de pessoa que só quer fazer o que quer. Porém, há muita gente envolvida em comerciais, e mesmo que você tenha uma ideia que queira fazer, há muitos casos em que você não consegue por diversas condições como orçamento ou talento.

Quando comparei trabalho, mangá e os cuidados com as crianças, foi do trabalho que desisti para seguir o que queria fazer até o fim. Então, quanto a mim, só tenho feito o que sempre quis fazer.

No entanto, criar os filhos foi o que quebrou isso. Meus filhos nunca ouvem o que eu quero fazer. Ainda não gosto de fazer o jantar e de cuidar da limpeza. Amo crianças, mas odeio criá-las (risos). Consigo fazer isso pensando que não tenho escolha a não ser fazer porque as pessoas de quem gosto ficarão felizes com isso. [Ela é meio que refém das expectativas de gênero e do dispositivo amoroso.  Precisa servir para se sentir feliz, porque os outros estariam felizes.]

Depois de me tornar mãe, percebi que com certeza deveria trabalhar. Artistas de mangá podem ser maníacos por controle. Porque no mangá você pode decidir a estação do ano, as roupas que vai vestir e até a altura da árvore ao fundo.

Eu mesma mudei para Tokyo e fugi porque não queria que meus pais me controlassem, então decidi desenhar mangá para não controlar meus filhos. Estou feliz por ter um emprego.

Se você ainda não pode dar esse passo, não precisa.

──Ouvimos leitores dizendo: "Há algo que quero fazer, mas não consigo dar o primeiro passo" e "Não consigo encontrar o que gosto." Você tem algum conselho da Okazaki-san, que fez o que queria?

Okazaki: Como eu ficava muito obcecada quando fazia desenhos e mangás, meus pais faziam oposição a isso pedindo para eu parar. [1] Eu não me dava bem com meus pais, então aquela oposição se tornou um gatilho para mim e pensei: "Isso é o que vou fazer pelo resto da minha vida!'' "Vou embora e voltar para casa algum dia", e comecei a pensar em como ganhar dinheiro com a única coisa que tinha. Cresci pensando nisso.

A vida era tão difícil que não tive escolha a não ser dar um passo à frente, mas se você ainda sente que não consegue dar um passo à frente, não precisa. Pode não ser o que você realmente deseja fazer.

Quando eu trabalhava em escritório, pensava que as melhores pessoas eram aquelas que não gostavam de nada, mas estavam de bom humor. O mundo diz que o que você quer fazer está certo, mas as pessoas mais virtuosas são aquelas que estão de bom humor e cuidam de suas vidas diárias. Então não acho que haja nada com que se preocupar.

Mas acho que isso não me dá uma sensação de realização. Se for esse o caso, por favor leia o mangá. Pode ser uma boa ideia tentar conscientemente fazer algo que lhe dê uma sensação de realização, como ler um mangá que você acha um pouco exagerado, ler um romance difícil ou completar um jogo.

Outra opção é pensar em maneiras de ganhar dinheiro fazendo aquilo em que você passa mais tempo fazendo. Faça um gráfico de pizza das 24 horas de um dia e pense em qual parte ocupa mais tempo. Não seria mais eficiente se você pudesse ganhar dinheiro fazendo algo que normalmente passa muito tempo fazendo? Se for dormir, me pergunto se existe uma maneira de ganhar dinheiro enquanto durmo. Acho que você não sabe o que pode fazer para viver.

(Imagem superior: © Mari Okazaki/Shodensha Feel Comics)

●Perfil de Mari Okazaki

Artista de mangá. Ela começou a desenhar ilustrações e mangás ainda no ensino médio e, depois de se formar na Tama Art University, ingressou em uma agência de publicidade. Enquanto trabalhava como designer e planejadora comercial, ela estreou como artista de mangá em 1994. Desde então, ela lançou vários trabalhos como Sapuri, A-um (阿・吽) e Shibuyaku Maruyamachou (渋谷区円山町), e recebeu apoio de mulheres de diversas gerações. Ela também é mãe de três filhos.


[1] Obrigada pela ajuda, Luiz!

4 pessoas comentaram:

[Aqui, fiquei mesmo na dúvida, porque o retorno era sempre, em inglês, ou português, "ficar com calor".]

熱を出す (netsu wo dasu) é uma expressão que significa "se dedicar muito a algo". Então a tradução ficaria:
"Como eu ficava muito 'obcecada' quando fazia desenhos e mangás, meus pais faziam oposição a isso pedindo para eu parar."

Muito obrigada por me socorrer, Luiz!

Imagina! Uma coisa que só reparei olhando o site hoje cedo é que esse trecho publicado por você na verdade é a segunda parte da entrevista. A primeira está aqui:

https://telling.asahi.com/article/14977890

Putz! E ela ainda teve 3 filhos!!! Como conseguiu equilibrar tudo isso?
Sempre vi o nome dela por aí, mas acho que nunca li nada dela. Mais uma coisa para incluir na lista.

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