Nesta semana um caso gerou espanto e revolta em muita gente na internet: uma mulher residente em Minas Gerais, casada e sofrendo de uma cardiopatia grave, requereu conforme a lei – artigo 128 do código penal – o direito a um aborto terapêutico. Só que, apesar da mulher ter todo o direito de interromper a gravidez para preservar a sua vida, o juiz Geraldo Carlos Campos, deliberou que o casal, que já tinha interrompido outra gravidez ano passado, não tomou nenhuma medida contraceptiva (*Será? E se “sim”, e daí?*) e que a gravidez era esperada (*"não deixa de ser um ato voluntário"*), que como pessoas "maduras e esclarecidas", tiveram uma "conduta negligente". A decisão não é definitiva, cabe recurso, mas ela está na oitava semana, e sua saúde e vida estão em risco. Notícia pode ser lida em várias fontes: TJMG, Último Segundo, Estado de Minas, Jornal do Commercio, R7, etc. Sim, é possível a interrupção da gravidez em alguns casos neste país: estupro, risco de vida da mãe e má formação fetal grave (*vide o caso dos anencéfalos*).
Antes que alguém diga que há um bebê a caminho, assevero que dada a gravidade da saúde da mãe (*ou não teria autorização para abortar anteriormente*), não haverá bebê algum, mas, sim, uma mulher morta ao fim deste processo. A escolha da foto do post foi proposital, ainda mais em um mundo no qual é possível desumanizar ao extremo uma mulher fazendo chamada de jornal na TV com “primeira imagem do herdeiro real” e mostrar a imagem da esposa do neto da Rainha Elizabeth com uma ínfima barriga de três meses. Além disso, a lei lhe assegura o direito a interrupção, não é algo que fique ao bel prazer do juiz. Gravidez acidental acontece, métodos contraceptivos falham, e se formos para os métodos contraceptivos naturais, aqueles defendidos pelos pró-vida religiosos, a abstinência, eles falham mais ainda. Independente da (*suposta*) negligência do casal, a decisão do juiz vai contra a lei e, claro, pune a mulher com a possível morte. Engravidou “porque quis”? Morra. Porque apesar do apoio do marido, é ela, a mulher, que está com sua vida em risco.
Só em uma sociedade na qual as nossas vidas valem tão pouco, poderia acontecer uma decisão como esta. Mulheres são cidadãs de segunda classe, não tem direito de autonomia sobre seus corpos e, sim, podem ter sua vida colocada em risco para castigá-la. Neste caso, vejam bem, nem se trata de garantir a vida do feto, mas de punir mesmo a mulher, especialmente, porque, bem, ela engravidou DE NOVO. É uma covardia e crueldade tão grande que é difícil imaginar... Quer dizer, eu, como mulher, posso imaginar. Eu posso passar pela mesma situação, hipoteticamente falando. Eu posso engravidar, ter direito a interrupção de uma gravidez segundo a lei, procurar os meios legais (*não uma clínica clandestina*) e ter um juiz (*homem*) definindo que, mesmo casada, “não promíscua” (*vocês sabem, que isso pesa muito*), me castigando com a morte, porque, bem, sou uma pessoa esclarecida (*Poxa! Com doutorado e não sabe prevenir uma gravidez?!*) e madura (*chegando lá nos 40 anos*). É aviltante. Eu optaria por uma esterilização, mas, talvez, a moça nem possa se submeter a ela ou ao uso de contraceptivos orais por causa de sua doença, mas um marido consciente faria uma vasectomia. Mas é opção, e nem acho que prevista na rede pública para casos como esse, pois é necessário ter dois filhos nascidos vivos e mínimo de 25 anos. Fora, claro, a demora.
Recentemente, uma mulher de origem indiana morreu na Irlanda – país bem mais católico que o nosso, pelo menos nas estatísticas – porque lhe negaram um aborto terapêutico. Aqui, esse juiz se arvorou de “deus” para deliberadamente condenar uma mulher à morte. Pois é isso que a sentença pretende, já que a doença não permitirá que a gravide chegue a bom termo, simplesmente, bem, porque ela engravidou DE NOVO. Só para fechar, reforço que, neste caso, nem se trata de priorizar o feto à mulher que o carrega, trata-se de punição mesmo, condenação à morte ou tortura. Tortura, aliás, é crime e pena de morte não está prevista em nosso código penal. Mas, reforço, mulheres não são cidadãs completas e o judiciário esses dias anda tendo seu já inflado ego midiaticamente reforçado com a idéia de que são o poder acima dos poderes. Ser mulher no Brasil é muito perigoso e isso não é só papo de feministas, como eu, mas algo que se materializa em decisões judiciais como essa.
8 pessoas comentaram:
Valéria,eu, que sou homem, tb me sinto atingido pela violência contida na postura da lei em relação a essa mulher, ao bebê, à todas as mulheres e, por fim, seres humanos sob o jugo de leis que se aplicam a seres humanos *sem levar em consideração o fator humano*. Tenho irmãs, sobrinhas, amigas, tive uma mãe, e tenho tias, primas,e afins...e realmente me intriga toda vez que uma mulher "precisa" da lei para decidir o que fazer com seu corpo,precisa que homens com pensamentos retrógrados, e conclusões insanas dêem a palavra final nessas situações. É violência em sua forma mais pura. É crueldade desmedida e, o mais assustador: amplamente difundida e aceita por um grupo que se auto-define como sociedade. Ultrajante, pra dizer o mínimo.
NanO, acho que o pior neste caso é que a decisão do juiz vai contra a legislação. E não somente contra o artigo 128... É pior, é mais vil ainda...
O recurso vai demorar tanto que o pior nesse caso a morte dessa mulher vai acontecer. O Brasil é um dos países que avançou em alguns aspctos sociais. Sempre imagino que isso só é para 10% da população, a massa, o povo que movimenta esse país com sua força e sua alegria não recebe o mesmo tratamento. Continuamos vendo policial matando menor, preso algemado, politico desviando verba e etc. A justiça quando se trata de mulher ai complica mais ainda. A justiça se mostra muito burocrática, lenta, não protege quem deveria é só ver os telejornais. Matou a atriz e esta na mídia ganhando para falar (Cade a justiça?), matou o jornalista estão presos... é homem. É ruim esse papo sexista mais....
Um abraço Valéria Fernandes, me chamo Iolene Beltrão
Vai demorar tanto que ela pode morrer esperando. No Brasil nascer mulher é um risco que se corre...
Um abraço Valéria Fernandes, me chamo Iolene Beltrão
ola sou de uma menina de 3 anos e mi arriscaria sim ate o fim só pena minima oportunidade de ela nasce.Assim como e triste uma mulher morre é pior ainda ela escolhe e decretar que a vida dela e mais importante do que a do seu filho. QUE PODE SER UMA MULHER IGUAL A ELA. Então onde fica È PORQUE NO BRASIL NASCER MULHER È UM RISCO A CORRE. Isso quando tem direito de se nascer.
"Amai a teu proximo como a si mesmo" Ele deu a vida mesmo por aqueles que o colocaram nela. E para ele nada,nada e imposivel. Disso eu sou testemunha viva!
Francisca, parabéns pela sua menininha e que Deus - aquele que é misericordioso, não o que só julga e condena como muitos de seus seguidores - nunca permita que você passe por algo semelhante ao que esta mulher está passando ou sua filhinha, pois ela também é mulher e pode, um dia, passar por uma situação semelhante, uma condenação à morte, seca, desumana e que é simplesmente fruto do exercício de falta de amor e misericórdia.
E que você possa dedicar o seu tempo não somente a orar por mulheres que tem seus direitos constitucionais NEGADOS, mas para estudar um pouquinho casos como o desta notícia e saber que não haveria criança alguma no fim fo processo, só uma mulher morta. Aliás, se Deus nos deu livre arbítrio, porque querer confiscá-lo dos outros, não é mesmo?
Esse pessoal que não entende que há uma lei que permite a interrupção da lei neste caso e que não há próximo algum a ser salvo a não ser a mulher, favor ter a decência de não comentar. Vá usar espaço dos grandes portais e sites religiosos burros para se expressar.
Não vou aprovar mais nenhum comentário do gênero.
Relmente, ser mulher no Brasil - e arrisco a dizer, no mundo inteiro - é um perigo. Ser tratada como objeto, como ser humano de segunda categoria, passível de todo tipo de violência e sem o apoio prático das instituições que deveriam nos proteger, mostra como ainda a sociedade é nojenta.O que me deixa mais ultrajada é escutar esse discurso perverso na boca de outras mulheres, que acham que são intocáveis, que essas situações só acontecem com mulheres "não se dão ao respeito", corroborando esses e outros casos de violência contra mulheres, tão atrozes quanto. Sou a favor da legalização do aborto e é inconcebível o caso dessa mulher de Minas para uma sociedade que se diz liberal, progressista e democrática.
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