Gravidez na adolescência significa atraso na vida escolar da menina. Se podemos evitar, ou ajudar, por qual motivo não fazê-lo? |
Comentei esta semana uma matéria do Japan Times sobre a gravidez na adolescência e a forma como isso é tratado pelas escolas públicas japonesas. Enfim, o mesmo jornal (*imagino que seja uma série sobre a questão*) trouxe uma outra matéria relacionada ao tema, a dificuldade da sociedade japonesa em lidar com o sexo e a educação sexual dentro das escolas.
O texto começa citando uma entrevista de um urologista, Dr. Yasuhiko Onoe, de dezembro de 2016, no qual o profissional foi incapaz de se referir ao pênis por seu nome correto e utilizou-se de uma palavra infantil, “ochinchin”. A partir daí o JT ressalta que a mídia em geral em dificuldade em usar os termos adequados para os órgãos sexuais, recorrendo aos infantilismos, ou recorrendo a termos ocidentalizados, como “penis”, em inglês, e escrevendo em katakana. Chocante, para dizer o mínimo.
Educação sexual mantém nossas crianças seguras. Lembrando que "kids", em inglês, não necessariamente se remete à crianças pequenas, ou crianças. |
Daí, a matéria pula para 16 de março deste ano, quando um membro da Assembleia Metropolitana de Tokyo e filiado ao partido Liberal Democrático, Toshiaki Koga, fez uma reclamação formal contra uma aula de educação sexual ministrada em uma escola de nível ginasial na região de Adachi. A aula tocou em assuntos difíceis, como relação sexual (seikō), contracepção (hinin) e aborto (jinkō ninshin chūzetsu). Um levantamento feito entre os alunos e alunas detectou que 44% deles considera correto para um aluno do Ensino Médio (colegial) fazer sexo. O deputado – ou algo semelhante – argumentou que é possível discutir DSTs (Doenças Sexualmente Transmissíveis) sem falar em relação sexual, contracepção e aborto, que esses seriam temas pesados demais para a faixa etária de 13-15 anos. O JT alertou no texto que, assim como a gravidez na adolescência, as DSTs vêm avançando entre os adolescentes e jovens japoneses.
O Comitê de Educação de Tokyo alertou as escolas de que é cedo para discutir a questão e que os três termos citados acima não poderiam ser usados de forma alguma, mas que poderiam e deveriam falar de DSTs. O comitê de educação da cidade de Adachi replicou que não houve nada de impróprio na aula e que o objetivo era prevenir as gravidezes precoces e, não, estimular os alunos e alunas a fazerem sexo. Segundo o Japan Times, Adachi é uma das prefeituras mais pobres de Tokyo e que os estudos apontam que a gravidez precoce está muito associada ao ciclo de pobreza da sociedade. O governo de Tokyo não recuou. Nada de aulas, conselhos individuais e orientação é suficiente.
Livro didático censurado em Rondônia. |
Triste, mas nem nos meus tempos de colégio o pessoal parecia tão obtuso em relação a esses assuntos. Lembro dos vídeos de terror com doenças sexualmente transmissíveis, lembro que um professor de Geografia no 1º ano (*por conta própria, ou sei lá*) usou parte de sua aula para falar de educação sexual, lembro de um monte de coisas, mas a escola, mal ou bem, tomava uma posição. De qualquer forma, ainda que o puritanismo japonês possa ter características próprias, vivemos tempos complicados.
Ano passado, pais acionaram MP para proibir livro escolar com desenho de pênis em Rondônia. O pênis foi censurado. Para quem não lembra, corpo humano, reprodução e tudo mais é conteúdo do 8º ano (*antiga 7ª série*), quando os alunos e alunas tem uma média de 12-14 anos. Houve, também, a questão com o quadrinho sobre O Diário de Anne Frank, banido por citar a palavra "vagina". Pelo jeito, é melhor engravidar precocemente, contrair DSTs e ter outros problemas do que ser informado e ser acolhido.
1 pessoas comentaram:
É muito triste perceber que ainda as políticas educacionais são patriarcais e conservadoras tanto quanto a ignorância (fruto de uma educação familiar e escolar também patriarcal e fruto de uma religiosidade meramente coercitiva, dogmática e dominadora) de nossos pais, avós e ainda dos pais de uma geração nascida dos anos 2000 pra cá! Ou seja, a sensação que me dá é quando tomo conhecimento de medidas adotadas como essa em Rondônia é de não faria diferença estar meu pai ou minha mãe - um senhor de 1945 e uma mulher de 1964 - ou um parlamentar, um juiz ou promotor desses..
Às vezes esse exército de conservadorismo subestima a inteligência ou a mera capacidade lógica de nossos adolescentes, principalmente considerando o conteúdo das letras de músicas propagadas pelos grandes veículos de mídia de massas.. Que a educação, mesmo com tantas tentativas de asfixia, nos salve!
Parabéns pelo post e discussão, Valéria!
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