domingo, 16 de abril de 2017

Comentando Os Smurfs e a Vila Perdida (Smurfs: The Lost Village, 2017)



Quinta-feira, por causa da Júlia, fui assistir Os Smurfs e a Vila Perdida (Smurfs: The Lost Village).  Que dizer sobre esse filme?  Ele tem um roteiro bem arrumadinho, óbvio e raso do início ao fim, traz uma mensagem de empoderamento feminino que acredito não conseguir alcançar as crianças menores, o público direto do produto, e é visualmente muito bonito.  Em condições normais, eu não assistiria este filme, mas imagino que tenha um 3D interessante, já que os cenários em 2D já estavam deslumbrantes.

Resumindo a história, o filme começa com Smuefette se sentindo deslocada na vila dos smurfs, afinal, ela não é "menino" e não tem uma especialidade.  Um dia, acompanhada dos smurfs Robusto, Gênio e Desastrado, ela avista o que parece ser um smurf atravessando por uma fresta do muro proibido (*acho que este é o nome*) e decide segui-lo.  Ela é capturada por Gargamel, o feiticeiro que criou Smurfette para causar discórdia entre os smurfs, e consegue a informação de que pode haver uma outra comunidade de smurfs.  Gargamel decide ir atrás dela e capturar os smurfs desconhecidos.  Smurfette e seus companheiros querem chegar até a vila, também, e não contam nem para o Papai Smurf o que pretendiam fazer.  Depois de muitos perigos, eles descobrem a vila perdida do título, mas, agora, todos correm perigo, porque Gargamel está por perto.

Smurfette assume a liderança.
Os Smurfs foram criados pelo quadrinista belga  Peyo (Pierre Culliford) em 1958.  Nunca vi nenhum dos álbuns da série.  As criaturinhas azuis, saíram dos quadrinhos para a animação na década de 1980.  O material, que era feito por norte americanos e foi exibido no Brasil.  Eu era criança e assistia, achava divertido, mas era aquilo, o que tínhamos na TV, nós víamos e, na época, era basicamente material norte americano.  O aniversário de 8, ou 9 anos, não lembro direito, do meu irmão foi Os Smurfs.  Desde essa época, me incomodava muito o fato de termos um monte de meninos e uma menina só.  O termo "princípio de smurfette" (The Smurfette Principle) foi cunhado por causa da situação ridícula que vemos nesta série.

Além de ser a única entre muitos machos, Smurfette foi plantada entre os smurfs para destruí-los.  curiosamente, quando ela é criada por Gargamel, ela é morena (*e, se o desenho animado está certo, não usava salto alto*), agressiva.  pela ação de Papai Smurf, a própria encarnação da ordem patriarcal, ela é convertida em uma loura dócil, sexy (*sim, salto alto, longos cílios, vestido vem ajeitadinho etc.*), muito delicada e ingênua.  É essa Smurfette que vemos no filme, sem ser meio burrinha como me lembro dela no desenho dos anos 1980, mas com o adicional de sentir-se perdida, sem uma especialidade, deslocada não por ser mulher, isso nem é tocado, mas por sentir-se pouco competente e diferente.

As smurfs parecem menos estereotipadas, apesar dos comportamentos clichê.
Até aqui temos um clichê machista recorrente, porque usado à exaustão até nossos dias, no entanto, há outro clichê reforçado, e eu queria achar o vídeo da Anita Sarkeesian sobre isso, que é o da personagem feminina que só é isso, feminina.  Como assim?  Todas as personagens masculinas, ainda que reduzidas à estereótipos, caso dos smurfs, tem uma especialidade, uma competência que os define.  Robusto é forte, nessa versão nova, também é burrinho, afinal, todos os marombados são assim, não é? (*Estou sendo irônica, isso realmente me incomodou*) Gênio é inteligente, na versão antiga, ele me parecia somente um chato, que achava que era mais do que era.  Havia um smurf cientista, eu acho, e não era o Gênio. Já Smurfette é somente uma menina.  Sua função é essa, enfeitar, encantar, ser disputada e, claro, não ter especialidade alguma.

Só que estamos no século XXI, ainda que tenhamos gente nadando de braçada para trás em todos os aspectos, não pegaria bem reforçar esta versão da Smurfette.  Então, sem romper com a estrutura problemática geral, a Smurfette do filme se rebela contra isso, quer escolher seu caminho, descobrir-se, desenha-se como uma líder em alguns momentos.  E ela encontra o que poderia ser o seu paraíso, afinal, a vila perdida é habitada somente por smurfs meninas. Sim, era óbvio desde o início, era o contraponto absolutamente esperado.  No entanto, e aí o fiapo de drama da história, Smurfette não é um smurf e Gargamel chega à vila perdida por causa das informações que ela lhe deu sem querer. 

Os respectivos líderes de cada vila.
Smurfette é uma traidora, uma estranha ao grupo, sempre foi, sempre será.  É isso que Gargamel lhe joga na cara.  A partir daí, Smurfette decide o filme sozinha, por assim dizer, e parte par ao enfrentamento do vilão usando de astúcia e coragem.  Afinal, e aí é a virada interessante, ainda que óbvia, desse filme ara o século XXI, ela pode ser o que ela quiser. Todas as mulheres podem, certo?  Bem, não sei se ficou claro para as criancinhas, maioria na sessão, esta mensagem feminista evidente.  Quem sabe quando Júlia tiver seis, sete anos.  Agora, ela reclamou muito de só termos uma menina entre tantos meninos. É a resposta feminista que eu espero e apoio na minha menina de 3 anos.

Para falar a verdade, Júlia estava mais empolgada com a ave de rapina desastrada de Gargamel e eu tentando mostrar para ela que a confusão toda se criou, porque Smurfette, Robusto, Gênio e Desastrado desobedeceram ao Papai Smurf.  Agora, é preciso ressaltar que os meninos foram instigados por Smurfette, que manipulou todos os machos.  Parece o reforço típico dos preconceitos contra as mulheres, ainda que tudo tenha terminado bem.  Já eu falei para a Júlia: "Está vendo filha?  Quando você desobedece, normalmente se mete em confusão!".  Sim, sim, conservadora a minha fala, mas educar é enquadrar, um ato de violência contínua e eu nunca negarei isso floreando com teorias. Eu assumo que estou tentando domar a boa selvagem e socializá-la, seguindo uma lógica bem durkheimiana.  

Lição moral: obedecer pai e mãe.
De resto, não dei uma risada sequer com o filme, senti-me mais desconfortável, como se estivesse revisitando os desenhos tolos dos anos 1980 com uma roupagem de computação gráfica.  Pets, O Poderoso Chefinho, Trolls, e mesmo Cegonhas estavam léguas de distância na forma como conduziram certas discussões e na criatividade de roteiro.  E isso somente para falar dos contemporâneos.  Se for buscar a série Toy Story... Só que o público alvo, entretanto, estava empolgado.  Se eles e elas gostaram, é o que basta, não é?  

Para mim, a parte legal da sessão inteira foi quando uma criança começou a gritar "beija ela".  Não vou contar o motivo, mas tem a ver com o sacrifício heróico de Smurfette.  Ninguém pensou nisso dentro do filme, apesar de todo o afeto que robusto tinha por Smurfette... Enfim, o filme cumpre a Bechdel Rule?  Siiiiim!!!!  Afinal, temos uma vila inteira de smurfs meninas, todas com nomes (*de flor*) e que conversam entre si e com a Smurfette.  Assunto principal?  Elas mesmas e a Smurfette.  Ah, sim, as smurfs meninas são estereotipadas, também, mas menos que os originais, pois parecem ter mais de uma faceta.  Claro que vimos pouco delas, posso estar equivocada.  De qualquer forma, há a cabeça de vento cheia de amor e acolhedora, a guerreira mal humorada e uma líder que parece olhar para o Papai Smurf com certo desdém.

O visual é o forte do filme.
Isso, no entanto, jamais me fará dizer que se trata de um filme feminista e, apesar de contar uma história arrumadinha, cheia de clichezinhos, não recomendo para maiores de 8, 9 anos.  Talvez, esteja superestimando as crianças e pessoas em geral de nossos dias, mas tenho certeza de que a concorrência tem oferecido coisa muito melhor e mais divertida.

1 pessoas comentaram:

Fiquei curioso: pq a TV belga não fez a adaptação da obra? Será que faltou $$$ ?
Sabe onde você pode achar a hq dos azuizinhos ? Em algumas livrarias especializadas em HQ;;;; e na biblioteca da Aliança Francesa.

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