Sexta-feira li o primeiro volume de Nigeru wa Haji da ga Yaku ni Tatsu (逃げるは恥だが役に立つ), premiado mangá de Umino Tsunami. Como tomei conhecimento da série meio que por causa do anúncio do dorama no ano passado, aproveitei para assistir os dois primeiros episódios da série de TV que tem como subtítulo “We married as a job”. No final, depois de falar do mangá, comento algo do dorama, porque há várias diferenças. Em inglês, a edição norte americana, a que li, tem como título The Full-Time Wife Escapist. Mas do que se trata o mangá?
Mikuri Moriyama tem 25 anos e é uma jovem com um currículo acadêmico invejável. Com graduação em psicologia e uma pós-graduação, ela tinha esperanças de conseguir trabalhar em sua área, no entanto, só consegue empregos temporários e que exigem baixa qualificação. No início do volume #1, ela está desempregada e sem perspectivas de se colocar no mercado de trabalho. Seu pai, no entanto, lhe arranja uma ocupação, ser diarista na casa de um antigo funcionário, um engenheiro solteiro de 36 anos. Mikuri aceita o emprego, que até lhe pagará bem, e conhece seu chefe, um sujeito frio e exigente. Ela, no entanto, se empenha ao máximo, afinal, é preciso fazer um bom trabalho sempre. Ela também imagina que é interessante fazer o que uma dona de casa faz e ainda receber por isso.
O chefe. |
Tempos depois, Mikuri fica sabendo que seu pai decidiu se mudar para o interior após a aposentadoria. Ela tem um mês para tentar resolver sua vida ou seguir com o pai e a mãe para uma vila na qual, definitivamente, não terá um emprego decente. Com o que ganha, ela não conseguirá se sustentar em Tokyo e não gostaria de ir morar com sua tia querida, a solteirona Yuri-chan. Quando esta comunicando sua situação ao chefe e ele lamenta sua situação, ela propõe que Tsuzaki a contrate como empregada doméstica residente. O rapaz diz que esse tipo de coisa não seria bem vista socialmente, afinal, ambos são solteiros, e que os pais dela jamais aceitariam. Mikuri, então, faz uma proposta louca: por que ele não se casa com ela, como se fosse um contrato de trabalho? E, bem, o rapaz termina aceitando.
Relacionamento distante e respeitoso. |
Isso dilui um pouco o absurdo que é uma moça altamente capacitada aceitar um trabalho como faxineira com o coração tão aberto. Ela quer trabalhar, ela não quer ser um peso para os pais e há um detalhe, ela gosta das prendas domésticas, mas como trabalho remunerado, não na função de esposa. Sem que a autora do mangá provavelmente conheça as discussões feministas sobre isso, que são antigas, vem pelo menos dos anos 1970, ela consegue ilustrar direitinho a idéia de que o trabalho das mulheres é apropriado pela família como dom e isso é uma forma intensa de exploração. Mikuri chega a colocar na ponta do lápis qual deveria ser o salário de uma esposa em tempo integral e fica surpresa, só que, bem, esposas não recebem pagamento nenhum, às vezes, nem um simples obrigado.
Yuri-chan é uma das melhores personagens do mangá. |
Falando do chefe, Tsuzaki, ele é extremamente correto como patrão, mas fechado, quase inexpressivo. Quando Mikuri se casa com ele, ela nunca o viu sem os óculos e imagina como será o seu rosto. Ele desenvolve confiança em Mikuri e se preocupa com ela, verdade, mas não há pistas ainda de qualquer sentimento que não seja respeito e admiração pelas suas competências, tanto como diarista, quanto psicóloga. Ao receber a proposta de casamento, ele pondera, analisa e apresenta uma contraproposta. Não sabia, mas no Japão há algo como uma união estável. Duas pessoas coabitam, dão entrada em uma papelada relacionada a um único domicílio, tem direito á seguro saúde, alguns benefícios e ao desconto em certas taxas.
A arte é somente "OK". |
Mikuri não se sente nem um pouco insegura morando com um homem 11 anos mais velho que ela. A versão em inglês diz que ele não tem o mínimo sexy appeal, me pergunto se ela não usou o termo herbívoro em japonês, algo que se aplica aos homens que não têm interesse por mulheres. Tsuzaki, obviamente, não é um herbívoro, mas um sujeito muito tímido, travado, como muitos homens japoneses de sua geração. Há pesquisas sobre isso. De qualquer forma, um certo nervosismo e curiosidade brotam na moça – algo leve, que fique claro – quando ela descobre pelos pais do moço que ele nunca teve uma namorada e, bem, ela conclui que ele é virgem.
A entrevista imaginária do início do mangá. |
Falando nesse episódio, eles se casam perto do Natal e há toda aquela explicação de que esta festa, no Japão, é uma espécie de Dia dos Namorados. Daí, Yuri, a tia, decide fazer uma viagem para um país que não tenha Natal. Escolhe o Marrocos para descobrir que mesmo alguns países islâmicos já foram contaminados. No dorama, essa história de viagem para o Marrocos foi transferida para o começo, antes de Tsuzaki e Mikuri se conhecerem. No mangá, eles passam o Natal juntos e é visível o prazer do moço em ter uma companhia e apoiar as experiências culinárias de sua empregada.
Família. |
O outro colega é Ryota Kazami, que parece bater idade com Mikuri. Ele é bonitão, independente e sua primeira cena é despachando a namorada de longa data. Ela quer casar, ele, não. O moço fala, para o horror de Yuri-chan, que está em uma mesa próxima, que não quer comprar, aquilo que pode ter de graça. Kazami vai até a casa de Mikuri e Tsuzaki junto com Numato e fica fascinado pela moça que praticamente faz um atendimento psicológico gratuito, pois há uma forte chuva, os trens param e todos tem que dormir por lá. Com as dúvidas plantadas por Mikuri, é possível que Kazami decida disputá-la com Tsuzaki, afinal, ela parece ser especial.
A primeira aparição de Kazami é muito antipática. |
Falando da arte de Nigeru wa Haji da ga Yaku ni Tatsu, ela é bem fraquinha, simples mesmo. Com o tempo, a gente se acostuma, afinal, a história se impõe, mas você não vai ser fisgada port ela. engraçado é que há um longo free talk da autora no final do volume. São agradecimentos e explicações. E ela diz que seu último mangá foi cancelado e que espera que o mesmo não aconteça com o novo. Nigeru wa Haji da ga Yaku ni Tatsu estreou em novembro de 2012 na revista Kiss e conta com 9 volumes até o momento. A série foi vencedora na categoria shoujo do 39º Kodansha Manga Awards.
Um casal de verdade? |
São inseridas, também, várias cenas engraçadas com a família de Mikuri. Os pais dela parecem ser muito mais expressivos, ainda que mais conservadores. E não são lá muito preocupados com o que vai ser da vida dela. Já Yuri-chan, a tia, vira irmã mais nova da mãe de Mikuri e lhe colocam com 49 anos. Ela aparece menos e suas cenas são mais cômicas e exageradas. Ela, por exemplo, quase enforca Tsuzaki quando ele vem pedir a mão de Mikuri. Há toda uma confusão sobre casar tão rápido... Estaria ela grávida? A cena não existe no mangá.
E veio o dorama. |
Se Yuri-chan até agora me pareceu muito mais um alívio cômico do que a mulher realmente interessante e atormentada do mangá, outras personagens foram criadas para abrir espaço para discussões sobre a desigualdade de gênero na sociedade japonesa. Uma amiga de Mikuri, que eu não sei se vai voltar, fala do fracasso de seu casamento e lamenta as decisões tomadas. Agora, tem uma filha, que ela ama, sabe que um divórcio significará ter que voltar para casa humilhada, que o pai da criança iria fugir de pagar qualquer pensão, e que, bem, ela perdeu três anos de sua carreira, exatamente em um momento fundamental para seu progresso. Ser mãe solteira no Japão é para as fortes, ambas concluem.
o elenco. |
Indo para os homens, Tsuzaki se afirma como um solteiro assumido. Tudo bobagem, claro, é simplesmente um homem muito tímido, focado no trabalho, e que nunca teve (*ao que parece*) oportunidade para estabelecer um relacionamento sério. Já Kazami tem a sua cena pavorosamente machista com a namorada no dorama, mas é envelhecido. O ator é mais velho que aquele que interpreta Tsuzaki e parece mais velho. Kazami parece o solteirão bon vivant que leva a vida e o trabalho sem se estressar. Também, no dorama, ele se sente fascinado por Mikuri, mas falta-lhe a juventude do mangá, um contraponto muito mais interessante com Tsuzaki do que aquele desenhado no dorama.
O pedido de casamento, invenção do dorama. |
De resto, há uma série de cenas sobre a loucura do mundo do trabalho envolvendo os homens. Lembrando que há toda uma discussão atual sobre o excesso de horas de trabalho e o dano causado às pessoas depois de um ruidoso caso de suicídio, mas o dorama foi lançado um pouco antes. Essa discussão não está no mangá e a doença de Tsuzaki vem por causa da estafa causada pelo excesso de trabalho para cumprir um prazo absurdo. A doença, no dorama, é anterior ao comunicado de Mikuri sobre a mudança dos pais, no mangá, ela é bem mais no início da relação dos dois.
Cada episódio, uma dancinha. |
P.S.: Kazami é um ikemen do mal. Detesto ele. :P
1 pessoas comentaram:
Mais um pra lista! :)
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