Minha experiência como professora em um colégio de elite (*pois a entrada não é franqueada a todos*) e convivendo com adolescentes e jovens na internet tem me mostrado outro quadro. Os jovens e adolescentes lêem, sim, e muito. Às vezes, para poderem ter acesso ao último livro da saga que estão acompanhando, fazem isso com o dicionário na mão, tateando aqui e ali. O problema, talvez, é que muitos adultos – daqueles que lêem muito, ou nem tanto – desvalorizam o material que os jovens estão lendo. Fantasia? Romance? “Young Adults”? Quadrinhos? Lixo! Nós adultos subestimamos muito os adolescentes e jovens, muito mesmo!
Eu gosto sempre de dizer aos meus meninos e meninas no início do ano que o importante é ler, não importa se revista de fofoca ou esporte, se bula de remédio, Machado de Assis ou Rowling. Leia! A prática da leitura é fundamental para estimular o raciocínio, ampliar o vocabulário, abrir janelas para outros mundos, fazer pensar. E não cabe a mim – não me colocando como juíza do bom gosto ou da (*alta*) cultura – determinar o que é, ou não é, um bom livro, pensado, claro, como um prazer, algo que degustamos e, às vezes, dividimos com outras pessoas.
Acredito mesmo que essa geração de leitores continuará lendo e quando chegar a minha idade terá lido muito mais do que eu li e um material bem mais variado, talvez. Aliás, já há matérias circulando por aí que apontam que as crianças de hoje estão lendo muito mais que os adultos. A minha geração, pelo menos o pessoal do mesmo grupo social que eu, lia material obrigatório escolar e muito pouco além disso. Livros eram - e são ainda - muito caros. Eu só fui descobrir uma maravilha chamada sebo quando cheguei à universidade...
Lembro de minha mãe, que é professora, me negando livros, porque não eram para a escola e que eu precisava mais (*e precisava, também*) de um sapato novo, ou da estranheza que era me ver pedindo livros ao meu tio mais querido em todos os natais. Ele era o único que preguntava o que eu queria e os livros da Ediouro, Coleção Elefante, nem eram tão caros assim. Minhas leituras primeiras de Sherlock Holmes foram todas da estante de uma prima que tinha a idade de minha mãe, mas mantinha o hábito de ler e muito.
De qualquer forma, independente do que os adultos possam pensar, as editoras e o mercado como um todo já descobriram o caminho das pedras. Tempos atrás houve uma matéria no Globo intitulada Adolescentes brasileiros formam legião de leitores-fãs e impulsionam as vendas das editoras, isto é, o segmento que mais dá lucro é o entre 13 e 18 anos. Hoje, a Folha de São Paulo trouxe outra matéria na mesma linha Quem disse que jovem não lê? Repetindo as mesmas impressões e estabelecendo que as sagas puxam meninos e meninas para os livros, a maioria para o papel mesmo, aquele negócio de virar página e cheirar o livro novinho... quem nunca?
Aliás, assim como nos mangás, quer dizer, na maioria dos quadrinhos japoneses que são para adolescentes, um dos fatores que mais atrai o leitor ou leitora é o fato das personagens terem a sua idade. Em alguns casos, crescendo junto com a audiência. É a tal liminaridade. O mesmo ocorre em muitas dessas sagas juvenis e um dos melhores exemplos é Harry Potter. A Folha fez uma matéria sobre isso, também. Quem como eu leu o material todo já adulta, percebe de outra forma, mesmo sendo fã, é bem mais complicado tentar se colocar na posição do menino ou menina em fase de crescimento. Mas e quando se tem a mesma idade? E olha que eu me empolguei com Jogos Vorazes... é, há o diálogo com o cinema, mas isso fica para outro texto.
Voltando para a matéria de hoje, Quem disse que jovem não lê?, há uma segunda parte falando dos blogs literários e de como as editoras perceberam sua importância para fazer um marketing certeiro e gastando quase nada: “"Quando um blogueiro muito popular comenta ou resenha um livro, aguça a curiosidade dos leitores, divulga o título e aumenta a chance de que ele seja vendido", afirma Alessandra Ruiz, "publisher" da editora Gutenberg.”. é por aí mesmo. Só senti falta do blog da Karlinha, o Coffe & Movies, pensei que ia encontrá-lo citado na matéria.
Voltando ao início, devo dizer que os meus melhores alunos e alunas sempre foram ávidos leitores. Normalmente, também, eram sensíveis, educadíssimos, pensavam para além do seu umbigo. Isso não quer dizer que concordassem comigo, ou me adulassem, mas que exigiam de mim muito mais do que outros alunos e alunas, queriam uma aula melhor, traziam perguntas, ou simplesmente mostravam nas provas e trabalhos do que eram capazes.
Pena que entre os adolescentes e jovens (*e adultos que se recusam a amadurecer*) que lêem muito, há os que ficam orbitando em torno de gurus duvidosos da internet, normalmente, seres reacionários e vulgares pseudo-ilustrados, se alimentando de lixo – ou chorume, como o povo parece preferir hoje – que circulam principalmente nas redes sociais. Esse tipo de leitor, normalmente está fechado para a experiência libertadora que os livros, sejam quais sejam, podem proporcionar. Lêem fragmentadamente, ou lêem e nada entendem, crêem em teorias da conspiração, e alguns ainda acreditam que já sabem tudo e que, bem, quem não vê o mundo pelas suas lentes pertence à escória da humanidade.
4 pessoas comentaram:
Adorei o post que vai de encontro ao que eu estava reparando nos últimos, dias, mas depois de uma ida à bienal do livro, a única questão que me ficou foi: sim, os jovens hj lêem mto, mas eles estão compreendendo o que lêem, ou é só um devorar livros vazio?
Pra mim ficou uma impressão do eu tenho mais livros, ou, este eu já li e você não... talvez eu tenha cruzado com as pessoas erradas mas pela quantidade de gente, parece-me um padrão, infelizmente.
É preciso ser cego para dizer que os jovens não leem hoje em dia. Eles estão, felizmente, lendo cada vez mais. O que eu percebo que falta é o "salto" da vontade de ler só livros de entretenimento para a vontade de ler livros mais complexos e críticos também. Ler para se entreter é ótimo, e eu mesmo leio muitos livros desse tipo quando quero me divertir. Mas acho importante que os jovens criem interesse em ler obras mais críticas também, para "abrirem a cabeça" e desenvolverem novas linhas de pensamento.
Os próprios professores poderiam fazer isso na escola, e sem a menor dificuldade: é só ver a quantidade de fãs de "A Culpa é das Estrelas" que se interessou em ler "O Diário de Anne Frank", pelo simples fato do último ter certa importância na trama do primeiro. Por que não pegar a atual moda de distopias e a usar para discutir livros como 1984, por exemplo? Esse tipo de atitude poderia gerar discussões muito positivas, informando e entretendo os alunos ao mesmo tempo.
Mas duvido muito que as nossas escolas decidam sair do velho esquema tão cedo... O que, como consequência, cria legiões de adultos que ou não gostam de ler, ou que se fixam somente na literatura de entretenimento, sem abrir brechas para tentar voos mais altos.
Pelo que percebo, atualmente há um grande consumo de livros pelos jovens hoje em dia, mas grande parte do público simplesmente usam o livro como entretenimento, nem todos enriquece o vocabulário, ou abrem a mente para novos conceitos, simplesmente se divertem, e passam para a próxima saga, claro isso não é nenhum pecado, mas esses jovens deveriam sim conhecer o mundo fora dos best-sellers do NY Times, fazendo-os terem um conhecimento mais enriquecedor, um senso crítico mais aguçado, pois pouco adianta se deliciar em uma leitura e não aproveitar 100% da obra.
Acho que mesmo que os jovens só leiam aventuras, ficção, fantasia, é valido.
Aumenta o vocabulário, abre a mente de acordo com os personagens, de como eles veem o mundo, e isso influência o leitor.
Eu mesma só leio fantasias e romances.
Li Eragon, e aprendi muita coisa com as conversas entre o personagem principal e seu mentor, e as próprias divagações.
Isso depende muito de quem lê também, uma pessoa pode ler e simplesmente não captar nada além da história para si.
Mas como neste caso que comentei, ele tem vários trechos onde é dito coisas importantes que se pode aplicar na nossa realidade.
Um pequeno exemplo meio longo do que estou falando:
Entre uma discussão entre o personagem principal e o mentor
"- Você está confundindo as coisas. Tudo que eu queria era saber qual a ferramenta mais útil que uma pessoa pode ter, independente de ela ser má ou boa. Concordo que é importante ter uma natureza virtuosa, mas eu também discutiria isso se você tivesse que escolher entre tem homem um caráter nobre ou ensiná-lo a pensar claramente, você faria melhor em ensiná-lo a pensar claramente. Muitos problemasw neste mundo são causados por homens nobres de mentes obscuras.
A história nos mostra inúmeros exemplos de pessoas convencidas de que estavam fazendo a coisa certa e cometerram crimes terríveis por causa disso. Tenha em mente Eragon, que ninguém pensa em si próprio como um vilão, e poucos tomam decisões que julgam ser erradas. Uma pessoa pode não gostar de sua escolha, mas a defenderá o tempo todo porque, mesmo nas piores circunstâncias, acredita que é a melhor opção disponível no momento.
Por iniciativa própria, ser uma pessoa decente não é garantia de que você agirá bem, o que nos traz de volta à única proteção que temos contra demagogos, malandros e as loucuras das multidões, e o nosso guia mais seguro para superar os obstáculos incertos que enfrentamos ao longo da vida: o pensamento claro e razoável. A lógica jamais falhará com você, a não ser que você não saiba - ou ignore deliberadamente -as conseqüências dos seus feitos."
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