Semana passada, assisti Assassinato no Expresso do Oriente. Gostei do filme em linhas gerais. É bem feito, tem uma bela fotografia, figurino, reconstituição de época e um elenco respeitável. Imagino que será indicado a algum Oscar. Dirigido e estrelado por Kenneth Branagh, o filme é uma refinada diversão e, ao mesmo tempo, pareceu-me aquém dos elogios que vem recebendo, mas eu não sou fã de Agatha Christie e isso pesou. O fato é que percebi a tentativa de modernizar uma narrativa de 1934, talvez tentando seguir de longe o que foi feito com o Sherlock de Guy Ritchie, mas sem se atirar com a cara de pau que tornou o filme com Robert Downey Jr. tão divertido.
Baseado em um dos romances mais conhecidos de Agatha Christie, esta é somente a última revisitação do livro. Mudaram um bom número de detalhes, nem eu, que nunca li o livro e fui inocente do desfecho da história (*acreditem em mim, é verdade*), já sabia disso. Como trata-se de um crime, tentarei ser econômica para evitar spoilers. Nossa história começa em Jerusalém, onde Poirot desvenda um crime e o filme aproveita a sequência para delinear de forma muito clara a personalidade detalhista do detetive, sua fixação por medidas e minúcias, como, por exemplo, uma gravata fora do lugar. Somos, então, transportados para Istambul, onde o detetive pretendia tirar suas merecidas férias. Pretendia, obviamente, isso não ocorrerá.
A "vítima". |
No luxuoso Expresso do Oriente, Poirot tem contato com uma série de pessoas mais ou menos curiosas e é abordado por um criminoso que vende antiguidades, Samuel Ratchett (Johnny Depp). Ele deseja contratar o famoso detetive para protegê-lo de mafiosos italianos que desejam mata-lo por ter-lhes vendido uma falsificação. Poirot recusa, mas logo terá nas mãos um mistério, o assassinato de Ratchett. O trem está retido em algum lugar da Iugoslávia (*acho que é isso*) por várias horas. Bouc (Tom Bateman), um playboy que é o gerente do trem e amigo íntimo do detetive, suplica sua ajuda e usa argumentos fortes: a polícia não iria investigar, mas culpar alguém se utilizando de preconceitos. Por fim, Poirot decide aceitar o caso e terá poucas horas para resolver esse mistério.
Será curta a resenha, porque qualquer coisa que eu escrever a mais poderá tirar a graça de quem vai assistir ao filme. Eu não me importo com spoilers, mas há quem morra por causa deles. Eu mesma só sabia do Expresso do Oriente o seguinte: o detetive era o Poirot, é um dos casos mais famosos de Agatha Christie, trata-se de um enigma do quarto fechado, o filme de 1974 (*que eu nunca assisti*) é lembrado até hoje. O que é um enigma do quarto fechado? Você tem um crime, ninguém teve como entrar, ou sair da cena do crime, então, quem é o criminoso? O Construtor de Norwood, caso de Sherlock Holmes, é um enigma do quarto fechado, assim como O Crime da Rua Morgue, resolvido pelo protótipo do detetive investigativo, Dupin, criado por Edgar Allan Poe. Outros ingrediente são acrescentados à trama, como o dilema moral do detetive que coloca em cheque sua noção de justiça, lei, enfim. Exemplo em Sherlock Holmes? O Pé do Diabo.
Alguns dos suspeitos. É muita gente no filme e pouco tempo para trabalhar as personagens. Ainda assim, fez-se um bom trabalho. |
Desculpe voltar a Holmes, ou Dupin, ou mesmo Arséne Lupin, mas eu não sou leitora de Agatha Christie. Li uma biografia dela quando adolescente, no auge do meu apaixonamento por Sherlock Holmes. O autor, ou autora, não lembro mais, se preocupou tanto em cantar as virtudes de Christie e sua superioridade em relação aos detetives arcaicos como Holmes, que eu tomei ranço. Coisa de adolescente, claro, mas o fato é que acabei não mergulhando na coleção de Agatha Christie da iha prima (*a dona de muitos dos primeiros volumes de Holmes que eu li e da tal biografia*), mas conheço seus detetives, por causa da biografia e outras leituras, de um ou outro filme, mas ler, nunca li.
Dito isso, o que eu posso falar? O filme é muito bem executado, mas - tomando pelo que leitores do livro comentaram - correram com a história e fizeram várias modificações. O Poirot de Branagh é menos roliço, mais atlético (*olha a tentativa de modernizar a coisa...*), e até tem um amor do passado, invenção pura. Algumas, tiveram um efeito interessante, como tornar o Coronel Arbuthnot um médico negro, interpretado pelo elegante Leslie Odom Jr., outras, principalmente no que tange à história em si, acabaram dando um tom que, para mim, foi forçado. Um amigo, leitor voraz de Agatha Christie, explicou-me que Poirot descobriu o mistério antes do que o filme mostra e que a cena em que uma personagem simula uma facada para despistá-lo, cena ridícula, diga-se de passagem, não existe no livro. Aliás, a lentidão do personagem em chegar ao desfecho do mistério no filme me fez pensar mal de Poirot. Só pensava que Holmes, ou Lupin, matariam a charada em metade do tempo.
Olha a Rei aí. |
Imagino que o filme possa receber indicações ao Oscar em categorias como fotografia, direção de arte, figurino, é um filme bonito de se ver, elegante. E Michelle Pfeiffer está fantástica. Ela merece ser indicada ao Oscar de Melhor Coadjuvante pela sua Sr.ª Hubbard. O resto do elenco é excelente, também. A Bechdel Rule é cumprida, mas basta ver a quantidade de personagens femininas do filme: Princess Dragomiroff (Judi Dench), Pilar Estravados (Penélope Cruz), Mary Debenham (Daisy Ridley), Hildegarde Schmidt (Olivia Colman), Countess Helena Andrenyi (Marwan Kenzari). Fora quem só aparece em figuração e também tem nome e sobrenome. E as personagens femininas, a maioria delas, são ativas e, ao mesmo tempo, coerentes com a época em que a história se passa.
É isso. Resenha curta. Atrasada, porque ainda tenho Os Últimos Jedi para resenhar... E preciso correr, porque, logo, logo, ficarei com minha internet indigente lá no Rio. Gostei visualmente do filme, mas achei o mistério aquém das minhas expectativas. Culpa do filme, imagino, mais que do livro. O final do filme anuncia uma possível sequência, vamos ver se rola... Coisa curiosa é ver Daisy Ridley em ambos os filmes e ela está mais bonita em Guerra nas Estrelas (Star Wars) do que em Expresso do Oriente. Aliás, comprei o livro. Se conseguir ler, será meu primeiro de Agatha Christie.
5 pessoas comentaram:
Eu sou fã de Agatha Christie, uma vez tirei um ano para ler só os livros dela que tinha na biblioteca aqui da cidade (eram dezenas rs) e sempre curti Assassinato no Expresso do Oriente, embora não seja o meu preferido. Ainda não vi essa adaptação, mas no livro Poirot percebe a solução em pouco tempo só demora para ir entendendo todo o contexto.
Sobre interesse romantico ele tinha a sua propria "Irene Adler) por assim dizer, e embora fosse uma relação tão platonica quanto a de Holmes, eles tiveram bem mais encontros.
Bem de qualquer forma ainda preciso ver esse.
Tantos filmes bons sendo lançados no cinema, em DVD\Blu-ray e a senhora me vem com um comentário sobre esse filme medíocre. Não sei se é falta de tempo, se os filmes bons a senhora ñ consegue ter acesso ou por má escolha de filmes mesmo. A senhora costumava comentar filmes de melhor qualidade, mas tem decaído bastante na escolha por filmes nos últimos tempos, beirando a mediocridade muitas vezes.
Espero que suas escolhas por filmes sejam mais sensatas e do bom gosto que a senhora tem e costuma apresentar. Cadê Lady Macbeth? Tulip Fever? Victoria e Abdul? First They Killed My Father? Mãe!? Loving Vincent?
A senhora já foi melhor com isso, então, por favor MELHORE
Agora, um troll vem exigir que eu resenhe o que ele, ou ela, quer assistir. É isso? Quem paga a minha entrada? Quem fica com minha filha? Ah, vá catar coquinhos, filho/a!
Melhor resposta!
Vai rolar resenha do livro?
Estou fazendo exatamente como o Lord Anderson, só que em vez de um ano, fiz um mês de Agatha. Na minha adolescência li dois livros dela: E Não Sobrou Nenhum e Os Elefantes Não Esquecem. Fiquei empolgado com o trailer do filme mês passado e resolvi pegar em uma biblioteca para ler, mesmo já tendo o spoiler (um amigo da faculdade acabou soltando).
De lá pra cá li mais cinco: Morte na Mesopotâmia, É Fácil Matar, Os Crimes ABC, Um Brinde de Cianureto e Noite sem Fim. Minha impressão geral é que os livros dela são fáceis de ler (você termina em dois, três dias), mas meio banais. Desses eu só gostei mesmo de Os Crimes ABC, história de um assassino em série, e Noite sem Fim que me pareceu uma espécie de romance noir. Quando li E não Sobrou Nenhum (devia ter uns onze, doze anos), fiquei com vontade de ler todos os livros dela, mas as leituras não sobreviveram a um olhar mais maduro, não. Um dia relerei para ver o que acho. Agora, eu já recomendei aqui e repito: a adaptação recente que a BBC fez do livro e que segue o original ficou muito boa. ^^
Quanto ao filme, como já foi dito, o Poirot demorou mais para descobrir. Aliás, todas as cenas de ação e correria foram acréscimo. O Poirot passa grande parte do livro sentado fazendo entrevistas. Aquela andança pra lá e pra cá foi uma tentativa de trazer mais dinâmica à história. Eu gostei do filme, mas vou ver o de 1974 porque pelo que falam parece ser melhor.
Postar um comentário