Eu não vou ver a próxima novela das 21h da Globo, como não estou assistindo a atual. Consolo-me em acompanhar os textos críticos de alguns jornalistas que sigo e os escândalos que o autor vive aprontando, principalmente, com seus (pre) conceitos ultrapassados e com a disseminação de idéias equivocadas sobre questões sérias, levando a reação de entidades profissionais diversas. Walcyr Carrasco, ora, o que se poderia esperar? E se ele está dando audiência, pode tudo.
Gente competente não falta. |
De qualquer forma, com as primeiras chamadas da novela Segundo Sol, de João Emanuel Carneiro (JEC), algo vem incomodando e chamando atenção, apesar de se passar na Bahia, estado da nossa federação no qual 80% da população se declara preta ou parda, todo o elenco de protagonistas é (*socialmente*) branco. TODO. Veja que se poderia mesclar brancos e negros. Há baianos brancos, obviamente, mas o problema é este apagamento. E colocar negros e negras cumprindo cotas em tramas secundárias não esvazia a reclamação, ainda que você, provavelmente branco ou branca, acredite que é suficiente.
Será que não há atrizes negras que possam ser protagonistas? |
Enfim, vários textos já pipocaram sobre isso, apontando, inclusive, que, neste caso, não há argumento de época, ou lugar, é opção mesmo. Além disso, alguém fez uma listagem de 50 atores e atrizes negros que poderiam encarnar os protagonistas e postaram no Facebook. Mas li o texto da jornalista Cristina Padiglione, do blog Telepadi, e queria recomendar. Vale a leitura pelas questões que levanta. Trecho abaixo:
O início do texto da jornalista. |
Como volta e meia escrevo sobre novelas e esses problemas recorrentes, como apresentar um Brasil mais branco do que de fato é, ou escalar gente branca para papéis de orientais, por exemplo, é só clicar na tag novela e você encontrará um monte de coisas, se quiser.
ATUALIZAÇÃO: O jornalista Maurício Stycer, que eu sigo no Twitter, comentou o caso e publicou a nota que recebeu da Globo "explicando" a não escalação de um protagonista negro sequer. Deliciem-se com a cara de pau da casa grande: “Os critérios de escalação de uma novela são técnicos e artísticos. A Globo não pauta as escalações de suas obras por cor de pele, mas pela adequação ao perfil do personagem, talento e disponibilidade do elenco. E acredita que esta é a forma mais correta de fazer isso”.
Anotem aí, não há atores ou atrizes negros adequados a liderar o elenco de uma novela que se passará na Bahia.
ATUALIZAÇÃO: O jornalista Maurício Stycer, que eu sigo no Twitter, comentou o caso e publicou a nota que recebeu da Globo "explicando" a não escalação de um protagonista negro sequer. Deliciem-se com a cara de pau da casa grande: “Os critérios de escalação de uma novela são técnicos e artísticos. A Globo não pauta as escalações de suas obras por cor de pele, mas pela adequação ao perfil do personagem, talento e disponibilidade do elenco. E acredita que esta é a forma mais correta de fazer isso”.
Anotem aí, não há atores ou atrizes negros adequados a liderar o elenco de uma novela que se passará na Bahia.
4 pessoas comentaram:
A novela Orgulho e Paixão também não tem um negro. Vcs meio que ignoraram isso na postagem que fizeram.
Para ter usado o "vocês", imagino que não conheça o blog, tampouco tenha lido os três primeiros textos extensos que fiz sobre a novela. Teorizei, graças a uma leitora, inclusive como seria possível inserir um protagonista negro em Orgulho & Paixão, que pode se escusar de tê-lo pela época, pelo lugar, pelo grupo social no qual é centrado. Pode, mas não deveria. já uma novela realista, nem pode, nem deve, mas faz. Não vou apontar os textos quais são, como supostamente acusou uma hipocrisia de minha parte, se houver real interesse da sua e não somente o gosto por polemizar para fazer pouco caso daquilo que é importante, irá procurá-los, ou não. Bom feriado.
Teve uma série britânica sobre o rei Arthur, em que a Guinevere era negra e na peça do Harry Potter em que colocaram uma atriz negra para uma personagem que, apesar de não haver nenhuma descrição detalhada no livro, era reconhecida tradicionalmente como branca e europeia. Entre outros. Mas depois daquela polêmica com o coaching na novela, a própria rede globo assumiu que suas tramas são mais ficção que realidade.
MUITO OBRIGADA PELO POST, VALÉRIA!
Acompanho seu blog a pouco tempo, mas, me mantenho participativa e assídua no acompanhamento porque valorizo a maneira equilibrada e justa - na minha concepção - com que você conduz as discussões aqui, seja tratando de questões de gênero, etnia ou políticas de toda ordem, ou apenas falando de shoujo. Talvez a leitora (e aqui a colocação gramatical de gênero se atribui ao substantivo a "Fenix" - que fique compreensível) não tenha considerado que entre as muitas diferenças que foram pontuadas por você, a trama da novela das seis se trata da adaptação de uma obra posta, ou seja, alguém descreveu aqueles personagens! Inserir atores que contemplem a cadeia de expectadores brasileiros com a recorrente "cota da Globo para negros" só seria um artifício para diminuir o desconforto por parte de alguns afrodescendentes (não o meu!) e, claro, garantir mais audiência!
Em se tratando da nova novela das nove, meus pontos de crítica, além do já trazidos por você, Valéria, são em relação a algo que está para além da novela. Relaciona-se a distorção da identidade do povo baiano.
Eu sou baiana. Atualmente não resido em Salvador, mas sou soteropolitana. Quando vi as primeiras chamadas anunciando a novela O Segundo Sol fiquei impactada num primeiro momento e entristeci. Depois me dei conta que essa minha reação, em relação a forma como somos retratados, já me era familiar. Isso porque, em termos de massa - já que sou minoria - a Bahia que os baianos têm mostrado a décadas é uma Bahia embranquecida! Ou, pelo menos, de tentativas de embranquecê-la. Não temos, em termos de fenótipo, representações de negros na política (e quando conseguimos os veículos de mídia fazem questão de apagá-los ou polemizá-los até seu desgaste); as representações de negros na música, dança, artes plásticas e afins são constantemente esquecidas e/ou descartadas após o carnaval quando a prefeitura já conseguiu obter lucro sobre o jugo deles. Ivete Sangalo, Bel Marques, Daniela Mercury e o prefeito ACM Neto são uma pequena parcela da Bahia que têm vendido.
O último cúmulo do absurdo que tivemos recentemente foi na data em que o bloco mais tradicional de música e dança de nossa cultura (baiana) completou 39 anos de história - o Olodum -, a mídia deu pouquíssima importância e eles apenas tiveram um show realizado no Pelourinho; mas, em contrapartida, por não ter conseguido participar dos festejos de carnaval devido sua gestação, Ivete Sangalo, na mesma data, teve a sua disposição um trio elétrico para comemorar sabe-se lá o quê com o público num dos circuitos do carnaval: a Barra. A quem retruque que ela recebeu patrocínio de uma empresa de cervejaria, mas, o quão ingênuos somos para acreditar que não houve participação da prefeitura de Salvador nisso?!
A Bahia quer apagar seus negros da história, assim como a gente utiliza a borracha para limpar os borrões do lápis no caderno branco, porque, para mim, esse imaginário social de que chamamos todos de "Meu Rei!" nada mais quer do que tirar de nós a legitimidade do trono onde realmente poderíamos coroar!
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