segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Olimpíadas de Londres: Meus Comentários Finais



Ainda sobre o efeito da festa, preciso registrar algumas impressões sobre esta Olimpíada, a primeira da história com mulheres em todas as delegaçãos. É preciso registrar antes de tudo que o esforço de nossos atletas, daqueles que dão seu sangue pelo esporte, com pouco ou nenhum patrocínio, precisa ser louvada. Medalha é muito bom, mas ver um atleta fazendo o seu máximo é muito melhor. É absurdo que muita gente só respeite um atleta quando ele ou ela traz medalha e não qualquer medalha, só vale se for de ouro. É esse tipo de pensamento mesquinho que se desdobrou em ataques furiosos na internet aos nossos atletas.

Esquece-se de falta de patrocínio, da falta de escolinhas de formação e investimentos constantes. Na Olimpíada de Pequim, a medalha de Maurren Maggi – primeiro ouro de uma brasileira em esporte individual – salvou o atletismo de cortes de patrocínio. A não-medalha da ginástica determinou os cortes. O centro de treinamento da seleção feminina foi dissolvido, nosso treinador foi dispensado (*para ser vitorioso com a equipe russa logo em seguida*). Quando vemos o vôlei vitorioso, tem gente que não procura saber sobre os investimentos pesados desde os anos 1980, e não somente no adulto, mas no juvenil. O vôlei, se não mudou, é o segundo esporte melhor assistido no Brasil. O centro de treinamento é um deslumbre e fica em Saquarema (RJ). Os frutos estão aí. Mas uma Sarah Menezes só conseguiu ir para a equipe de judô nacional, e receber algum patrocínio, depois que seu professor tirou do seu bolso para que ela fosse para uma competição internacional. Com a medalha, ela recebeu a atenção. E se não tivesse um professor tão abnegado e que acreditasse em seu potencial? E se não tivesse ganho a medalha? Vocês viram o desespero do Diogo do tae-kwon-do? Pois é, ele sabe o que pode acontecer (*de novo*). Eu temo pelo corajoso futebol feminino, sem estímulo, sem campeonato. Será que sem medalha olímpica os patrocínios vão aparecer? Du-vi-do!



O bolsa atleta é um programa importantíssimo, o maior de seu gênero no mundo, mas insuficiente. Se os valores na página do ministério estão corretos, a maior bolsa que é para atleta olímpico ou paraolímpico, é de R$2500. Parem e pensem nas necessidades de um atleta: transporte, alimentação, equipamentos, viagens. E só muito recentemente o governo permitiu que os atletas bolsistas pudessem acumular patrocínio. Alguém viaja para competições internacionais com R$2500? Só disputando com os melhores você consegue se aperfeiçoar. Daí, achei profundamente injusto o Thiago Pereira, medalhista de prata na natação, culpar suas colegas do feminino pelos péssimos resultados. Acusá-las de vaidade, ao invés de ressaltar a falta de patrocínio e investimentos para que nossos atletas possam treinar e disputar com os melhores. Faltou maturidade, solidariedade e consciência. O técnico do Arthur Zanetti, sim, foi direto: em quatro anos não se forma uma equipe vencedora; sem enviar os atletas para competições de ponta, eles não evoluem. Mas o Brasil é o país do futebol. E se o ouro viesse para Neymar e companhia muito provavelmente todas as outras medalhas seriam obliteradas, esquecidas, desmerecidas. Aliás, sabiam que a festa estava armada? Vice-presidente no estádio e tudo? Pois é...

Eu não vou passar a mão na cabeça de atletas que não fizeram o suficiente. Acho que a Fabiana Murer foi uma decepção. Ela não precisava ganhar, mas precisava, sim, pular. Parecia que não estava nem aí... Não gostei da postura do César Cielo. Dizer que os 100m o cansaram, que ele só vai nadar os 50m, é desculpa muito capenga. Como o Phelps nada tudo e mais um pouco? Ele é super-humano? Na outra Olimpíada, Cielo nadou o revezamento e ajudou a natação do país. Nesta Olimpíada pensou somente nele. E Cielo é atleta de ponta, bem patrocinado. Nem vou falar do cara do hipismo reclamando de falta de investimento... Só entraria em detalhes se ele estivesse falando em estimular meninos e meninas pobres e de classe média a praticarem o hipismo, apoiando-os em um esporte que, hoje, é para poucos privilegiados. Quando vejo a capitã da seleção de hóquei inglesa fraturar o maxilar, operar e voltar para jogar, ou a jogadora da Nova Zelândia que voltou para jogar com a cabeça quebrada, fico comparando com a história do cansaço e do vento. Não estavam preparados? Faltou garra. Não é somente no futebol masculino que essas coisas acontecem, não. E veja, repito, não estou pedindo medalha, estou pedindo aplicação, garra e, sim, aquele patriotismo bobo que aflora nas Olimpíadas. E, durante e depois, é preciso, sim, assumir a culpa e meter o dedo na ferida.


A Confederação de Boxe e Ginástica quiseram capitalizar em cima de vitórias individuais, dizendo que foi fruto da boa administração e os atletas – que deram seu sangue – se manifestaram. Essa é a atitude que pode fazer diferença, que pode mudar a situação para as próximas Olimpíadas, não criticar as colegas, como o Thiago Pereira da natação fez. Uma Olimpíada é uma vitrine, é lá que o atleta precisa mostrar-se, seja para se vender como produto, para divulgar a modalidade, para inspirar novos atletas. Infelizmente, a maioria dos brasileiros não consegue acompanhar o mundo dos esportes, porque as TVs e jornais falam de futebol e, se sobrar tempo, de outros esportes. Eu tento acompanhar algumas coisas, leio as notícias que posso, mas nem sempre é possível acompanhar o que realmente está acontecendo. Eu só fui saber detalhes mais dramáticos do que aconteceu com a equipe feminina de ginástica e vôlei já nas Olimpíadas. Que Natália Falavigna vinha de uma lesão, no dia de sua luta. Que a nossa medalhista pioneira no boxe – Adriana Araújo – tinha ouvido dos cartolas da Confederação de Boxe que ela não merecia estar na seleção, quando ela recebeu sua medalha. Olha, é muito descaso com nossos atletas. E queremos medalha (*de ouro*), nos tornamos especialistas instantâneos. É muito triste isso.

Eu queria terminar registrando meus parabéns para todos os que competiram e que deram o melhor de si, ganhando o perdendo. Quem viu a Natália Falavigna disputar mancando (*depois revelou-se que ela fraturou o pé na luta*), assim como o Diogo, sabe que eles deram o seu melhor. Lutarem até o fim, mesmo em desvantagem, eu me orgulho deles. Quase chorei com os irmãos Falcão. Nunca uma medalha me pareceu tão injusta quanto a prata do Esquiva Falcão. Eu queria que ele entregasse o ouro nas mãos de seu pai. Eu queria um filme sobre essa família. Parabéns para Arthur Zanetti, que, quietinho, manteve os nervos no lugar. Sim, é o psicológico que derruba muitos brasileiros. Para os judocas – Sarah Menezes, Felipe Kitadai, Mayra Aguiar, Rafael Silva – e para a técnica leoa das mulheres. Vocês foram espetaculares. Para os irmãos Esquiva e a Adriana Araújo, que vocês possam brilhar em 2016. Para a espetacular equipe de vôlei feminino e seu técnico, Zé Roberto. As mulheres de ouro começaram, sim, muito mal, mas se tornaram gigantes contra todas as expectativas. As minhas eram as piores. Eu tenho trauma, confesso. Esperava o ouro dos homens, que foram displicentes no último jogo, e terminaram suplantados por uma equipe igualmente brilhante. Eles também estão de parabéns, mas podiam, sim, voltar com o ouro no peito. Para a valorosa Yane do pentatlo. Lembro de uma entrevista dela de anos atrás dizendo que não tinha dinheiro para comprar as roupas de competição e sua mãe é que fazia em casa. Para todos os outros medalhistas, também. Aqui está o nome de todos eles e elas.


2016 vem aí e eu temo várias coisas. Temo que os investimentos nos nossos atletas e na formação continuada continuem minguados e as expectativas altas. Muita gente vai querer capitalizar com as Olimpíadas, espero que o esporte em nosso país possa ter algum lucro, também. Temo pela falta de educação do público, que vaia e xinga nos estádios e nas competições, que despeja suas frustrações e seu ódio de forma criminosa na internet. Para evitar maiores constrangimentos, seria bom o Governo começar já uma campanha educativa... Mas eu duvido. De resto, parabenizo a Record que conseguiu fazer uma transmissão acima da média, quer dizer, acima da Globo que em Pequim cortou final da cerimônia de encerramento, porque a transmissão seria feita pela concorrente. Nunca a Globo iria parar sua programação na TV aberta para enfocar esportes desconhecidos ou jogos que não fossem do Brasil. Eu assisti hóquei de grama na TV, parecia até os bons tempos da TV Manchete. Isso, claro, não quer dizer que não possam melhorar, que não pisaram na bola em alguns momentos. E mais, exclusividade em um evento como Olimpíada é um absurdo (*culpa de quem vendeu*), mas foi ótimo me libertar da Globo. E antes que alguém pergunte, não tenho TV por assinatura. Olimpíada deveria ser prioridade na TV aberta e não um luxo para quem pode (*e quer*) pagar.
P.S.1: Uma das coisas mais irritantes dessa Olimpíada foram as listas de "musas", como se todas as atletas estivessem competindo em um concurso de beleza para agradar ao olhar masculino. Para piorar, essas tais listas eram quase 100% brancas com presença mínima de atletas que fossem negras ou orientais. Dentro dessa pavorosa maré misógina, abundaram as fotos quase pornográficas das atletas. Que renderam críticas interessantes como esta aqui. Vale a visita.

7 pessoas comentaram:

Concordo com tudo que você falou sobre a falta de incentivo. Eu nadei a minha vida inteira e sei como é essa vida de atleta sem apoio. Muita gente boa desiste por isso. Sem falar nas horas e horas de dedicação, treino...
Quanto aos homens do vôlei tive a impressão de que eles subiram em um salto alto e pensaram que não poderiam perder. Foram relapsos e se entregaram totalmente enquanto a Rússia lutou pelo ouro e mereceram ganhá-la. Depois Giba (que já deveria estar aposentado) e cia. ficaram chorando a medalha perdida. Deveriam ter lutado ao invés de se entregar. Faltou garra. Se tivessem lutado, jogado duro... Eu até teria pena das lágrimas deles, mas da forma como foi, da forma como eles se entregaram sem nem lutar...
Não concordo sobre a boa transmissão da Record. Comentaristas ruins (que não explicavam nada sobre a competição que estavam comentando e limitavam-se a torcer), narradores ruins que só ficavam se repetindo... E em um desses domingos a Record deixou de exibir as Olimpíadas para passar o Gugu. Obviamente a Globo não deixaria de passar o Faustão para exibir as Olimpíadas, mas esse negocio de 'exclusividade' foi irritante já que não nos deu qualquer direito de escolha.
E, acredite, muita gente odeia a Record (mais do que a Globo tendo em vista a quem a Record pertence) e preferiu não assistir as Olimpíadas.
Li em algum lugar que 60% dos brasileiros nem tomou conhecimento no dia da abertura que as Olimpíadas estavam começando. Isso é muito ruim para o incentivo que falei no começo.

Olá!!
Realmente é vergonhoso ver como o brasileiro pensa, mais infelizmente é assim a sociedade. Errada.
Gostei e parabenizo todos os atletas que competiram, que ganharam as medalhas merecidas, mesmo as de bronze, que aliás, foram as maiorias e que ajudaram o Brasil a ter uma olimpíadas recorde. Pelo menos foi isso que a Record frisou.
Acho que assim como quatro anos são pouco para os atletas é pouco para mudar o modo de pensar de muita gente....

Bianca, concordo com tudo o que você escreveu sobre a seleção masculina. Uma das coisas que eu comentei durante todo o torneio com meu marido foi como pode o jogador mais jovem do Brasil ter 25 anos. Acho que seguraram esses jogadores mais velhos – e isso aconteceu na ginástica, no vôlei de praia masculino – para dar uma chance a mais. No caso do vôlei masculino dos sujeitos ganharem um ouro, ou outro ouro. Isso não é muito racional. No último jogo até o Bernardinho errou. Queimou o tempo que ele tinha, pedindo para parar a partida quando a Rússia estava com 15 pontos. Com 16 iria parar de qualquer jeito... Enfim, foi uma derrota desnecessária, sem tirar o brilho da Rússia, mas eu não vou dizer que eles não fizeram uma bela campanha, porque fizeram.

Quanto á Record, sei que muita gente odeia a emissora. Para mim, é o tipo de gente viciada em Globo e que acredita que a Veja é a voz da verdade, ou então gente tolinha que acredita que a programação da Record está 100% a serviço da Universal. Houve gente cretina perguntando se a Record cortou Iemanjá da cerimônia de encerramentos. Ora, a Globo cortou a apresentação de Londres no encerramento de Pequim. Afinal, se eles não iam exibir... Eu sou contra a exclusividade, mas antes nas mãos da Record do que nas mãos da Globo.

A Record passou Gugu em um domingo, assim como passou Tudo é Possível quando poderia estar exibindo a final do basquete masculino, por exemplo. Só que a Record News é aberta e estava passando. A Globo compra para os outros não exibirem e não sacrificaria sua programação por nada. A Record atrasou suas novelas, cortou os programas matutinos. Enfim, eu não tenho dúvidas de quem pode fazer melhor.

Se a Record não se pautar pela Globo, podem, sim, ter uma cobertura melhor que a da concorrente. Levaram especialistas em todos os esportes para auxiliar os repórteres, levaram mulheres e homens na mesma medida. Quando eu vi a equipe da Bandeirantes na propaganda, tínhamos o que? Uns 15 profissionais, dois eram mulheres. Como se justifica isso? Os narradores da Record eram repetitivos? E Galvão Bueno – o especialista máximo em qualquer esporte – é bom? E Milton Neves? Uma criatura que diz que as mulheres do Brasil perderam no vôlei de praia porque cobriram o que tinham de melhor, seu corpo? E o Juca KFouri? Que chamou as jogadoras do vôlei de quadra de “tias velhas” que estavam fazendo vergonha para o Brasil? Depois, claro, tentou se retratar. Estou farta desses caras e da cobertura da Globo que só mostra o que interessa para eles.

Quanto à audiência, o IBOPE diz o que a Globo quer que diga. A Globo já bloqueou a entrada de outras empresas de medição de IBOPE para continuar líder e, claro, conseguindo os melhores patrocínios. E o povo que acredita, que reforça, merece, sim, ser tratado como o Homer Simpson. Eu ouvi a gritaria no jogo RússiaXBrasil no vôlei feminino. Estava na Feira dos Importados. Era TV aberta, era a Record. Mas o IBOPE ficou reforçando que nem com jogo do Brasil, a Record ficou na frente... Sei, sei... Globo seria melhor vitrine? Talvez, mas só porque esse sistema é viciado. E terminou a Olimpíada e voltamos à mediocridade do futebol. Simples assim.

Bom dia, Valéria!
Concordo com muito do que você falou aqui.
Não sou de assistir tv, mas com as Olimpíadas, acabei ligando um pouco a tv pelas manhãs. Todo dia passava algo diferente e não só jogos do Brasil, como você bem frisou.
Achei os comentadores da Record (pelo menos o 'da casa') fracos, com uma emoção por vezes falsa embutida na voz. Não estou dizendo que na Globo seria diferente (o fato de não ter Galvão Bueno narrando já é uma bênção!), mas é uma das cosas que precisam melhorar.
Também acho que as medalhas vão vir com investimento, com centros de treinamento adequado, mas (romanticamente?) acredito que participar de uma Olimpíada já é um grande feito, que vencer é bom, mas o importante é competir. (claro, entra a força e a garra que você já mencionou, algumas derrotas são vergonhosas, mas não acredito que haja vergonha em perder uma disputa entre iguais)
O que realmente me preocupa nas próximas Olimpíadas não é a quantidade de medalhas que vamos levar, ou se a população vai sair xingando geral (apesar de, nesse caso, que deveria me preocupar), mas a questão de infra-estrutura. Se já é um inferno pegar transporte público no Rio e São Paulo (sem contar Brasil afora), imagine num evento desses?!
Acredito que uma falta de infra-estrutura adequada vai servir de lente de aumento para os outros defeitos. Que nem uma pessoa mal-humorada com fome.
Os patriotas e ufanistas que me perdoem, mas o Brasil ainda não está pronto para receber esse tipo de evento, nem vai estar até mudar profundamente certos aspectos políticos e culturais.

Lala, eu até acho que eles vão "dar um jeitinho". Vão dar feriado, vão tirar as pessoas da rua. Mas vai ser um inferno para os moradores. Eu acredito que pior pode ser a Copa...

Eu fui contra a Olimpíada no Rio e fiz até um post sobre: http://bit.ly/Qynp3o

Muito bom o post sobre as Olimpíadas no Rio!
Engraçado que naquela época ainda se tinha um pinguinho de esperança...
Se cortarem mais verbas do que já cortaram da pasta de Esportes quero ver como vai ficar 'lindiu' nosso quadro de medalhas... aí nem melhoras na cidade nem medalhas e só gastos e confetes...
Falo para todo mundo da família fazer uma boa poupança, pq depois da Copa (q tb acho que vai ser um caos maior ainda) e da Olimpíada o país vai estar falido.

Também concordo com grande parte do que você disse. Só estava expondo a minha opinião.
Eu gosto muito das suas resenhas e criticas. Sempre dou uma olhada no blog para lê-las (leio até quando não assisto o que está comentando - tipo a novela Gabriela).
Ah, e a Record News não estava liberada no meu Estado (Piauí). Aqui só pega a Record principalmente mesmo então a gente não tinha opção de outro canal.
E eu detesto o Galvão Bueno x.x Os narradores que eu não gostei são justo os que vieram da Globo para a Record. Tem dois narradores do SporTV que eu gosto, mas não lembro o nome deles (sou péssima com nomes).
Agora os comentaristas eu não gostei não... Principalmente da Virna e do Popó. O Oscar do basquete... no dia do jogo contra a Argentina no começo do jogo disse assim: "Ah, a Argentina é fácil. Nós vamos ganhar e ir com tudo para cima dos Estados Unidos". E no final deu que no que deu... Esse comentários assim me deixaram meio irritada.
Bom, não disse no primeiro comentário então digo agora: Parabéns pelo blog.

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