sábado, 24 de março de 2018
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9:20 AM
"O galã deve dar o primeiro beijo na mocinha até o capítulo 16", já li várias vezes que esta era uma máxima de Janete Clair. O que vem acontecendo nas novelas de época modernas é uma correria danada para que certas coisas aconteçam, como o primeiro beijo. Em alguns casos, até para uma primeira relação sexual apressada e improvável, a depender do caráter dos envolvidos. Foi isso que aconteceu em Tempo de Amar com Inácio e Maria Vitória. Depois, o autor, por planejamento, quero acreditar, refez o arranjo e criou um romance da protagonista com outro moço, que se construiu com o tempo, com amizade, e que terminou prevalecendo ao término do folhetim. Algo raro, afinal, a mocinha parece condenada a ficar com o primeiro que a beija lá no início da trama. Vide a angústia de alguns em ter que ver Clara e Gael - o espancador e estuprador de mulheres que descobre que era tudo um encosto - juntos no final da novela das 9.
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Beijo só no capítulo #8 e não se empolguem,
porque o romance não desenrola tão cedo. |
Parece que os autores de hoje não confiam na força de suas histórias, no seu público, na criação de uma expectativa, na construção de uma relação mais sólida. E isso é o que Jane Austen fez em seu livro mais famoso, Orgulho & Preconceito, ela trabalhou suas personagens, a relação entre Darcy e Elizabeth. Estou revendo Sinhá Moça (1986), o primeiro beijo do par central ocorre no capítulo #8. Há capítulos nos quais o casal protagonista - Rodolfo e Sinhá Moça - nem se vê ou mal se encontra. Ela pensa amar outro, inclusive. E pensem que essa mesma situação ocorreu em Orgulho & Preconceito, Lizzie tem uma péssima impressão inicial de Darcy, agravada pelas mentiras que Wickham conta. Ela se encanta pelo embuste (Wickham), mas, sendo moça sensata, não se expõe (*coisa que a mocinha de Orgulho & Paixão faz o tempo todo*). Decepciona-se e descobre que pode ter pensado mal de Darcy. Daí, o título original da história, Primeiras Impressões, aquele que a autora não usou, dizer tanto sobre a história. Só que não pensem que o mocinho não precisa consertar algumas coisas no seu comportamento, ele revê uma série de idéias. A culpa não é só de Lizzie.
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Olha, a gente teve que esperar sei lá quantos capítulos por este beijo em Tempo de amar. |
Enfim, o beijo entre Darcy e Elisa(beta) aconteceu muito cedo. Desnecessariamente cedo. É a correria sem sentido da qual falei. E minha critica nada tem a ver com ter gostado do beijo, achado bonito, romântico. Na série de 1995, uma das coisas que mais me deixava angustiada é a cena na qual Elizabeth conta que a irmã fugiu com Wickham, tenta se controlar, não cair em prantos, e ele, Darcy, por seguir as regras sociais, sequer consegue tocá-la, consolá-la (*o que ele poderia ter pensado no momento, a gente pode imaginar lendo O Diário de Mr. Darcy de Amanda Grancer*). E foi bom assim desse jeito, de forma mais realista. Vi cena semelhante no último capítulo de Sinhá Moça (47), só que Rodolfo decidiu consolar a amada, que ainda não descobriu que o ama. Uma novela de época, ainda que com tons humorísticos, precisa saber lidar, torcer e distorcer convenções sociais. Os autores modernos parecem esquecer disso, às vezes.
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Eu realmente queria torcer por eles, mas Elisa está tornando as coisas, mas difíceis do que o Darcy. Achei que o problema seria ele... |
Só que eu nem vejo isso como o maior problema, dado que, como pontuei, os autores modernos parecem não saber criar a expectativa, a ansiedade, enfim, até a angustia em relação aos acertos amorosos dos casais de novela (*e de alguns livros, também*), o que mais me aborrece na novela até agora é que a mocinha é grossa. Sim, ela não é forte, ela não é moderna para sua época, ela parece mimada e mal educada. E por mais que eu goste de Nathália Dill, eu não consegui gostar de sua Lizzie ainda. A personagem original, e eu sei bem que Elisabeta não é a Elizabeth de Jane Austen, era sutil nos olhares e nas palavras, inteligente, comedida. Ela poderia, como fez, ir contra convenções sociais ou dizer o que pensa para quem achava que poderia ofendê-la. Só que a Elisa de Nathália Dill é agressiva o tempo todo e, bem, é difícil, para mim, gostar de uma protagonista assim.
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Audiência de quinta-feira. |
A novela está funcionando como novela? Acredito que sim, a audiência do terceiro capítulo foi recorde, o que deve ter feito os pessimistas segurarem a língua. Afinal, o primeiro capítulo não causou grande impacto no IBOPE. Mas para quem não acompanha essas coisas, novelas das seis são sucesso se marcam 23 pontos. São boas marcando 20. Foi-se o tempo em que a Globo esperava 50 pontos de audiência. Nem com Jane Austen. Agora, não acredito que teremos índices perto de 30 pontos. Acredito mesmo que vai ficar oscilando entre 20-21 e 25, com algum pico em um momento ou outro. De resto, Tempo de Amar entregou uma audiência estável em 23 pontos, se não me engano. Nada espetacular, mas absolutamente OK para o horário.
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Capa do volume #1 do mangá de Orgulho & Preconceito. Quer dizer, deve haver outros, este é o que eu tenho. |
Mas eu torço mesmo é para que a novela seja um sucesso. Torço para que mais gente leia Jane Austen, descubra a maravilhosa autora que ela era. Vá atrás das adaptações de qualidade de suas obras e, não, eu não estou falando de Orgulho & Preconceito de 2005. Torço para que as editoras de quadrinhos lancem no Brasil as versões mangá das obras da autora (*Não sabia que tinha? Posts: 1 - 2 - 3*). Serve até o mangá feito nos EUA (*se bem que não faço questão, não...*). É minha esperança. Sei que, se a novela não for lá essas coisas, muitos críticos nem vão querer saber que é uma "livre adaptação", vão dizer que Jane Austen não interessa ao grande público. Afinal, é coisa de mulherzinha, né?
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Séries da BBC também inventam beijos, OK? |
Agora, para mim, é fato que a novela está se afastando do que Jane Austen tem de melhor: os diálogos. Darcy e Elisa brigando o tempo todo é de doer. E eu até já sei o que vem depois do beijo, que foi mais que consentido: uma nova briga. Enfim, espero que esse casal central melhore. Mas há mais coisas para ver na trama, inclusive a Ema de Agatha Moreira, que tem frescor de novidade e é, ao mesmo tempo, muito parecida com a criada por Austen. E, bem, com quatro capítulos a gente não pode, nem deve, falar muita coisa.
8 pessoas comentaram:
Como sempre, post maravilhoso, Valéria!
Eu concordo com tudo e é justamente esse fato que você apontou que sempre faz alguns casais coadjuvantes engolirem a trama dos mocinhos. Eu mesma nunca shippo protagonistas, porque essa coisa acelerada me incomoda.
Sou muito fã da Nathalia e também estou um pouco chateada com a personagem. Poxa! Você chegou a ver Cordel Encantado? Lembra da Doralice, que a Nath interpretava lá? Bem mais Lizzie Bennet do que a Elisabeta, até o momento.
Por enquanto tá difícil mesmo se apegar a essa mocinha e a esse casal.
Beijo!
http://www.cafeidilico.com/
Menina, eu só via Cordel Encantado por causa dela e do Felipe. :D Enfim, mas sei que o problema não é da atriz, mas do texto do autor e da direção de elenco.
Amei. Extamente o que penso. Ñ vejo novelas, voltei a ver por ser algo inspirado na Jane. Mas ta uma correria. Hoje em dia e dificil a gente sentir a tenção do Amor entre os casais. E sim Elisabetha e grossa e criança birrenta. Espero q mude.
Amei. Extamente o que penso. Ñ vejo novelas, voltei a ver por ser algo inspirado na Jane. Mas ta uma correria. Hoje em dia e dificil a gente sentir a tenção do Amor entre os casais. E sim Elisabetha e grossa e criança birrenta. Espero q mude.
Gostei da resenha. Não você acompanho novelas novas de epoca da Globo. Quando tento, parecem tramas e personagens modernos fantasiados 😑😑😑 Você sabe se têm alguma personagem na novela inspirada em Fanny Price ou em alguma trama de Mansfield Park? Obrigada 😊
Gostei dos comentários. Acho um grande equívoco fazer de Elisa e Darcy esse clichê do gato e rato que, até agora, soa bem forçado. Gosto de como o casal é desenvolvido na obra original: diálogos ágeis e espirituosos, discussão de ideias, que demonstram a personalidades dos dois e, aos poucos, o flerte por parte de Darcy. Não esperava que acontecesse exatamente do mesmo jeito, mas achei que descambaram para um implicância adolescente que em nada lembra o casal original.
Pra variar, você pôs em perfeitas palavras tudo aquilo que estou pensando desta novela. Elisa chatíssima, grosseira, insuportável. Não tem quem aguente.
Ainda tava me questionando como o Darcy brasileiro ficaria tão interessado numa menina tão descontrolada, quando esse beijo fora de tempo saiu. Péssimo roteiro.
Realmente a graça da novela está na Ema.
Concordo plebaplena, espero que o autor possa melhorar isso!
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