Estamos entrando em tempos que podem ser sombrios. Eu, de minha parte, espero estar errada, muito errada, aliás, e me retratar daqui quatro anos dizendo que, sim, o candidato que não será nomeado era injustiçado e fez um bom governo. Desejo isso por mim, pela minha filha, por todos os habitantes do Brasil, especialmente, por aqueles que sentem mais ameaçados por sua eleição. Aliás, ele será o primeiro presidente do qual minha filha se lembrará, espero que sua memórias sejam boas, ou neutras, como são as minhas sobre o General Figueiredo, porque de Geisel, não me lembro mesmo. Enfim, estabelecido isso, é mais um post político e feminista. Quer fugir dele? Dá tempo, viu?
O casamento como carreira ideal para as mulheres. |
Em 1981, Paulo Maluf, na época governador biônico de São Paulo, disse "Professora não é mal paga, professora é mal casada." Anteontem, no Twitter, li a seguinte frase de uma moça "Não preciso receber o mesmo que um homem, tenho marido para me bancar." Era uma resposta para a falta de mulheres em uma foto de apoiadores do candidato citado, mas não nomeado, no primeiro parágrafo. Foi algo dito gratuitamente, como uma ofensa para a outra mulher que fez a observação, mas algo absolutamente conectado com o momento em que vivemos. A lógica, aliás, é a mesma.
Mas case bem, case para ser rica, ou vai trabalhar dentro e fora de casa. |
Uma mulher bem sucedida, na perspectiva de várias pessoas, ainda é aquela que arranja alguém que a sustente. Esta não é uma ideia feminista, aliás, as feministas lutaram e muito para que as mulheres pudessem trabalhar em condições igualitárias, seguras, e terem acesso a todos os cargos e profissões. Vejam bem, não que não pudessem trabalhar, porque mulheres pobres sempre trabalharam, na época da escravidão em nosso país, mulheres nessa condição não eram isentas do trabalho pesado (*"trabalho de homem"*) por serem mulheres, a questão sempre foi respeito, remuneração justa e oportunidades iguais. Se olharmos para o nosso país quase 50 anos atrás, encontraremos a seguinte situação: "Uma mulher com curso universitário no Brasil em 1970 ganhava em média 41% do salário médio de um homem com diploma. Hoje, o percentual é de 75%." Um progresso considerável, certo? Para muita gente, parece que não.
Durante muito tempo, a maioria das mulheres, mesmo pobres, era estimulada a ver o trabalho como algo temporário, um bom casamento era a meta de vida. |
O problema é que frases semelhantes serão muito ouvidas nos próximos anos. Talvez, inclusive, saiam da boca de políticos, homens e mulheres, alinhados com a futura e provável orientação do governo federal. Poderão ser ditas por mulheres comuns, também, e de forma sincera, para quem enuncia, claro, de que casamento é o projeto de vida de qualquer mulher. Nessas horas, lembro sempre do livro "E o Vento Levou" (*vol.1 e vol.2*), porque a discussão não está no filme, quando Scarlett O'Hara se questiona sobre qual a razão de investir tanto tempo em prendas e disciplina (*aquela série de "não podes"*) para arriscar tudo em uma temporada caçando um marido, duas no máximo, ou será vista como uma encalhada, e depois de casada ficar em um canto com as matronas, mesmo sendo uma moça de 16 anos. Casar e procriar eram os objetivos máximos da vida de uma mulher burguesa, ou nobre, as demais, sempre tiveram que trabalhar muito, mesmo depois de arranjarem o seu "provedor", ainda que não recebessem por seu trabalho, ou fossem sub-remuneradas.
Scarlett é ótima no filme e no livro, mas algumas discussões feministas importantes, mesmo ela não sendo feminista, são feitas no original. |
Enfim, o ponto central das duas frases que citei lá em cima é que uma mulher não tem do que reclamar, desde que arrume um marido rico. Sindicato? Só as barangas e encalhadas ou mal casadas precisam dessas coisas. E se precisam, é por culpa delas, ou incompetência. Aliás, conhecem aquela dito popular "nascer pobre é destino, casar com pobre é burrice"? As duas frases sinalizam, também, uma forma de reafirmar uma visão de mundo arcaica e violenta para com as mulheres, porque depender de alguém é sempre uma forma velada de escravidão.
E, sim, você pode confiar no seu senhor, pode ser o seu projeto de vida arrumar um desses para que ele lhe chame de sua (*porque o dono é ele*), tal e qual na espetacular abertura do filme "O Casamento do Meu Melhor Amigo", e está tudo muito bom. no fim das contas, a é escolha sua, desde que tenha em mente que você está assumindo um risco. E mais, se o casamento acabar, a mesma sociedade patriarcal que lhe soprou no ouvido que casamento é carreira, vai dificultar a sua pensão e chamar você de aproveitadora, afinal, você pode trabalhar e ganhar o seu sustento, mesmo tendo, sei lá, negligenciado estudos e carreira formal pelo seu marido e família. Isso não importa. Lembram do meu texto "Se Marido não é previdência, esposa não deveria ser empregada doméstica". Recomendo a leitura. De qualquer forma, a feminista de plantão está aqui para avisar. Aliás, avisar, não é impôr uma visão de mundo. Feministas, normalmente, há exceções, claro, só avisam e fazem reflexões e se mobilizam, mas não obrigam ninguém a escolher um caminho X ou Y. Normalmente, quem está do outro lado é que quer obrigar, discriminar e oprimir, como forma de manter privilégios, os seus, no caso dos homens, ou o do seu senhor, no caso das mulheres.
Em uma sociedade patriarcal, na qual as mulheres valem menos, recebem salários menores, tem menos direitos. Mãe feliz, é mãe de menino. |
De qualquer forma, a gente pensou que iria deixar esses arcaísmo para trás, que O Conto da Aia era somente uma distopia literária e nada mais que isso, mas quem vota em quem tem projeto de levar o país 50 anos no passado, deve assumir o que está fazendo, especialmente, quando será você a ouvir que não merece um salário justo, porque é mulher e engravida. E torça para ter filhos homens, porque dentro dessa mesma lógica misógina, cabe a eles bancar você no futuro. Filhas, neste caso, não servem. Já eles, os filhos, são uma forma de investimento, sabe? Assim, tipo em Caminho para as Índias e outras novelas exóticas da Glória Perez. Mas é preciso confiar neles, também. Mas, você sabe, não é? Se os filhos e filhas não são bem educados, a culpa, dentro desse mundo ideal, será sua, também. Quem avisa, amiga é!
0 pessoas comentaram:
Postar um comentário