Em 2012, eu comentei uma matéria do ANN sobre a inclusão de Gen Pés Descalços (はだしのゲン – Hadashi no Gen), de Keiji Nakazawa, no programa Educação pela Paz. Para quem não conhece Gen Pés Descalços, trata-se de um a obra pacifista que muita gente acredita que só fala da experiência do autor, que era uma criança em Hiroshima quando os norte-americanos jogaram a bomba atômica sobre a cidade, mas é um mangá que critica de forma muito contundente o governo japonês e sua política belicista e imperialista que repercutia na vida cotidiana dos seus cidadãos. Gen foi traduzido para mais de 23 línguas, inclusive, o português.
Muito bem, em 2012, Gen Pés Descalços vira parte do currículo, em 2013, um dos distritos do Japão baniu o mangá da biblioteca escolar. De lá para cá, e eu nem fui cavucar no blog, porque devo ter comentado pelo menos outra notícia, esta e 2014 do CBlDF, Gen foi censurado mais de uma vez, até achei uma falando que Gen Pés Descalços foi banido das escolas primárias e o ginasial em Osaka. Encontrei um artigo (The Dispute over Barefoot Gen (Hadashi no Gen) and Its Implications in Japan) de um pesquisador japonês discutindo a controvérsia da cidade de Matsue e que expõe o essencial, é a crítica à política japonesa durante à guerra e ao próprio imperador que são centrais na rejeição ao mangá nesse século XXI e dizem muito sobre o quanto as discussões históricas sérias parecem ser evitadas no país. E, pior, a extrema-direita vem ganhando espaço no mundo inteiro, no Japão, inclusive.
Segundo o Sora News, o Asahi Shinbum e o Tokyo Shinbum, os responsáveis pela área de educação da cidade de Hiroshima fez uma revisão do currículo da disciplina Educação pela Paz para as crianças do 3º ano primário e decidiu retirar dos materiais didáticos trechos do mangá presente nos livros. Todas as fontes que eu encontrei apresentavam situações de extrema pobreza que obrigaram Gen e/ou seu irmão a mendigar e roubar (*pescar peixe em local proibido*).
O argumento para eliminar as passagens é que as situações mostradas não correspondem às experiências das crianças em nossos dias e como são fragmentos, podem passar uma impressão errada para os estudantes (????). Impressão errada de que as pessoas passavam fome durante a guerra? Será que não há professor, ou professora, capaz de situar as crianças sobre as duras condições vividas pela população japonesa durante o conflito, ou que em outros tempos, ou mesmo em outras sociedades contemporâneas, a vida das crianças era diferente da do japonês médio?
Enfim, fica em mim a impressão de que é censura mesmo, vontade de limitar as discussões que o mangá suscita. Segundo as matérias, no lugar dos quadros de Gen, teremos relatos de sobreviventes da bomba. OK. Já li em algum lugar, que os livros didáticos japoneses tratam a II Guerra Mundial da seguinte maneira, o conflito começa e a bomba cai na cabeça dos habitantes e Hiroshima e Nagasaki. O que aconteceu no meio, ou antes, parece um mistério e sobra a ideia de que os japoneses foram vítimas da ação de nações inimigas. É isso que temos por agora.
3 pessoas comentaram:
Silenciar as críticas e apagar a história é o caminho normalmente trilhado por quem quer impor sua visão de mundo.
O vídeo não está mais disponível, sobre o que era?
Vídeo em japonês mostrando as partes que foram retiradas. Basicamente isso.
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