sábado, 31 de dezembro de 2016

Comentando os volumes 1, 2 e 3 de Ore Monogatari!


Fazia tempo que estava devendo uma resenha dos volumes brasileiros de Ore Monogatari!! (俺物語!!), elogiadíssima série de Kazune Kawahara (roteirista) e Aruko (desenhista).  O mangá que foi publicado pela Betsuma fez tanto sucesso que terminou adaptado para animação e o cinema, ampliando ainda mais a sua base de fãs.  Muita gente recebeu Ore Monogatari!!, que tem “Minha História” como título nacional, com grande empolgação por ser um shoujo “diferente”.  Isso é e não é verdade, o que em nada impacta o fato da história de Takeo Gouda ser muito, muito interessante e engraçada. 

A história de Ore Monogatari!! tem como protagonista Takeo Gouda, um adolescente peculiar, porque tem 15 nos, dois metros e 120 quilos.  Musculoso, com um rosto ameaçador, ele tem um coração gentil e é incapaz de negar ajuda a qualquer pessoa.  Expansivo, ele tem muitos amigos e admiradores, mas pode despertar medo e desconfiança em desconhecidos.  Takeo tem um melhor amigo Makoto Sunakawa, um rapaz silencioso e sério, quase o oposto de Takeo.  Suna, como ele é chamado, acaba sendo o oposto de Takeo e durante os vários anos de amizade, todas as garotas por quem o protagonista se interessou sempre preferiram Suna.  O rapaz, no entanto, nunca se interessou por menina alguma e dispensava sem dó nem piedade todas as garotas que se declaravam para ele.  Até Yamato entrar na vida de Takeo...


Rinko Yamato é uma menina que Takeo e Suna conhecem por acaso no trem.  Um tarado a estava assediando e Takeo intervém.  A menina fica grata e se apaixona por Takeo, mas ele crê que o alvo dos afetos da menina seja seu amigo, Suna.  Por conta disso, Takeo faz o possível para juntar os dois, sem sequer perceber que todos os mimos, presentes e atenções da moça são para ele.  Pior ainda, Suna elogia Yamato para o amigo, o que reforça nele a certeza de que precisa unir o casal de apaixonados.  Só mesmo quando Suna decide agir, é que as coisas se desenrolam e Takeo percebe que, pela primeira vez, a menina está interessada nele e, não, em seu perfeito amigo.

Se você pegar o primeiro volume de Ore Monogatari!! irá perceber que há uma história completa e fechada até a página 105 (*edição da Panini*).  As personagens são apresentadas e muito bem delineadas, conhecemos o trio principal, Takeo, Yamato e Suna, e, ao término dessa pequena história autoconclusiva, temos um final feliz provisório, pois nosso herói começa a namorar com a ajuda do amigo discreto. As autoras poderiam parar aí.  Pergunto-me mesmo se não foi uma espécie de teste.  Se funcionasse, e a roteirista já tinha uma série em andamento (Aozora Yell), Ore Monogatari!! seguiria adiante.  Será que foi assim?  E é uma historinha gostosa de se ler, as personagens são simpáticas e, bem, dá vontade de continuar lendo.  


O volume #1 continua introduzindo a irmã mais velha de Suna, Ai, e sugerindo que teríamos um confronto entre ela e Yamato por Takeo.  Lembro quando a personagem apareceu nas cenas do próximo episódio do anime e algumas pessoas comentaram, “Ah, lá vem clichê!”.  Só que as autoras mais uma vez surpreendem e fazem com que a personagem seja tomada por simpatia por Yamato, dissolvendo qualquer sombra de competição.  Através da irmã de Suna discutem-se, também, bullyng e padrões de beleza.  

Takeo é o anti-galã de shoujo, grandão e aparentemente truculento, mas assim como o protagonista de Otomen, ele tem um coração terno.  Ela se apaixona por ela, porque, quando pequeno Takeo viu beleza nela, enquanto todos os outros debochavam por ela ser alta demais.  A irmã de Suna simplesmente não se declarou por ser mais velha e por acreditar que nenhuma mulher iria amar Takeo.  Yamato é uma surpresa, portanto.  Aliás, pelo menos até o momento, Yamato com seu excesso de açúcar deveria parecer intragável, mas ela é tão simpática que é difícil não gostar dela.


Ao tentar descobrir um ponto fraco em Yamato, Ai termina ajudando a moça.  Yamato tinha um segredo.  Ela dizia para si mesma que não era tão “pura” quanto Takeo imaginava... Um, o que seria isso?  Havia quem temesse que fosse algo do tipo ela se sente suja por não ser mais virgem.  Nada disso, abrindo uma discreta discussão de gênero, o que temos é uma moça que deseja demais o namorado e queria mais contato físico com ele.  Não houve beijo até o terceiro volume, mas não foi por culpa de Yamato, ou por uma mãozinha de Suna.  Na verdade, ambos – Takeo e Yamato – sentem desejo um pelo outro, mas os dois são por demais inoc

entes e não conseguem destravar a relação em certos aspectos.  O inovador e subversivo está, no entanto, no fato de Yamato, a menina, ser muito mais consciente e explicita em relação ao seu desejo.  O que a irmã de Suna lhe aconselha é a não sentir culpa e ser mais clara com Takeo.  O fato é que Takeo é mais inocente que Yamato em seus desejos, assim como a moça é mais ciumenta, ainda que contida e compreensiva.  Ela ama Takeo do jeito que ele é e exatamente por isso Yamato intervém quando o rapaz  decide não ajudar mais outras moças para que ela não se ofenda.  Ora, o Takeo que ela adora é exatamente o sujeito capaz de ajudar todo mundo, mesmo a custa de algum dano pessoal.   

É interessante como as autoras trabalham com clichês, negociando com eles e subvertendo-os.  A relação de Yamato e Takeo é marcada pela comicidade, a começar pela desproporção entre eles.  Takeo parece um monstro, ou a fera da Bela e a Fera”, ou de uma personagem que poderia estar no mais violento e cômico dos shounen mangá, no entanto, ele é o protagonista de um dos shoujo mangá mais elogiados e premiados dos últimos anos.  Afinal, conseguiu ficar com o primeiro lugar no guia Kono Manga ga Sugoi! de 2013.  Normalmente, no topo da lista só há josei, mas a série é tão divertida e inteligente no seu humor e na forma como trabalha os clichês que é quase impossível ignorá-la.

A arte de Aruko não é nada brilhante, é meio rascunhada até, Kawahara desenha melhor, mas ela consegue dar conta do recado e criou personagens bonitas, elegantes e, também, engraçadas.  A família de Takeo com sua mãe ex-lutadora de luta livre e seu pai galã grandalhão é uma perfeição.  O pai de Takeo (*imagem aí embaixo*) sempre parece estar brilhando, com um sorriso impecável.  A mãe é só vitalidade, limpando e fazendo toda sorte de trabalhos pesados, mesmo grávida... Será que o bebê nasce antes do fim da série? Acho que, sim, afinal, são treze volumes.


Os volumes #2 e #3 são marcados por capítulos simpáticos, eu diria que Ore Monogatari!! é uma série para desanuviar, se sentir leve, rir, e outros com algum drama, mas sem exageros.  Temos o mistério de Suna, por exemplo, que permite testar a amizade de Takeo e, agora, de Yamato por ele.  Suna é o melhor amigo que alguém pode desejar, apesar de passar aquela imagem de garoto inacessível, frio e inteligente.  Ele é um perfeito príncipe, mas o mangá não é sobre um príncipe e, sim, sobre um ogro.  

Agora, o que pode acontecer, já que o romance de Yamato e Takeo já está resolvido no volume #1, é a série cair na apatia e as situações começarem a se repetir.  Nos primeiros volumes, isso não é possível, afinal, Takeo vai conhecer as amigas de Yamato, que o rejeitam, no início, há a interação entre as meninas e os amigos do protagonista, os desafios esportivos, a tentativa de Takeo de se equiparar à Yamato nos estudos para que possam ir juntos para a universidade... Será que ao longo da série as personagens irão amadurecer no processo? Será que Suna irá ganhar uma namorada? Quando sai o beijo entre Takeo e Yamato?  Haverá mais que isso?  


Enfim, há muito o que falar, mas não é nada que exija tantos volumes.  Tudo dependerá do talento das autoras.  Eu sei que adorei o último capítulo do volume #3, com Takeo estudando para entrar na universidade que Yamato deseja e Suna dizendo que aquela escola não era para ele, que estava além de suas possibilidades.  Takeo, no entanto, não se dá por vencido e a piada, no final é fantástica.  Não darei spoiler, mas há, também um gancho.  O olhar triste de Suna significaria alguma coisa?

Ore Monogatari!! é um mangá inovador até certo ponto, mas nào é revolucionário, ele somente se diverte em surpreender os leitores subvertendo a ordem “natural” da maioria dos romances escolares shoujo.   Ele não é um mangá feminista, na medida que ele não questiona papéis de gênero, no entanto, ele não reforça representações negativas sobre as mulheres, o caso da irmã de Suna é exemplar neste aspecto.  No fim das contas, a gente até reflete um pouquinho, mas, de novo, trata-se de um mangá para você ler e se sentir bem, rir um pouquinho e amar as personagens.


Já encerrando, além da indicação no Kono Manga ga Sugoi! 2013, a série ganhou o 37º Kodansha Manga Awards e o 61º Shogakukan Manga Awards, ambos na categoria shoujo.  Além disso, a série foi indicada ao 6º Manga Taishō Award e ao 18º Annual Tezuka Osamu Cultural Prize.  Em 2015, Ore Monogatari!! teve anime para a TV com 24 episódios e um filme live action para o cinema.  A série de mangá foi publicada pela Betsuma entre 2011 e 2016, com ótimas vendagens.  

Agora, estou esperando o volume #4, espero poder comprar e ler ainda durante as minhas férias.  Deveria ter lido esses três volumes faz tempo, mas o trabalho sempre me faz protelar.  Certamente, não diria que foi o melhor shoujo que li publicado no Brasil este ano, porque há Orange e esta série está em outro nível de discussão, mas, certamente, Ore Monogatari!! foi muito divertida de se ler.  Takeo é um fofo, Suna é um cara legal e Yamato é um doce. Adoro os três.  Ah, sim!  O volume #3 brasileiro veio com um capítulo especial crossover de Ore Monogatari!! e Ao Haru Ride ( アオハライド).  Ficou engraçadinho.

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