Quem frequenta o Shoujo Café faz alguns anos sabe que sou fã de The Scarlet Pimpernel, série de livros escritos pela Baronesa Orczy. Infelizmente, faz tempo que não aparece uma nova adaptação para o cinema, ou TV, e eu nunca consegui baixar o musical da Broadway para assistir (*se alguém tiver o link, aceito com prazer*) do Pimpernel. Mas vamos ao post, uma página que eu sigo no Facebook, o Madame Gillotine, está publicando quadros de Élisabeth Vigée Le Brun (1755-1842), a famosa pintora que retratou Maria Antonieta mais de 30 vezes. Um dos quadros postados foi o retrato de Hyacinthe-Gabrielle Roland (1766- 1816), atriz do Palais-Royal e que se casou com um nobre inglês. A responsável pelo site levantou a teoria de que Roland teria servido de inspiração para Marguerite, a esposa de Sir Percy Blakeney, o Scarlet Pimpernel. Nos livros, Sir Percy, o homem mais rico da Inglaterra, se apaixona e se casa com Marguerite, uma francesa, que também havia sido atriz em seu país natal e que é chamada no primeiro livro de "a mulher mais inteligente da Europa".
Esse tipo de casamento era tudo, menos comum, na verdade, eram vistos como escândalo e exigiam muito sangue frio e cara de pau para que funcionassem. Pode ser coincidência, mas acredito que realmente Roland possa ter servido de base para Marguerite, com duas diferenças físicas marcantes, porque a personagem fictícia era alta e loura. Segundo a Wikipedia, Roland teve um casamento infeliz. Começou como amante do futuro Marquês de Wellesley, irmão do Duque de Wellington, e já tinha com ele 5 filhos quando o nobre decide se casar com ela e legitimar as crianças. O casamento foi considerado escandaloso pela alta nobreza britânica e Roland, que nunca aprendeu inglês, foi ostracizada pelos pares do marido, que terminou por traí-la e abandoná-la. A infeliz Hyacinthe-Gabrielle Roland é tatataravó da rainha Elizabeth II através de uma de suas filhas.
Mas vendo esse caso e a teoria, me lembrei de outro casamento inadequado e escandaloso, mas que deu certo. Elizabeth Armistead (1750-1842), esposa do famoso estadista e político Charles James Fox, começou a vida não somente como atriz, mas era abertamente uma cortesã. Armistead foi amante de vários homens importantes até que Fox, que era filho de uma das famosas irmãs Lennox, decidiu fazer dela mais do que sua amante. Diferentemente do que ocorreu como Roland, Armistead conseguiu construir seu espaço boa sociedade de sua época sendo lembrada como uma mulher caridosa. O casamento deu certo, portanto, e ambas as mulheres são contemporâneas.
Por qual motivo escrevi esse post? Primeiro, pela curiosidade. A ponte entre Roland e Marguerite valeria o texto por si mesmo. Segundo, porque há quem considere que tais casamentos eram impossíveis. Raríssimos, sem dúvida, escandalosos, com certeza, mas eles eventualmente aconteciam e, normalmente, era o homem que se casava com a mulher inadequada. Exceção da exceção? Citei as irmãs Lennox, e preciso terminar a série Aristocrats da BBC e resenhá-la. A mãe de Charles James Fox, Lady Caroline Lennox, bisneta do rei Carlos II, filha de duque, fugiu de casa para se casar com o marido, um homem bem mais velho que ela e de uma nobreza bem abaixo da sua. Ainda assim, nobre, que fique claro, mas fora do círculo que seus pais, considerados muito liberais para a época, tinham selecionado para que ela pudesse "escolher" um marido. Terceiro, essas histórias de Cinderela não podem ser vistas como regra, mas também não podem ser motivo para apontar o dedo na cara de uma autora de romance (*normalmente são mulheres mesmo*), porque ela juntou seu duque ou príncipe fictício com uma mocinha não-nobre e que nem tinha um currículo tão complicado atrás dela, porque, sim, "cinderela" está entre aspas no título, porque nenhuma das duas do começo do texto o era, afinal, uma dos requisitos para ser uma "cinderela" é ser pura e virginal.
Roland poderia ser virgem quando encontrou seu futuro marido, mas cairia naquele ditado muito machista, mas carregado de sabedoria política "À mulher de César não basta ser honesta, deve parecer honesta". E, sim, a esposa de César em questão, Pompeia, era honesta, foi provado que era, mas acabou sendo repudiada pelo marido, um grande general e estadista, que tinha fama de ser o homem de todas as mulheres e a mulher de todos os homens, porque um de seus inimigos políticos urdiu um plano para destruir a sua reputação. No original, César teria dito "minha esposa não deve estar nem sob suspeita", se estava, já era culpada, pois deveria ter dado margem para a armadilha que nem deu certo. Uma atriz era sempre vista com suspeitas, porque na mentalidade machista, e algumas dessas ideias ainda são presentes em nossos dias, uma artista e uma prostituta são a mesma coisa, uma atriz é sempre uma mulher de moral frouxa e por aí vai. E não é correto, também, tentar comparar qualquer uma dessas mulheres a uma Princesa Diana, que era filha de conde, membro da nobreza, jovem e virginal ao se casar, mas é possível pensar em uma Camilla Parker-Bowles como algo mais próximo dessas "cinderelas" de passado complicado, de origem menos nobre, mas que acabou casando com seu príncipe por amor, porque foi por amor, sim.
De resto, nenhum casamento desigual se compara com o de Pedro, o Grande da Rússia com a CAMPONESA Marta Helena Skowrońska. Juntos tiveram doze filhos e ela ainda assumiu o trono russo como czarina reinante com o nome de Catarina I. Obviamente, eu não mexo com história da Rússia, nem quero mergulhar em mais leituras loucas, por isso mesmo, não tenho detalhes muito profundos do caso. Agora, casamento mais absurdo que esse, não me lembro. Um autocrata, a rigor, pode tudo, ainda assim, mesmo depois da morte de Pedro, Catarina não perdeu o seu poder. Não imagino outras nobrezas da Europa engolindo algo assim, não.
1 pessoas comentaram:
Adoro ler essas histórias! Muito legal!
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