Fiquei sabendo hoje que o aborto foi descriminalizado na Coreia do Sul a partir do dia 01 de janeiro deste ano. É uma vitória dos direitos das mulheres? Sim e não. Vou me alongar um pouco sobre o tema. Primeira coisa, não sabia que o aborto não era descriminalizado na Coreia do Sul (*Na Coreia do Norte é legal*), dado o perfil dos vizinhos, como Japão, Índia e China, além do quadro demográfico do país durante os anos 1970 e 1980. Mas, sim, este era o caso desde 1953 com penas pesadas para mulheres, médicos e outros envolvidos.
Mais tarde, em 1973, houve uma reforma na legislação abrindo exceções nos seguintes casos:quando a gestante ou seu cônjuge têm alguma deficiência ou doença genética (*políticas eugênicas ainda vigoravam em países da região*); quando a gestante ou seu cônjuge apresentam alguma doença infecciosa; quando a gravidez é resultado de estupro ou quase estupro (*sei lá o que é isso*); quando a gravidez é decorrente de incesto; quando a continuação da gravidez pode potencialmente prejudicar a saúde da mulher grávida. Segundo a Wikipedia, como havia uma pressão pelo controle da natalidade, o Estado fechou os olhos e a prática do aborto era disseminada, mas não discutida, até que se criou um problema.
Assim como na vizinha China e na Índia, e diferentemente do Japão, o que é muito curioso, a preferência por um filho homem começou a produzir um grande desequilíbrio demográfico. No auge do problema, havia, na Coreia do Sul, uma média de 117 meninos nascidos para cada menina. Assim, nos anos 1990, a questão do aborto voltou à discussão com ênfase em penas mais duras e na proibição da sexagem fetal e revelação do sexo dos bebês por ultrassonografia. Essa pressão aconteceu também na Índia e na China. E houve nova reforma do código penal do país.
Só que em 2019, grupos pelos direitos das mulheres conseguiram uma decisão do correspondente ao STF coreano que considerava a legislação proibindo o aborto inconstitucional. O tribunal deu um prazo até 31 de dezembro de 2020 para que o parlamento resolvesse a questão criando uma nova legislação. Não houve acordo no parlamento e, simplesmente, a legislação contra o aborto caiu, mas não há nada para se colocar no lugar. Aparentemente, se não entendi errado, vale tudo. E, não, não estou dizendo que as mulheres vão correr em massa para abortar, porque isso é delírio dos misóginos tarados religiosos.
Enfim, acredito que os coreanos farão uma nova legislação nos próximos meses, se a vontade dos pró-vida, com forte influência dos grupos evangélicos locais e estrangeiros, que mantém laços com os poderosos desde a época da ditadura. teremos uma legislação que permita o aborto, mas imponha um prazo muito curto para que ele seja feito legalmente, além de outras restrições e obstáculos. Não se sabe como vai ficar, ou seja, é uma situação bem diferente da argentina. Quem conhece a minha posição, sabe que sou favorável à descriminalização do aborto e que sou defensora de que a coisa siga regras que protejam não somente a vida da mulher e seu direito de escolha, mas que salvaguardem os direitos do feto a partir de um determinado momento da gravidez. É complexo e, enfim, a situação da Coreia neste momento está muito esquisita.
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