Voltei ao cinema depois de mais um ano e, mais uma vez, para ver uma animação, desta vez, Encanto. Minha ultima passagem por uma sala de cinema tinha sido com Dois Irmãos. Curiosamente, não estava me ligando da existência deste novo filme da Disney até ver Júlia, minha filha de 8 anos assistindo vídeos no Youtube sobre a produção. Daí, veio o estalo "Ah, é aquele filme do boato de que se passaria no Brasil." Pois é... Júlia queria ver o novo filme da Disney e eu cedi. A sessão estava vazia, mas todos os que estavam lá pareciam tr escolhido as mesmas três fileiras, enfim... Segue o resumo do filme:
Os Madrigal são uma família extraordinária que vive escondida nas montanhas da Colômbia em um lugar chamado Encanto em uma casa mágica apelidada de Casita. A magia do "encanto" recebido pela matriarca da família, Alma, abençoou todas as crianças da família com um presente único, um dom que lhes é conferido quando chegam a determinada idade. Todas as crianças Madrigal, exceto Mirabel, a protagonista. No dia em que Mirabel deveria receber o seu dom, seu tio Bruno, que tinha o dom de ver o futuro, faz uma terrível previsão envolvendo a menina. O Madrigal não falam de Bruno, que desapareceu desde então e Maribel, se esforça para ser útil a sua família, é percebida pela matriarca como um problema. Quando chega a hora de um outro Madrigal receber seu dom, a matriarca e Mirabel tem medo de um novo fracasso. No entanto, ela logo poderá ser a última esperança dos Madrigal quando descobrir que a magia em torno do Encanto está agora em perigo.
O que dizer de Encanto? A animação é linda, as cores são deslumbrantes, mas a minha sensação é que falta alguma coisa, um algo a mais que tornaria Encanto um grande filme. Encanto meio que segue a mesma linha de Viva! A Vida é uma Festa, mas uma história inferior, eu diria. Alma é o tipo de matriarca dominadora que vimos em A Vida é uma Festa!, ela até traz uma chatelaine, um item típico da senhora de uma casa vitoriana, com apetrechos de mil utilidades, mas, também, as chaves de todas as portas, um símbolo de poder. Lembro que na primeira versão de David Copperfield que assisti, o novo marido da mãe do protagonista pede a chatelaine da esposa e dá para a sua irmã solteirona, confiscando seu poder e indicando quem era a verdadeira senhora da casa.
Alma é uma personagem que controla todos ao seu redor, genros, filhas netos e tem a função de garantir a ordem. Ao longo da história, com a Casita ameaçada, assim como a magia dos Madrigal, seu caráter controlador fica cada vez mais evidente. Se Maribel é a excluída, além de possível ameaça, suas irmãs são obrigadas a se enquadrar e cumprir as funções que agradam à anciã. Obviamente, Alma se endureceu para sobreviver e as origens de Encanto e da Casita são bem violentas. Tudo começa com a fuga de Alma e do marido carregando seus trigêmeos recém-nascidos.
E, nesse ponto, talvez seja o buraco da história de Encanto. Eu queria saber quando isso aconteceu, por qual motivo, ou quem eram, os jagunços que expulsam os camponeses de sua vila. Aliás, o marido da matriarca é morto à facão. Nada explícito é mostrado, claro. Em A Vida é uma Festa, era possível perceber a uma certa temporalidade. Sabíamos que estávamos nos dias de hoje, ou próximo disso, mas em Encanto, a tomar pela própria chatelaine e a ausência de tecnologia, parece que estamos no início do século XX, ou final do século XIX.
Falando das personagens, Luísa, a irmã mais velha de Maribel, e minha personagem favorita junto com Bruno, o tio que tem um dom que parece maldição, tem super força e sua música é a melhor da triha sonora, porque fala das angústias da moça, mas, também, das ansiedades de uma irmã e neta mais velha. Eu sou as duas coisas pelo lado materno e minha avó não sobreviveu até os 90 anos (*e viva segue*) se não tivesse endurecido um tanto o seu coração. Luísa se cala, mas é uma das primeiras a perceber que a magia da Casita está falhando, um dos versos da sua música solo diz o seguinte “I’m pretty sure I’m worthless if I can’t be of service.” (“Tenho quase certeza de que não valho nada se não puder ser útil.”). Filhos mais velhos precisam ter responsabilidade, seus (*supostos*) privilégios dependem disso.
A outra irmã de Mirabel, Isabela, é linda, tem um cabelo de propaganda de xampu que rivaliza com Pocahontas e Shiryu, e controla as flores. Ela está quase noiva de um moço que é um excelente partido e é o orgulho da avó, muito diferente de Mirabel. Já a mãe da protagonista, Julieta, tem o dom de cura através da comida que faz. Sua tia Pepa controla o tempo, mas parece em uma condição depressiva constante. Dolores, a prima, tem o dom da super audição e, assim como Luísa, ela já ouviu coisas e se preocupa. Há o primo metamorfo, Camilo, que não tem grande função na trama a não ser parecer o adolescente chato e representar esse momento da vida em que não se sabe bem o que se quer do futuro, ou quem se é. E temos Antonio, o primo criança, que está para receber o seu dom. Tio Bruno é uma incógnita, ele participa do filme, mas deixarei para vocês descobrirem quem ele é.
Uma coisa que percebi observando a ilustração que coloquei na abertura da resenha é que a família de Mirabel usa cores frias, enquanto a de Pepa, as cores quentes. A avó parece condensar tudo em suas vestes. Enfim, o filme acerta quando coloca multiplicidades de corpos e mostre que há negros na população colombiana e não empurrando um tipo físico único para toda a população de Encanto. Falando de papéis de gênero, enfim, repete-se mais uma vez a ideia da matriarca que, ao perder seu marido muito jovem, abre mão de qualquer possibilidade de reconstruir sua vida afetiva sexual. No entanto, sendo Disney, só de deixarem as mães e avós vivas, já é um avanço. E um spoiler, Mirabel tem um dom e ele é o mesmo de sua avó.
É isso, Encanto é bonitinho, mexe com os sentimentos da gente, mais uma vez fala de valores familiares, mas falta alguma coisa. Falta, na minha opinião, explicar melhor a história de Alma e por qual motivo ela e seu marido tiveram que fugir. Quem eram aqueles jagunços? Aliás, a sequência inteira poderia acontecer na maioria dos países da América Latina, inclusive o Brasil. Das músicas, a de Luísa, "Nós não falamos de Bruno" e a que é cantada em espanhol, "Dos Oruguitas", são as mais interessantes. Agora, preciso fazer a resenha de Viúva Negra, porque assisti finalmente ao filme, no sábado de manhã.
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