É difícil decidir qual é o grande anime da temporada para mim, se Ōoku (大奥), que cobriu o mangá com uma fidelidade surpreendente e uma intensidade emocional para além do comum, ou Watashi no Shiawase na Kekkon (わたしの幸せな結婚), que tem uma animação de qualidade altíssima e consegue traduzir o livro em imagens e, ao mesmo tempo, criar momentos preciosos para além do original. Difícil... difícil... mas eu vou comentar o quarto episódio de Watashi no Shiawase na Kekkon, ou My Happy Marriage, ou ainda, Meu Casamento Feliz. Trata-se de um anime com título em várias línguas e dublagem para quem nao quiser o material legendado. Isso é um trunfo. Muito bem, você não conhece a história de Watakekkon, então, eis o resumo:
Miyo Saimori tem 19 anos e pertence a uma família importante e poderosa em um Japão de fantasia que estaria no correspondente à Era Meiji, neste mundo, algumas famílias são especiais, porque seus membros têm poderes capazes de afastar criaturas (grotesqueries) que podem interferir no mundo natural e causar problemas. Miyo nasceu de um casamento perfeitamente arranjado entre os Saimori e a misteriosa e temida família Usuba, só que sem os poderes, o que representa uma vergonha para seu pai. Após a morte da mãe da protagonista, seu pai se casa com sua antiga amante, deste novo casamento nasce Kaya e logo se percebe que a criança tem o dom. A partir de então, Miyo passa a ser tratada pela madrasta e pela meia-irmã como se fosse uma criada, menos que isso, uma escrava, sem que seu pai demonstre qualquer interesse por ela.
Crescida, Miyo não tem grandes esperanças de ser feliz, mas o seu único amigo de infância, Shouji Tatsuishi, sinaliza que gosta dela e o coração da moça se enche de alguma esperança quando ele vem visitar sua família e ela é chamada pelo pai que a ignora. Só que é somente para atirá-la em um poço de desespero, pois o patriarca lhe comunica que o rapaz está de casamento marcado com sua meia-irmã e que ela terá que ir para a casa de seu futuro noivo, Kiyoka Kudou, um sujeito de família muito mais poderosa que a dela, mas que já espantou várias noivas. Elas normalmente não conseguem ficar mais que três dias em sua casa. Só que Miyo não tem para onde voltar, logo, ela precisa transformar seu casamento em um matrimônio feliz.
Esse é o ponto e partida da história e eu tenho feito vídeos sobre os episódios e fiz um texto para cá, também, comentando o segundo episódio, que havia sido o melhor até que o quatro o superou. No capítulo desta semana, aconteceram tantas cenas importantes que é difícil determinar o que foi o ápice do episódio. Querem ver? Tivemos o encontro de Miyo com a irmã mais nova, Kaya, no meio da rua. Mais uma vez, o bundão do Kouji é incapaz de fazer qualquer coisa por Miyo e ela revive naquele breve momento todas as humilhações e torturas a que foi submetida em sua casa. Quando Yuri retorna, Kaya ainda se finge de boazinha na frente da criada, mesmo que muito decepcionada em saber que Kyoka aceitou Miyo como sua noiva.
Esse encontro faz com que Miyo mergulhe em uma condição depressiva, porque a história é menos sobre uma cinderela, sobre casamento, e mais sobre a cura de uma pessoa que sofreu profundo abandono emocional, alguém profundamente traumatizado e ferido. Miyo encontra em Kiyoka um porto seguro e a cena dele falando com ela através da porta, uma cena que era muito tocante no livro, ganhou maiores proporções na animação, porque temos imagem, temos a voz dos atores e as expressões faciais contidas que os animadores estão colocando nas personagens.
Kiyoka quer saber o que pode fazer por Miyo e Yurie lhe dá conselhos preciosos. Como foi linda a sequência em que ele traz Hana, a ama da menina, que foi deminitida quando tentou defendê-la dos abusos aos quais era submetida pela madrasta e pelo pai, porque não tiro dele nenhuma responsabilidade, ele é ativo na imposição de sofrimento à filha mais velha, desde antes da morte de sua mãe. aliás, a mãe de Miyo aparece em um sonho. Os sonhos de Miyo são importantes na história, fiquem atentos.
Voltando para Hana, a conversa entre as duas, a solidariedade entre mulheres, que é celebrada a todo instante na série. Se temos duas mulheres más em papéis convencionais, a madrasta e a meio-irmã, temos Yurie, Hana e, daqui a pouco, a irmã de Kiyoka para mostrar para Miyo que mulheres podem ser solidárias umas com as outras, se apoiarem e ajudarem a curar suas feridas da alma, porque é disso que se trata. É a conversa com Hana que dá coragem para Miyo de revelar à Kiyoka seu grande segredo: ela não tem dons. Só que nosso mocinho já sabe disso e não se importa, ela a quer pelo que ela é, ela tem valor em si mesma, ele lhe diz claramente (*Amo essa característica em Kiyoka!*) que ela finalmente é amada. Miyo está curada? Não, há um longo caminho, seria irreal supor que ela esteja, mas isso a ajuda a ser ainda mais forte do que já é.
Em um tempo no qual as diversas mídias parecem se agarrar à ideia de que mulher forte é a que pega em armas, a que não precisa de ninguém (*Deus nos livre se for um homem!), que reproduz inclusive os piores comportamentos de gênero atribuídos ao masculino (*e tudo isso são construções culturais*), temos Miyo. Sim, há várias formas de ser forte e de ser mulher, a protagonista de Watashi no Shiawase na Kekkon não é a sofredora, é alguém que supera o sofrimento e consegue ser feliz, que não recusa o amor e o suporte de outros. Somos seres sociais, precisamos de companhia, de apoio, qualquer mudança, ainda que comece em nós, precisa ser coletiva.
E Miyo dá para Kiyoka o presente que fez com suas mãos, a fita que aparece na abertura e que está nos merchandisings da série junto com o pente que ele deu para a protagonista. E eles têm um momento de grande intimidade, porque é, já que ele pede que ela amarre seus cabelos. Sim, esses atos de afeto contidos da série podem contrastar com outros materiais que são bem explícitos, e eu não estou dizendo que um é melhor que o outro, mas que há espaço para todo tipo de representação de romance, desde que ninguém se sinta constrangido, ou sofra violência. E é lindo! Eu quase chorei nesse episódio e mais de uma vez.
Enfim, é neste capítulo que Kiyoka confronta o pai e a madrasta de Miyo. E ele é arrogante, é superior, e esculhamba o sogro, que está cheio das falsas gentilezas, sem alterar a voz. Eu gosto esse tipo de personagem, ainda que já anuncie aqui que Kiyoka irá pisar na bola no livro dois, e vai ser feio. De qualquer forma, Kiyoka diz que não irá dar o presente (Yuinou), que poderia ser uma alta soma em dinheiro, à família da noiva, salvo se o pai e a madrasta se desculpassem com Miyo. O Yuinou é uma espécie de compensação pela boa educação que uma noiva recebeu e um reconhecimento público do valor da mesma.
Há cerimônias que datam de mais de 1300 anos e as tradições variam de região para região do Japão, mas, normalmente, é a família do noivo que dá o maior presente e arca com boa parte das despesas, porque eles estão sendo presenteados com algo de ainda mais valor. Aqui, cabe uma discussão histórica, minha professora de Antiga I/Grécia (Neyde Theml), disse em aula uma vez que onde a família do noivo paga o dote, as mulheres têm mais valor para o núcleo familiar, talvez isso ajude a explicar o motivo pelo qual o Japão não tem problema com o abortamento seletivo de meninas, ou teve com o infanticídio das filhas, como Índia e China enfrentaram e enfrentam até hoje.
Hoje, a coisa não é mais assim, mas entre famílias de posses, os valores gastos pelo noivo poderiam ser elevados. Já de saída, Kiyoka passa por Kaya e ela fica deslumbrada com o rapaz. Aguardem os próximos acontecimentos, porque imagino que em dois episódios o livro 1 irá acabar, teremos um clímax de meio de temporada e vai ser intenso.
Houve cenas inventadas, claro! Kazushi, irmão de Kouji, é introduzido. Ele não aparece nesta altura do primeiro livro, mas eu imaginava que iriam apresentá-lo. O objetivo é marcar a diferença de caráter entre os irmãos; o mais velho é independente, tem os dons e sabe usá-los; o mais jovem é tímido, submisso e nunca se esforçou (*no livro é assim, pelo menos*) em aprender a usar os seus poderes de verdade. Escolherem colocar Kazushi com cabelos curtos, no mangá, até por ele ser apegado ao visual samurai, ele é desenhado com cabelos longos. E, sim, tivemos mais uma cena do vilão, o pai dos dois rapazes.
O próximo capítulo promete, mas não será marcado pela delicadeza como este, deve ser marcado muito mais pela violência e pelo sofrimento para Miyo. No entanto, podem ter certeza que o final vai ser feliz e que Kiyoka não vai deixar barato para ninguém, nenhum dos vilões vai ser poupado no final do livro 1. aliás, tem resenha dele aqui. O vídeo review está abaixo.
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