quarta-feira, 18 de julho de 2018

Comentando as primeiras imagens de She-Ra da Netflix e o trailer de Marvel Rise: Iniciation



Anteontem, dois assuntos pipocaram na rede relacionados à animação americana centrada em personagens femininas, que mexe com questões como representatividade, e um rendeu mais do que outro.  Uma delas me animou muito, a outra, nem tanto, mas dado o barraco que gerou e ainda gerará, decidir me pronunciar sobre o caso.  Vamos ao que me deixou animada, a Disney-Marvel lançou o trailer da minissérie Marvel Rise: Iniciation que trará para a animação super-heroínas adolescentes como Kamala Khan, a Ms. Marvel, Spider-Gwen e a Garota Esquilo (*esta última só conhecia de nome*).  Segundo me informei, Spider-Gwen, que é o "homem aranha"  de um universo alternativo, foi acusada de um crime e outros heróis teriam que persegui-la. Ver Ms. Marvel animada me deu uma alegria enorme.  Fiquei feliz mesmo.  Vejam o trailer, está aí embaixo.


Marvel Rise estréia no canal Disney XD em 13 de agosto.  Terá, também, um filme animado no fim deste ano.  O que eu vi?  Heroínas adolescentes com vários tipos físicos, um character design afastando-se do moderno e monótono character design que impera em muitos desenhos atuais.  Não é lindo, não chega a ser um anime, mas, caramba, ele me enche os olhos comparado com o material norte americano que sou obrigada a ver com minha menina de 4 anos.  Falei disso superficialmente no meu post sobre a Teen Titans Go!  E chegamos, claro, a outra novidade de anteontem, a que causou maior impacto na internet, pois colocou em evidência as divergências ideológicas dentro do meio nerd e nem tanto, as primeiras imagens de She-Ra.

Logo, logo, estréia na Netflix.
Para quem não sabe, está para estrear um remake do desenho da She-Ra, que foi lançado em 1985, sob a responsabilidade de Noelle Stevenson, do elogiadíssimo Lumberjanes, dentre outros trabalhos.  Sim, remakes estão na moda e isso, aos meus olhos, raramente é bom sinal, mas se tiver que explicar, vai render um texto dentro do texto.  Resumindo, prefiro ideias novas à remakes e reboots.  Enfim, She-ra, irmã gêmea de He-Man, era a super-heroína que lutava contra a Orda, uma organização que mantinha um governo ditatorial em um planeta no qual coexistiam magia e tecnologia.  

A heroína em sua vida comum era Adora, uma princesa sequestrada pela Orda quando bebê e treinada para ser uma de seus comandantes.  Um dia ela descobre que está do lado errado e é escolhida para ser She-Ra uma (super)heroína lendária.  Adora só tinha 16 anos, mas parecia ser uma mulher adulta, assim como She-Ra.  O tom de voz de Adora era suave, enquanto o de She-Ra era mais grave e carregado de autoridade.  Ela tinha super força e outros poderes, além de um cavalo alado falante de nome Ventania.  Era um desenho ingênuo, moralista como tantos na época, mas com mulheres fortes, a exaltação de bom sentimentos e valores que hoje estão na moda, como a sororidade.  Para a média da época, era um material feminista.

She-Ra era uma das poucas (super) heroínas de desenhos nos anos
1980, com certeza a única a ter o seu próprio seriado.
Basicamente, She-ra foi encomendada pela Mattel à Filmation, um estúdio que fazia animações bem baratas e reaproveitando o character design das personagens.  Coisa bem tosca, mas a gente assistia.  Havia a percepção de um nicho, que era o de super-heroínas para meninas, uma carência que poderia ser explorada e ajudar a vender brinquedos.  Não havia animes na TV norte americana, nem na nossa, que contemplassem esse público. A maioria dos desenhos que tínhamos na TV não traziam mulheres heroínas, eram centrados em personagens masculinos, ou velhas animações que passavam por décadas.  Eu assistia Comandos em Ação torcendo para que aparecessem as poucas mulheres soldado do grupo.  Por conta disso, coisas como Josie e as Gatinhas (*o normal e o do Espaço*), She-Ra e outros faziam tanto sucesso entre as meninas e meninos, também.  

Repetindo, a gente via o que passava e se apegava a algumas personagens, shipava (*eu queria que a Adora se entendesse com o Gavião do Mar e achava o Arqueiro um mala sem alça*) e tudo mais.  Sim, fazíamos isso.  Agora, lamento, mas She-Ra não tinha nada de brilhante, nadinha, era somente um desenho que nos dava algum alento.  Tivéssemos uns três ou quatro animes de mahou shoujo passando na nossa TV na época e muita gente nem lembraria da princesa do poder.  E eu falo isso com a certeza de quem vibrava quando um ou outro anime aparecia nas TVs e que trocava She-Ra por Angel, a Menina das Flores, ou Honey Honey, sem pensar duas vezes.  Isso sem falar em Patrulha Estelar, que na série original só tinha, basicamente, uma personagem feminina.  Eis um exemplo de um remake que fe bem ao original.

Olhando as imagens, como é que eu achava o Gavião do Mar
interessante?  Ah, sim, os outros eram piores... 
E eis que saiu o novo character design de She-Ra. Ele é absolutamente adequado à média do que é a animação norte americana atual estilo Cartoon Network.  Nada brilhante, nada realmente bonito.  Funcional.  No caso desse She-Ra, parece ser mais limpo, sem os excessos usados apra dar comicidade.  Daí temos, de um lado, os progressistas que vêem o character design (*e só temos isso até agora*) novo e dizem "Isso aí!  Está lindo e a personagem não está hiperssexualizada!  Agora, sim, parece uma adolescente!" e os outros (pseudo) conservadores reclamando que estão estragando a sua infância, caras que nem eram crianças na época de She-ra original, e os que dizem que as feministas estão destruindo as personagens femininas dos sonhos deles... 

Para quem não sabe, ou finge não saber, a gente se apaixonava por personagens quando era adolescente e até criança e lembro bem da musiquinha de Xuxa, afinal, o desenho passava no programa dela, e seu refrão: "Por Grayskull, She-Ra, She-ra/Me apresenta pro He-Man/Teu irmãozinho é uma gracinha/E eu sou todinha do bem/Por Grayskull, She-Ra/He-Man é um gato alto-astral/Desculpe se eu sou ousadinha/Beijinho-beijinho, tchau-tchau".  Sim, He-Man, uma personagem inspirada em Conan, era desejável, mas ele tinha muitas virtudes que não ficavam no físico. Ele era um herói perfeito, assim como She-Ra era perfeita.  Os desenhos da época tendiam a ser assim.

O novo desenho vai ter Ventania?
Olha só, eu acredito que os dois lados, ou três, estão exagerando.  Se você gosta do character design hegemônico da Cartoon e similares, e descobri uma série nova centrada em meninascom Júlia ontem, outra espécie de remake, Harvey Street Kids, você deve ter achado bonito em si mesmo.  Eu não gosto, já escrevi isso, mas entendo quem acha esse traço moderno e atraente.  She-Ra realmente não está hiperssexualizada, não que acredite que alguém da Filmation estivesse querendo vender a She-ra antiga como uma sexy symbol, era preguiça mesmo.  E eu acho que a arte dos desenhos como She-Ra era somente exageradamente colorida, o que tornava a coisa um tanto pesada.  Hoje, é algo absolutamente datado.  Agora, nada disso impedia alguém de se apaixonar por ela e fantasiar.  

E parem de graça, de se fazerem de desentendidos, qualquer material animado, ou série de TV, tende a render shipps, fanarts (*já saíram toneladas da nova She-Ra*), fanfics, o diabo e quem faz isso não é criança, ou pré-adolescente, nem é predominantemente adolescente, mas gente adulta mesmo.  A qualidade pode variar, mas esse material sempre será feito e começou a aparecer no século XIX.  Agora, o problema a meu ver é que a personagem ficou andrógina e isso só pode ser proposital.  Dessexualizar parece uma obsessão.  Daí, além de um rosto que nada tenha de gendrado, quando olho para a nova She-ra só consigo pensar em um Thor menino, ainda temos decote zero, os shorts (*que parecem uma ideia tirada de Shoujo Kakumei Utena, mas são mais longos*) e a falta de busto.

Arqueiro será negro.  A outra é Cintilante?  Não sei.
Houve quem lamentou que a nova She-Ra não tivesse busto, houve quem disse que agora, sim, ela parecia uma menina.  Bem, ela não parece uma adolescente, não a média das adolescentes, porque  muitas meninas começam a ter busto a partir dos 10-11 anos, antes até.  E bustos vem em vários tamanhos, a nova She-Ra em algumas imagens (*e são poucas*) parece pré-adolescente, sem características sexuais secundárias marcadas.  Ela me lembra algumas meninas do sexto ano, eu sou professora e convivo com pré-adolescentes e adolescentes o tempo inteiro, que tem entre 10-13 anos no máximo e olha que algumas delas, como eu mesma nessa época, já tem curvas e busto.  Nada tem de andróginas e favor não confundir isso com ser tomboy, ou com expressão de sexualidade, orientação sexual.  Falamos de aparência exterior que depende menos de vontade, ou questões de ordem psicológica, e mais de hormônios.  Por isso, repito, qual será a idade da nova She-Ra?  

Esta imagem, particularmente, me parece bem andrógina.
Tanto os que hiperssexalizam as personagens femininas, quanto os que querem retirar delas qualquer sensualidade estão, a meu ver, no mesmo campo.  São assujeitados pelo dispositivo da sexualidade, tem necessidade de regular, de controlar.  Uns querem tudo mostrar, despir, objetificar meninas e mulheres, afinal, elas existem para seus apetites, outros, sejam conservadores ou pessoas progressistas (*algumas feministas em especial*), parecem obcecados por proteger, daí, cobrir, resguardar, negar a existência da libido, do desejo nos adolescentes.  Já vi uma Youtuber feminista dizer que "meninas" menores de 18 anos não deveriam namorar.  Olha, isso é puritanismo travestido de engajamento na defesa das mulheres.  A pessoa não sabe, não tem noção, mas está junto com os religiosos fundamentalistas e moralistas que atacam museus contribuindo para que nos tornemos Gileade.  Não sabe o que é Gileade? Recomendo O Conto da Aia.  E, amiguinhos/as, se Gileade vier, somos nós, mulheres, que vamos sofrer mais.

Quer dizer que se eu não gostar da aparência disso aqui,
eu estou afirmando que prefiro machos bombados,
promoção da masculinidade tóxica e não
entendo que é produto infantil?  Aliás,
estamos retrocedendo tanto que passamos a
acreditar de novo que todo desenho é infantil,
ou somente crianças podem gostar?
Terminando, o nome do desenho não fala em "Princesa do Poder", mas "Princesas do Poder".  A sinopse é rala e fala de uma Adora órfã.  De resto, o ponto de partida é o mesmo, a Orda a tomou para si.  Como será a série de fato?  Ninguém sabe.  Então, convém parar de dizer que é maravilhoso, porque não temos elementos para discutir isso, salvo as tais imagens.  Não posso dizer que será bom, ou ruim, em cima de quatro, ou cinco, ilustrações.  Agora, para ser melhor que o original, não será necessário grande esforço, os roteiros dos desenhos norte americanos estão bem melhor elaborados esses dias.  

Tanto She-Ra, quanto He-Man eram desenhos fracos.  Havia outros melhores na época  e que nem eram brilhantes, também.  De resto, podem cassar minha carteirinha de feminista, mas não há ninguém nesse mundo que vá me fazer achar que esse novo character design de She-Ra, ou o de Thundercats, que também não estreou ainda, é bonito, e desafio a provar que se eu não gostei é porque gosto de hiperssexualizar mulheres e de machos bombados.  Isso é desonestidade.  

De todas as ilustrações oficiais, esta foi a única que gostei.
Também, não adianta dizer que o desenho não é para mim, porque, bem, como mãe atenta eu preciso assistir pelo menos um, ou outro episódio de materiais que minha filha está assistindo, ou querendo assistir.  Vocês nem imaginam a quantidade de tempo que eu tenho que investir assistindo coisas que, em condições normais, eu nunca assistiria. Fora, claro, o assunto do blog.  A representação feminina na cultura pop é um dos focos do Shoujo Café. E, repito, colocar uma She-Ra sem decote, sem busto, com aparência andrógina e shorts não vai tornar o produto mais feminista ou mais legal para as crianças e pré-adolescentes e quem mais se interessar.  Um bom desenho, filme, ou o que seja precisa de boas histórias e bons personagens.  A aparência a gente releva na maioria das vezes.

8 pessoas comentaram:

Valéria, obrigado por expor a sua opinião, pois é basicamente o que eu acho.

Não é questão de ter uma memória afetiva com esses desenhos e com os seus traços datados dos anos 80, mas é irritante essa tendência de desenhos com design tortos e cômicos atual, simplesmente não consigo conceber a ideia que para fazer qualquer série mais "progressista" seja necessário abdicar tanto do seu traço com medo de sexualizar seus personagens, e também acho estranho quando alguém vem com "não é para a sua idade", afinal, vamos voltar a estigmatizar que animações são produtos apenas infantis e nada mais que isso?

São várias variantes aí mas também tenho a opinião que não me agrada, só que acabo guardando a opinião para mim por estar no meio de muitas pessoas que defendem esse tipo de caracterização e acham "mimimi" de velho saudosista quando discordam de que está feio, esquisito, e daria para fazer melhor.

Fiquei em dúvida na parte do "não eram bons"? Datados, com certeza, roteiros de ação e aventura dos cartoons daquela época dificilmente sobreviveriam a ação do tempo, mas She-Ra/He-man lembro como um dos grandes fenômenos de público dos 80's. Mas tirando isso, o que realmente me incomoda é como o Ocidente tá só caminhando numa linha reta, a não ser que você seja de uma produtora menor ou indie. Eu tenho preferência pelo Japão, e de lá me considero consumidor de tudo: do ecchi pevertido ao shoujo mais girl power (foi a sailor moon que me trouxe pra esse mundo) só que coisas com politicagem ou ideologia escancarados, vindo na frente do roteiro como é o que essas imagens e a sinopse oficial tentou passar, eu perco 100% do interesse (mesmo se no fim das contas tiver um roteiro bom, ainda assim tô duvidando).

Existe uma espécie de aversão ao feminino na cultura moderna (não tanto mas ainda vai piorar provavelmente). A senhorita Bellum por exemplo foi cortada do remake de MSP porq achavam q era uma personagem machista (por ser bonita) quando na verdade era uma crítica. Afinal ela era muito mais capaz como líder do q o prefeito mais tinha q ser uma secretária e era claramente frustrada causa disso. Não entendo porq essas personagens precisam ser masculinizadas para demonstrarem poder

O character design não masculinizou She-Ra, tornou a personagem andrógina. São coisas diferentes. Quanto à aversão ao feminino, não percebo isso. Agora, há uma necessidade de repensar como esse feminino fi retratado pelos homens, ou a partir de parâmetros ditados por eles. Caso da antiga She-Ra, por exemplo.

Valéria, acredito que o Felipe quis dizer por conta do estilo de desenho escolhido mesmo. Androgenas tem um monte hoje em dia, mas nesse caso é literalmente o Ben10 de peruca: https://imgur.com/8t2iWGA

Olha, eu até entendo o porquê as pessoas reclamam desse novo design da She-Ra, afinal, gosto é gosto, mas pessoalmente, eu gostei bastante. Não colocaria no mesmo balaio de Thundercats de jeito nenhum, porque ao contrário desse (que está claramente indo na onda de Teen Titans GO e derivados), She-Ra parece se levar mais a sério e ter mais senso de estilo. Ainda é cedo para julgar as intenções do cartoon como um todo, como já foi dito, mas indo pelas imagens liberadas (e dando uma olhada nos criadores) achei tudo bastante reminiscente de shoujos dos anos 80/90. Óbvio, os designs em si ainda são bastante cartoon, principalmente no rosto, mas de resto (roupas, corpo, cabelo, e especialmente, a paleta de cores), achei bem clara a intenção de dar um ar de Magical Girl para esse novo reboot, algo que me agrada bastante. She-Ra realmente está longe de ser um desenho de grande qualidade no seu enredo, mas olhando para premissa, a She-Ra era praticamente uma Magical Girl ocidental da época, de fato, então o reboot ser assim faz bastante sentido pra mim.

E sobre a história da sexualização ou dessexualização dela... acho que estão pegando pesado demais com o desenho, de ambos os lados da discussão. Sinceramente, não achei a She-Ra andrógina; seu rosto, talvez, mas se fomos julgar por esse critério, quase nenhum anime passa, pra começo de conversa. Ela pode até ser 'Ben 10 de peruca', como o Thiago Barros disse, no rosto, mas a caracterização de um personagem vai bem além disso e achei a dela bem feminina, ainda, com longos cabelos, short-saia e tudo mais. Nunca dariam uma roupa dessas para o Ben 10, é o que eu quero dizer.

No mais, eu concordo que a dessexualização excessiva de adolescentes por parte de gente tentando ser progressista muitas vezes acaba sendo mais repressora do que empoderadora de fato, mas eu realmente não acredito que isso se aplica à esse desenho em particular, pelo menos do pouco que vimos até agora. A falta de busto da She-Ra me parece menos como uma afirmação social e mais, como já disse, uma tentativa de emular um visual shoujo retrô para a série (e protagonistas de shoujo muito raramente têm bustos grandes ou formas muito femininas, a feminilidade física delas é geralmente expressada nas roupas e no cabelo).

Enfim... é esperar para ver o desenho, mas essa resposta negativa que essas poucas imagens tiveram foi bastante desproporcional ao conteúdo apresentado, na minha opinião.

Na verdade achei esse traço novo o mais machista de todos, me passou a mensagem que quando a menina vai se empoderar, virar a She-Ra, ela vira um garoto...

Eu realmente ainda não consigo acreditar que a She-ra de antigamente tinha 16/17 anos kkkkk
Eu achava até pouco tempo que ela devia ter uns 25/28
Agora com esse novo desenho ela agora está parecendo ser adolescente mesmo, e ainda fazendo jus a personagem.
Mas ainda eu não curti o visual do Thundercats Roar :/
Pq tipo... não ficou bonitinho e tal (apesar de eu achar aquele Teen Titans Go! com um visual mais foto e tal...)

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