sábado, 24 de outubro de 2015

Comentando Colina Escarlate (Crimson Peak, 2015)


Quarta-feira fui ao cinema assistir Colina Escarlate.  Filme de época, gótico e com Tom Hiddlestone?  A gente precisa ver.  Foi o que eu pensei de imediato.  OK, o primeiro desafio foi achar uma sessão legendada.  Segundo desafio, um que batesse com o horário da Júlia na creche.  Por conta disso, tive que ir para longe de casa, aqui em Brasília, era Pier 21 (Lago Sul) ou Iguatemi (Lago Norte).  Fomos para o primeiro.  Meu marido já foi resmungando que, nos últimos tempos, eu só o levava para filmes fracos ou chatos... Bem, bem, não achei “Que Horas ela Volta?” chato ou ruim, mas Colina Escarlate me decepcionou muito.  Vamos ao resumo.

Estados Unidos, final do século XIX.  Desde menina, Edith Cushing (Mia Wasikowska)  sabe que existem fantasmas.  Ela viu  mãe morta quando criança.  O fantasma parecia querer lhe mandar uma mensagem “Afaste-se da Colina Escarlate!”.  Quatorze anos depois, em 1901, Edith é uma mulher adulta, filha de um rico empreiteiro, e aspirante a escritora.  Rejeitada por ser mulher e, também, por não escrever sobre temas femininos, ainda assim, ela não desiste.  Um belo dia, o baronete inglês Sir Thomas Sharpe (Tom Hiddleston) aparece no escritório de seu pai, ele parece fascinante e Edith não consegue disfarçar o interesse.  Já o pai de Edith (Jim Beaver) não consegue gostar do nobre e não aceita sua proposta de associação em uma máquina mineradora.



Sir Thomas começa a fazer a corte à Edith e ela corresponde para preocupação de seu pai e do eterno amigo apaixonado Dr. Alan McMichael (Charlie Hunnam).  O pai de Edith, desconfiado de Sharpe desde o primeiro encontro, contrata um detetive, Mr. Holly (Burn Gorman) e descobre coisas terríveis sobre Sharpe e sua irmã, Lady Lucille (Jessica Chastain) intimando-os a deixar os Estados Unidos em troca de um polpudo suborno.  Outra exigência é que Sharpe magoe Edith a tal ponto que ela desista dele.  Assim o rapaz procede e Edith recebe outara visita do fantasma da mãe com a mesma advertência “Afaste-se da Colina Escarlate!”.   Ele erra, no entanto, ao avisar a dupla que não comentou as informações com mais ninguém.

No outro dia, o pai de Edith é assassinado.  Antes de descobrir a tragédia, Edith lê uma carta de Sharpe contando parte da conversa com seu pai e se reconcilia com ele.  Órfã, rica e apaixonada, Edith se casa com Sharpe e se muda para  Inglaterra. Chegando lá, descobre que a mansão de seu marido está em ruínas e que o local se chama “Colina Escarlate” por causa da argila vermelha da região.  Edith passa a ser então atormentada por fantasmas, ouve barulhos estranhos e desconfia de Lucille.  Sharpe parece obcecado com sua máquina e, agora, tem dinheiro para terminá-la.  Ainda assim, ele se mostra apaixonado pela esposa, mas não consuma o casamento com ela.  Nos EUA, o Dr. McMichael, leitor de Conan Doyle, isto é, Sherlock Holmes, começa a somar 2 + 2 e se preocupar com Edith.



A moça parece adoecer na atmosfera opressiva da casa e é privada por Lucille de qualquer assunto da administração.  Os fantasmas a atormentam e Sharpe decide levá-la para um passeio.  Na cidade, longe da casa e de Lucille o casamento é consumado, mas uma carta da Itália para Lady Sharpe faz com que Edith decida investigar a fundo os mistérios da Colina Escarlate.  Isso e o casamento consumado fazem com que Lucille mostre quem ela realmente é e a tragédia parece ser o destino da protagonista.

Resumi em linhas gerais um filme que falha totalmente em seu objetivo, isto é, contar uma história de suspense e horror gótico.  Digo isso, porque desde o início sabemos o que vai acontecer, quem vai morrer, que os Sharpe não são confiáveis e que Edith vai cair como uma patinha.  Aliás, a protagonista é aquele tipo de personagem vendida como feminista, moderna e independente.  A forma de vestir, sua vontade de ser bem sucedida em um mundo de homens, seu desprezo por “coisas de mulher”, tudo aponta para isso.  Querem dois exemplos?  A mãe do Dr. McMichael sugere, com desdém, que a moça quer ser a nova Jane Austen e ficar solteirona, a mocinha faz cara de tédio e diz que prefere ser a nova Mary Shelley e que ela morreu viúva.



Jane Austen foi muito bem sucedida tratando de temas vistos como femininos, romance, vida privada, família etc., Mary Shelley, além de declaradamente feminista, ela escreveu um manifesto sobre os direitos das mulheres, se aventurou em temáticas pouco femininas, Frankenstein é de sua autoria.  Edith quer escrever sobre fantasmas, não sobre romance, no entanto, basta a personagem de Tom Hiddlestone piscar os olhinhos que ela cai feito patinha.  Sua habilidade aguda de observação funciona com Sharpe somente para perceber que ele é um falido, nada mais. E a audiência sabe que será assim, porque o roteiro é tão óbvio que nada pode obstruir ou trazer tempero para um esquema pré-fabricado.  Sim, lamento peos fãs de Guilhermo Del Toro, mas este não é outro Labirinto do Fauno.

No fim das contas, toda a modernidade e autonomia de Edith se desmontam rapidamente e ela se torna a dócil mocinha, a menininha do papai, que vai direto para a boca do lobo.   Ao ver a casa desmoronada, qualquer pessoa minimamente sensata iria se recusar a entrar.  Só que ela ama Sharpe, é isso que a história quer que pensemos.  Ama tanto que aceita viver em uma casa que está caindo aos pedaços e afundando na argila vermelha.  Aceita morar lá mesmo sem nenhum criado ou criada, coisa que inviabilizaria os mínimos cuidados de uma casa tão grande, e com uma cunhada esquisitíssima e fantasmas sanguinolentos.




Aliás, o fantasma da mãe de Edith lhe aparece duas vezes na América.  Meu marido e eu debatemos e chegamos à conclusão que, para o filme, fantasmas estavam ligados ao lugar de seu martírio ou afetos, enfim, coisa bem óbvia e recorrente.  Só que o pai da moça não dá as caras para lhe dizer nada antes dela ir para a Colina Vermelha.  Ô fantasminha sacana esse, não?  Na verdade, só mais um sintoma do quanto o roteiro é capenga.

Até imaginei quando vi Sharpe com roupas defasadas em vinte anos e sua irmã bandeirosa e fria que eles poderiam ser vampiros.  Vampiros é coisa que me agrada, que faz com que meu senso crítico se abrande um tiquinho, mas não era o caso, eles eram bem humanos.  Eu estou me coçando para despejar todos os spoilers aqui no texto, enfim, oreciso falar pelo menos um, algo que me deixou encucada: como os dois conseguiram falir?  Deram três golpes do baú, roubaram a fortuna de três mulheres vulneráveis.  O que fizeram com o dinheiro?  Enterraram tudo na máquina dos sonhos de Sharpe que nem parecia ser uma coisa grandiosa????  Que incompetência financeira é essa?



Um dos fantasmas das ex-esposas, aliás, aparece para avisar Edith, mostra-lhe inclusive o bebê que teve com Sharpe...  É importante dizer que os fantasmas são horríveis, destroçados.  Muito dinheiro foi investido em efeitos especiais e reconstituição de 'época, isto é, locações e figurinos.  Esta é a parte ótima do filme.  Agora, o filme é sanguinolento e se utiliza disso para tentar encobrir suas falhas de roteiro.  Simples assim.  Há muito sangue e analogia com ele, crânios estourados, cadáveres descarnados, isso, aliás, fez com que a censura fosse alta nos EUA.  Agora, não há nenhuma nudez de Mia Wasikowska, ela sempre está vestida, aliás, muito bem vestida, apesar da camisola repetitiva.

Já Hiddlestone tem seu momento de fanservice.  Um só, aliás.  Se você acredita que a bundinha do moço vale o ingresso, é sua chance, mas ele já fez coisa muito melhor no cinema e já mostrou o corpo outras vezes.  A cena de amor entre ele e Wasikowska é bonita.  Toma os gifs para vocês:




A irmã de Sharpe, a sombria Lucille é a grande força do mal, sim, porque o filme, com todas as limitações que ele tem, é um veículo de promoção de Tom Hiddlestone – como seria de Benedict Cumberbatch, caso ele tivesse permanecido no papel – e como peça óbvia que é teria que o redimi-lo de alguma forma.  Todos já devem saber como: ele se apaixona por Edith e vai tentar salvá-la. Consumado o casamento com ela, e Lucille quer apressar a morte da moça, mas os papéis não foram assinados ainda, eles não têm todo o dinheiro da moça.  Edith sabe que será a próxima, já descobriu tudo o que aconteceu e Sharpe lhe avisa para ter cuidado com a irmã.  Sim, o moço lá no fundo tem bom coração, a malvada, maquiavélica, enlouquecida é uma mulher.  OK, chega a hora do herói aparecer...

Do outro lado do Atlântico, McMichael usa suas leituras de Sherlock Holmes para impulsioná-lo a ir atrás de Edith.  Ele consegue descobrir tudinho a respeito dos Sharpe, afinal, basta falar com o detetive e pagar o seu preço.  E lá vai o moço salvar Edith...O filme segue para um clímax que, como todo o filme, é cheio de situações sanguinolentas e exageradas.  A casa está isolada por uma nevasca e o Dr. McMichael anda 4 horas sob o clima inclemente para confrontar os Sharpe.  Leitor de Holmes, como faz questão de propagandear, deveria saber que o detetive nunca ia sozinho e desarmado para um encontro com vilões perigosos.



A coisa, claro, não se encaminha bem para ela, mas Edith precisa sobreviver, o filme abre com ela mesma, nos escombros da casa, falando que acredita em fantasmas... Para se ter uma idéia dos malabarismos, Edith tem sua perna quebrada e consegue, ainda assim, fazer uma série de coisas para somente lá pelas tantas lembrar que, bem, sua perna não lhe permitiria grandes movimentos... Lucille, ao contrário, é de uma força e resistência sobre humanas, como se vampira fosse de verdade.  São muitas situações absurdas e muito sangue esguichando ao estilo Cavaleiros do Zodíaco, enfim, o final é a cereja do bolo de um filme que, com esforço, vale 3 estrelinhas pelo figurino, reconstituição de época, cenários e efeitos especiais.  E, sim, a cena do baile é linda, linda... Mas morre aí.

Para fechar, o filme cumpre a Bechdel Rule?  Sim, cumpre, mas só reforça os papéis de gênero mais rasteirinhos, mocinha tola, mesmo que se salve sozinha, por assim dizer; vilã terrível que faz gato e sapato dos pobres homens, inclusive seu irmão que de parceiro nos crimes se torna quase vítima, mãe e filha americanas ricas que querem um casamento na nobreza britânica, criadas sem nome (duas delas negras) e outras com nome.  Nada que torne o filme notável, mas o elenco feminino com falas e nomes é mais extenso que o da maioria dos filmes.



Depois de ver o filme, fiquei até aliviada quando soube que o papel principal era do Benedict Cumberbatch e ele acabou pulando fora.  Deve ter percebido a canoa furada que era o filme.  Na falta do Benny, o Tom.  O filme não enriquece em nada o seu currículo, mas não deve manchá-lo, também.  É isso.  Vou tão pouco ao cinema, agora, que um Colina Escarlate termina me deixando deprimida... 


2 pessoas comentaram:

O Del Toro não anda lá com um currículo muito bom ultimamente. Todos os seus últimos filmes tem mais erros que acertos, e não tem dado o retorno que os estúdios procuram.
Acho que quando ele tinha menos orçamento, acabava compensando na criatividade.
Uma pena.

Também não superou minhas ansiosas e altas expectativas sobre querer ver o filme. Fiquei querendo saber se a mãe dela era vidente afinal como ela sabia da colina escarlate antes de todo mundo? E outra e o bebê de enola? O que houve? A máquina de Thomas pra que servia de verdade e porque tanta ganância no dinheiro das esposas para essa máquina? Coisa mais doida!!! Não gostei mesmo.

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