sábado, 23 de janeiro de 2016

A Academia reconhece que os Oscars estão muito brancos mesmo. Quem diria?


Foi difícil terminar este texto.  Muitas interrupções e coisas para fazer, enfim, mas saiu, afinal, vocês estão lendo.  Quado comecei, tinha em mente comentar duas notícias, a primeira é o reconhecimento da Academia de Cinema de que a falta de representatividade das (*ditas*) minorias entre os votantes dos Oscars tem impacto na lista final da premiação e, a outra, é da história que está circulando furiosamente de que os fabricantes de brinquedos receberam a ordem de excluir Rey dos brinquedos da Star Wars, “porque nenhum menino quer brincar com uma personagem feminina”.  Vou ficar só no Oscar hoje, mas tentarei falar da Rey amanhã.  

Vamos aos Oscars primeiro, então.  Começo dizendo que não considero o Oscar uma premiação realmente séria, trata-se de uma celebração da indústria americana, um show feito por eles e para eles do qual nós, os outros, somos convidados a participar, afinal, o cinema americano é um produto feito para exportação, ao contrário de outros cinemas produzidos em vários países.  Por isso mesmo, só de um diretor, atriz, ator estrangeiro ser indicado a um dos grandes prêmios significa muito, muito mesmo, afinal, se você está lá é porque, de alguma forma, a despeito da língua, apesar de toda a grandiosidade da indústria local, você foi notado/a.  Agora, se alguém for pautar o sucesso de um produto nosso por indicação ao Oscar... Ai!  Vale mais um prêmio em Berlim, Veneza ou no Sundance.  

Esta é só a minha opinião, claro, mas acredito que ninguém de bom senso creia que Gwyneth Paltrow é melhor atriz que Fernanda Montenegro, ou que Jennifer Lawrence teve um desempenho melhor do que o de Emmanuelle Riva em Amor.  Aliás, falando em Jennifer Lawrence, um comentário do blog da Lola me fez refletir um pouco sobre ela e eu fiquei bem incomodada.  O excesso de indicações para alguém tão jovem e repetidamente é indício de que ela caiu no gosto da indústria, ela está na moda, por assim dizer.  No entanto, fico imaginando se é saudável ter tantas indicações e de forma tão seguida.  Isso pode afetar a cabeça de uma pessoa e espero que ela tenha equilíbrio para conduzir a sua carreira. 

Outro ponto que gostaria de comentar é que me incomoda muito que Lawrence venha sendo escalada e indicada por interpretar papéis que exigiriam atrizes mais velhas.  Mal ou bem, ela está tomando o lugar de mulheres que deveriam ter pelo menos dez anos a mais que ela, sabendo como é difícil para uma atriz passada dos trinta conseguir bons papéis, acho lamentável que ela não tenha declinado seus papéis em Trapaça e Joy.  Mas deixa para lá, talvez fale especificamente dela no futuro.

De qualquer forma, ao longo de décadas, já vimos filmes medíocres premiados.  Aliás, é muito comum premiar filmes ou papéis inferiores de grandes diretores(*porque mulher diretora, só uma ganhou...*), atores, atrizes para compensar gafes anteriores, ou então dar aqueles prêmios especiais para calar a boca dos críticos.  É raro quando alguma coisa dá errado e algo como Roberto Benigni ganhando o Oscar acontece... Raro, muito raro... E vale o ingresso e a pipoca, claro. 

Atores, atrizes, diretores e diretoras são esnobados o tempo inteiro.  Grandes filmes esquecidos... Aliás, eu vivo comentando do ano em que todos os jornais alardeavam que ou um negro (Spike Lee), ou uma mulher (Barbra Streisand), seriam indicados a melhor diretor e, bem, nenhum dos dois foi indicado.  A diferença, hoje, e isso é muito, muito bom, é que é impossível ignorar o escândalo da internet, especialmente das redes sociais, o Twitter (*Salve! Salve!*) tem infernizado muita gente.  Confesso que me incomodou muito mais a exclusão de Sufragistas – que tinha além de um magnífico elenco feminino, uma diretora e uma roteirista – do que o repeteco do #OscarsSoWhite, mas gostei muito do resultado até o momento.

Enfim, dois dias atrás a Lola escreveu sobre isso e não teria muito a acrescentar.   Aliás, concordo com ela quando escreveu que ano passado – com Selma, seu elenco e Ava DuVernay, a diretora, esnobados – eu me senti muito mais ofendida.  A exclusão foi inegável e escandalosa.  Este ano, mais uma vez, nenhum ator ou atriz negro, fora outras categorias, foi indicado. Não somente isso, se não considerarmos os atores de ascendência italiana como latinos, é o Oscar mais branco em muito, muito tempo.  Ora, eu concordo com Viola Davis, quando ela colocou que bons desempenhos de atores e atrizes negros – assim como de mulheres maduras ou jovens, de orientais, whatever – dependem de oportunidades. Se não há papéis, não como mostrar o seu bom trabalho.  

E mesmo quando os papéis não foram escritos para brancos, bem, podemos dar um jeitinho.  Vide o caso de Katniss, ou a surpresa quando J. K. Rowling disse que nunca tinha comentado que Hermione era branca... Oooops!  Como assim?  Ela tinha que ser branca, não é mesmo?  Ainda assim, de vinte indicações todos serem brancos por DOIS ANOS SEGUIDOS! Aí, resta pegar os votantes. Quem escolhe mesmo quem vai aparecer na noite dos Oscars?????   94% dos que votam são brancos e 77% são homens (*e há o fator idade, também... a maioria seria considerada idosa*), assim, é possível que eles e elas nem percebam que estão sendo [*Fale baixinho*] racistas.  É só uma questão de mérito.  Daí, dá vergonha alheia ler que a atriz Charlote Rampling, indicada a melhor atriz, tenha dito que racistas são os que reclamam... Estão discriminando os brancos por, bem, em um país plural como os Estados Unidos, que tem um presidente negro e coisa e tal, o maior prêmio do cinema ignorar quem não é branco.  Palmas para ela. SQN

O bom dessa brincadeira toda é que, assim como no caso de Angoulême, a Academia teve que recuar.  Presidida por uma mulher negra – o que diz muito pouco sobre quem tem poder de voto, como observado acima – a Academia anunciou que irá ampliar a diversidade dos votantes incluindo as (*ditas*) minorias:  mulheres, negros, asiáticos, etc.  Afinal, os Estados Unidos não é um país branco, nunca foi, e o cinema que eles fazem quer se vender como mundial.  A gente sabe que a coisa vai demorar para andar, que aumentar a diversidade pode não significar mudanças na forma como as pessoas pensam, afinal, estão todos imersos em uma mesma cultura, MAS é um sinal de esperança.

De resto, estou muito furiosa com esse Oscar por conta de Sufragistas, eu repito, afinal, era uma história sobre mulheres, contada por mulheres.   Aquele papo besta de “esse Oscar vai ser o mais feminista da história” morreu para mim.  Fora isso, queria muito ver os atores, atrizes, diretores e diretoras negros boicotando a festa, afinal, admitir que são discriminatórios, que fecham os olhos para bons produtos que não são feitos ou protagonizados por brancos, não significa que o desaforo desapareceu.  

8 pessoas comentaram:

independente da questão racial.. o Oscar por si só é uma farsa. Existem n filmes bons no mundo todo... mas os jurados jamais assistiram a 100% deles.
tem muito conchavo na academia.

Por esse seu critério, Stefano, nenhum prêmio seria sério, afinal, ninguém é capaz de assistir todos os filmes produzidos no mundo inteiro. Há muitos. Os Oscars se aplicam à indústria norte americana, com alguns prêmios exceção. De resto, é deles para eles mesmos, ainda assim, quem faz mais propaganda e tem mais lobby sempre sai na frente, ainda que nào chegue na frente.

mas se lembre do Oscar pro melhor filme estrangeiro.
Outro festival bastante criticado é do Cannes. Um cineasta desistiu de concorrer lá, pois o acusou o festival de tendencioso.

Stefano, eu escrevi "alguns prêmios exceção", filme estrangeiro, animação, documentário, etc. Vc entende, certo? Os jurados, aliás, assistem uma pré-seleção, se muito. De resto, assistir tudo é impossível em qualquer país, em qualquer lugar, acho que até em um Sudão ou Afeganistão.

Minha maior tristeza a esse respeito é ver preciosidades do Studio Ghibli serem sempre ignoradas em eventos como Oscar ):

Não só do Studio Ghibli... mas vários animes legais em geral são ignorados pela "Academia".

Pronto já podem se aplaudir por fazer a coisa certa, colocar nada na prática e mudar pro próximo tópico de DISCUSSÃO

Engraçado é que essas notícias do Oscar apareceram logo depois de um período em que eu estava vendo um pouco de TV e me incomodei o quanto as novelas andam brancas também. Sempre foram, claro, mas depois de tanta conversa sobre diversidade, racismo e representação, eu achei que as emissoras teriam começado a mudar pelo menos um pouquinho. Mas pelo visto, temos muito chão pra percorrer ainda.

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