O primeiro beijo trocado. |
Vamos lá, este texto terá maior função do que discutir novela, porque eu gostaria de falar sobre amor. Quando eu era jovem - adolescente até lá pelos meus vinte e poucos anos - com zero experiência amorosa para além do cinema, da literatura, das novelas, do que minha mãe ensinava e das pessoas que observava, eu cria piamente em amor eterno, que só se amava de verdade uma vez na vida, que não se podia amar de formas diferentes e mais de uma pessoa ao mesmo tempo, que sexo sem amor não deveria existir e que nunca seria satisfatório de verdade. Continuo sem grandes experiências próprias, mas percebo que as coisas não são bem desse jeito aí. O problema é que muitos folhetins continuam operando nessas bases.
O romance apressado do casal que mal vimos juntos em tela. |
O mocinho trabalhador está agora no Brasil, sabe por carta do filho, decide voltar, mas bandidos o agridem e roubam na estrada. Ele é encontrado entre a vida e a morte pela vilã - provavelmente psicopata - que salva sua vida, mas decide que ele lhe pertence. Ele se recupera, mas fica um tempão cego e é dado como morto. A vilã mexe seus pauzinhos e o mocinho parece esquecer que tem família em Portugal, um patrão que o trata como filho, a dona da pensão em que morava, acredita nas mentiras que lhe contam de que sua amada casou e outro homem assumiu seu filho. Para arrematar, ele se casa com a vilã mentalmente desequilibrada sem pensar duas vezes.
Ouvindo Maria Vitória chorar por Inácio. |
O primeiro beijo dos dois foi roubado pelo rapaz (*não, não vou discutir consentimento, porque a gente sabe dos sentimentos de Maria Vitória por ele e o rapaz se desdobrou em desculpas depois*), mas, dias depois, o beijo foi compartilhado. Foram capítulos e mais capítulos construindo de forma sólida um romance, fazendo com que a relação dos dois fosse crível. Fora isso, Vitória Strada e Bruno Ferrari tem química. Eles funcionam juntos. As cenas deles são ternas, românticas, pontuadas por um texto bem estruturado e polido, e que é um dos destaques da novela.
Salvando a mocinha do vilão estuprador. |
Li em algum lugar que Inácio vai lutar pela filha e por Maria Vitória, que amoça estaria de casamento marcado com Vicente quando ele reaparecesse na sua vida. Olha, uma coisa é ter a mocinha enganada, aprisionada, e casando com o vilão, quando o mocinho - tido como morto - reaparece. Outra coisa é ela estar se casando com o cara mais legal da novela e aparecer o encostado do mocinho, porque ele aceitou casar com uma moça rica que não amava e ficou um tempão no bem bom por vários capítulos,enquanto a mocinha passava momentos terríveis, e impedir o enlace dos dois. Fora, claro, que estamos nos anos 1920 e ele está casado no cartório e na igreja com outra.
O primeiro beijo que não foi trocado, mas roubado. |
Certo, este texto não está caminhando para lugar algum, nem fiz as ponderações sobre o resto da trama que eu gostaria, e nem vou fazer,porque vou dormir. voltemos então ao amor. Essencialmente, boa parte dos folhetins continua trabalhando em cima daquela idéia inicial que pontuei: só se ama uma vez, de um jeito só,uma só pessoa e amor de verdade dura para sempre, se você o perde, vive amargurado pelo resto de seus dias.
De lá para cá, as coisas progrediram um tiquinho. |
Eu chorei por Tristão e Isolda (*li a minha primeira versão da história com 12 anos*), porque aquele amor era realmente impossível e me pareceu eterno. O mocinho ama a princesa filha do inimigo, acaba tendo que buscá-la para casar com o próprio tio, que tinha idade, talvez, para ser avô da moça. No caminho, a criada que recebera da mãe de Isolda um filtro de mor para servir para amoça relutante e seu marido imposto na noite de núpcias, termina servindo a beberagem mágica para os dois jovens e Tristão, que arrastado pela magia, esquece da honra e do dever, já Isolda,esquece que odeia o cavaleiro, porque ele não a tomou para si, como era seu direito (*ele matou o dragão que assolava o reino da Irlanda e poderia se casar com ela, porque era o decreto do rei, pai da moca*) e decidiu levá-la para desposar o tio. Depois disso, só tragédia, romance, mais tragédia, separação, mal entendidos, até chegar na tragédia final. E, sim, eu acredito que se possa amar somente uma vez na vida, só não creio que seja a regra geral para todo mundo. E, sim, um dos meus primeiros amores literários foi o Tristão. Lembro de que quando terminei a leitura, era um primeiro de janeiro,chorei por quase meia hora.
Edmund Blair-Leighton. Tristão e Isolda (1902) |
Talvez, como aventei no Twitter, os autores dariam um salto de trinta anos e os dois, viúvos, se reencontrariam por acidente em 1968 em uma passeata pedindo democracia,afinal, ambos pareciam ter uma postura progressista e democrática. Já maduros, com filhos criados, a velha chama se reavivaria. Terminariam juntos. A forma mais decente de uni-los seria esta. Seria uma forma razoável de resolver a situação reatando o romance do início, mas sem ofender nossa inteligência ou sensibilidades, afinal, a maioria torce pelo Vicente. Se os autores quiserem aproveitar a minha ideia, está aí, podem pegar.
E tudo começou com uma amizade. |
P.S.: prometo um texto decente sobre a novela da próxima vez. Este aqui foi coisa de fã que está shippando loucamente um casal.
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