Acho que teremos dois posts da historiadora feminista, hoje. Na verdade, se somarmos com os dois anteriores (*os animes Belladona e Arte*), serão quatro. Muito bem, quando houve o casamento do Príncipe Harry com Meghan Markle comentei o evento para discutir diversidade. Não tenho interesse particular por celebridades, tampouco em fofoquinhas da monarquia inglesa. Não tenho mais o link, mas quando o príncipe George era bem pequeno, um ou uma jornalista da Inglaterra descreveu a família real como um zoológico humano, na medida que eles são preservados, tem privilégios, mas tem que dar espetáculo e são de certa forma prisioneiros do papel que desempenham. Afinal, a família real atrai dinheiro para o país, turismo, em especial, por isso ela precisa continuar.
Voltando, recentemente, Harry e e esposa, Meghan, abriram mão de fazer parte da família real, isto é, cumprir funções que seus membros desempenham, assim com, dos recursos que recebem do Estado e da família, chamada na Inglaterra de "a firma" por muita gente. A partir daí, multiplicaram-se as explicações, não raro focando na falta de adaptação da esposa, norte-americana e negra, aos estritos códigos da monarquia do país.
Charge positiva. |
Quando a noticia era benigna, focava no amor de Harry por Meghan e de como ele não queria que ela sofresse como sua mãe, a Princesa Diana sofreu; se a matéria fosse cruel, pintavam o sujeito como alguém dominado pela esposa, sem personalidade e Meghan como uma espécie de golpista (*Apesar da mulher já ser muito rica quando casou*) e alguém ingrata por abrir mão do sonho de toda mulher: ser princesa. (*Não é, Damares?*) Uau!
A maioria, no entanto, é desse jeito. |
A coisa é tão virulenta que o que deveria ser chamado jocosamente de Sussexit, um trocadilho com Brexit e o nome ducal do casal, virou Megxit, jogando o peso em cima de Meghan. No fim das contas, se os Windsor fossem uma família normal, seria algo a comemorar, afinal, um homem de mais de trinta anos, com mulher e filho, tem mais que sair da casa da avó mesmo. Simples assim. Obviamente, a família real não é uma família comum e a coisa vende jornal. Recentemente, em uma forma de retaliação (*Ah, alguém acredita que não viria alguma?*), Harry e Meghan foram proibidos de usar a marca Sussex Royal. Deve dar briga, mas eles, que já são ricos e ficarão ainda mais, que se entendam.
Situado o causo, estou escrevendo esse texto por causa de uma matéria da BBC e dos comentários que vi no Twitter sobre ela. A matéria, que considero com um pé no sensacionalismo, se chama "As lições de Wallis Simpson, a americana divorciada que levou à renúncia do rei Edward 8º, para Harry e Meghan" e quando ela saiu em inglês, eu tinha comentado no Twitter. Os primeiros quatro comentaristas, são esses aí embaixo. Eles devem fazer parte da banda dos detratores de Meghan, afinal, ela é uma golpista, uma mulher sem classe, não uma Wallis Simpson. Essa, sim, era uma mulher superior, mereceu o amor de um rei.
Os comentaristas brasileiros são maravilhosos. |
Príncipe David, futuro Eduard VIII, bonito, elegante, popular, vendido pelo cinema e TV como um playboy inofensivo, não um agente político realmente importante. |
Wallis Simpson, o rei preferiu o seu amor ao trono da Inglaterra. Deveria ser uma mulher realmente marcante. |
Há um documentário (*a seguir*) chamado "Britain's Nazi King" que detalha que, quando ainda era príncipe herdeiro, Eduardo tinha rompido com os protocolos e saído pela Inglaterra discursando para os trabalhadores e sugerindo que, quando fosse rei, o país iria florescer como a Alemanha. Lembram da Crise de 1929? Pois é, a Inglaterra estava em condições econômicas complicadas e a atitude do príncipe poderia ser como fósforo jogado na gasolina. Muita gente no Parlamento desconfiava dele, que ele iria se meter em política da forma que nenhum soberano inglês deveria se meter, e alguns, como Churchill, que era antifascista, não o queriam como rei e ele apoiou a abdicação. Aliás, isso aparece citado no filme O Destino de uma Nação que mostra a entrada da Inglaterra na 2ª Guerra.
O documentário do qual falei.
Escrevi esse blá-blá-blá todo para deixar claro que o amor dos dois é mero detalhe nesse rolo que envolvia simpatias pelo nazismo (*recentemente apareceu um vídeo com o então príncipe herdeiro ensinando as sobrinhas crianças, uma delas a atual rainha, a fazer a saudação nazista*), uma mulher inadequada para ser esposa de um rei (*verdade*) e uma guerra que estava se aproximando rapidamente (*e gente como Churchill sabia disso*). É um caso de amor, mas é uma situação política gravíssima.
Ensinando as sobrinhas a fazer a saudação nazista. Tão fofo!
Cadê a ligação com Harry e Meghan? Ah, verdade, Harry já usou fantasia de nazista em uma festa... Foi um escândalo e ele veio à público se desculpar, porque, bem, há nazistas na Inglaterra hoje, mas muito mais gente que conhece a história do país minimamente, fora que a rainha, avó do moço, é ex-combatente da 2ª Guerra. Voltando, Eduardo era rei, Harry só senta no trono se uma catástrofe acontecer, ele é somente o sexto na linha de sucessão e já temos até um herdeiro do trono, o Príncipe Charles, casado com uma divorciada que foi sua amante.
Seis meses depois da abdicação, uma visitinha à Hitler.
O pessoal que não se informa, ou vive no mundo de unicórnios e nuvens cor de rosa parece crer que a Família Real Inglesa nunca encarou um escândalo qualquer durante o governo de Elizabeth II. A Princesa Margaret, irmã da rainha, se divorciou, dois filhos da rainha Elizabeth II se divorciaram. O que era escândalo nos anos 1930, e era MESMO, não é uma mancha no currículo da maioria. De resto, o que separa Meghan de Wallis? Meghan Markle, e a matéria da BBC faz questão de pontuar, tinha uma carreira, Wallis nunca trabalhou. E, claro, Markle é negra, o filho do casal foi comparado a um chimpanzé, não em um jornal sensacionalista, mas por um repórter da BBC.
Isso deve ter um peso muito grande na balança. Mas parte dos delírios comparativos vem de uma série de obras (*The Crown, por exemplo*) que falam do amor entre Wallis e Eduardo, mas não falam de nazismo, não mostram que o rei visitou Hitler seis meses depois de renunciar, que ele não era um pobre perseguido, mas alguém que poderia ter arrastado a nação para o nazismo e foi espionado durante toda a guerra. Por qual motivo não o deixaram ir para o Canadá? Um rei não deixa de ter seus seguidores, mesmo depois de renunciar.
Vamos falar somente do amor dos dois e esquecer da política envolvida. Assim, é mais fácil fazer comparações imbecis. |
O pessoal tem que parar de querer limpar a imagem de Eduardo VIII e Wallis e de ficar querendo fazer comparações esdrúxulas. Escrevi o texto, porque, sim, fiquei bem ofendida com essa matéria e seus comentários e queria mostrar que não é SOMENTE um caso de amor bonitinho, mas um drama político de grandes proporções e que poderia ter mudado os rumos da 2ª Guerra Mundial.
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