Eu tinha me comprometido a resenhar todo filme que assistisse e, também, os mangás e livros que lesse. Nem tudo eu vou trazer para cá, afinal, pode não ter nada a ver com o Shoujo Café. Só que um livro que terminei em janeiro deveria ter sido resenhado e, agora que estou no Rio de novo, decidi comentá-lo aqui. Trata-se do primeiro livro que li em formato digital e usando o tablet. Por conta disso, há a dupla experiência, a da leitura sem papel e a do livro em si. O nome do livro é Jane Eyre's Husband – The Life of Edward Rochester de Tara Bradley. Pelo título, vocês já imaginam que minha leitura começou na época que eu estava revendo todos os filmes e séries baseados no livro de Charlotte Brontë.
Eu não tenho problemas com fanfics e este livro é um fanfic. Eu já livros que eram fanfics em formato grande e impressos, como Mr. Darcy’s Diary e Mr. Darcy Vampyre, além de vários livros com Sherlock Holmes nas mais diferentes situações. Só por aí vocês já tiram que minha disposição depende diretamente do meu interesse pelas personagens e os seus livros de origem. Quando vi esse livro com Rochester e suas boas avaliações no Amazon acabaram pesando na compra. Não me arrependo de tê-lo comprado, mas está longe, muito longe de ser um bom livro. A média no Amazon são quatro estrelas, eu daria duas e meia, no máximo três. O principal motivo disso é que a autora extrapola a sua proposta original que era escrever sobre Rochester e quer escrever sobre todas as personagens de Jane Eyre e muitas mais. Eu realmente não comprei um livro sobre Grace Poole, eu comprei um livro sobre Edward Rochester. Aviso que a resenha parte do princípio que você conhece o original, leitora ou leitor. Se quiser saber mais sobre Jane Eyre, tente uma busca rápida no site, porque já escrevi bastante sobre os filmes e outras questões relacionadas ao livro.
Primeira coisa, o livro é dividido em três partes e não é narrado em primeira pessoa, como eu esperava. A primeira seção do livro trata de Rochester antes de Jane, sua infância, algo da sua adolescência, seu casamento infeliz com Bertha, e suas ligações amorosas posteriores (Céline, Giacinta, Klara). A segunda parte é sobre seu encontro e relação com Jane antes do casamento frustrado. A terceira parte é sobre o encontro da felicidade com Jane. Curiosamente, a autora esquece que o livro é sobre Rochester e continua sua narrativa depois da morte do casal protagonista. Afinal das contas, não era um livro sobre o marido de Jane Eyre?! Da mesma forma, ela dá pouca atenção ao Rochester adolescente, momento cheio de coisas a explorar, porque prefere comentar as mazelas de Grace Poole. A primeira e a terceira partes do livro são bem cansativas. Eu me obriguei a continuar lendo, sempre me repetindo que autora deveria ter feito três livros e, não, um só. E que é no mínimo absurdo você escrever um fanfic maior que o original...
Eu comecei a leitura pela segunda parte, afinal, queria ver como a autora trabalhava com o original, isto é, aquilo que sabemos de Jane e Rochester, aquilo que Charlotte Brontë escreveu de verdade. Esta parte merece as quatro estrelinhas. A autora constrói muito bem a intimidade e a cumplicidade que nasce entre Rochester e Jane, o crescente desejo e confusão do protagonista, o drama do casamento e tudo mais. Alguns resenhistas que deram uma estrelinha no Amazon falam que Rochester e Jane tiveram relações sexuais nesta parte do livro. Bem, ou leram outro livro e resenharam errado, ou tem sérios problemas de compreensão de texto. O que temos é o que está no livro, os poucos beijos e a tensão sexual do original. Agora, a novidade é aquilo que Rochester deseja, pensa, imagina, sente.
Não acho absurdo que o Rochester de Tara Bradley tenha pensamentos “sujos” para as resenhistas puritanas, que se masturbe, que imagine Jane em sua cama. Isso se adéqua bem ao caráter da personagem. Rochester era um homem maduro e passional, isso está no livro, mas a autora não poderia registrar esse tipo de coisa em um livro (familiar) do século XIX. Nesses momentos, Rochester me parece bem humano e sem anacronismos, a personagem em si sempre foi passional, cheia de defeitos. Eu adoro o Mr. Rochester por isso. O problema é que a autora não decide se ele foi um homem devasso ou não, mas só fui entender essa inconsistência lendo a primeira parte do livro. Crepúsculo feelings...
A terceira parte do livro ganha as três estrelinhas e meia, porque a autora se alonga demais e quer falar não somente de Rochester e Jane, do amor concretizado dos dois, mas de seus filhos, de Adéle, e de todo mundo que aparecer. Ora, bolas, por qual motivo ela não escreveu um livro sobre os filhos de Jane e Rochester? Por que ela não escreveu um livro sobre Adéle se a personagem interessava tanto para ela? Mas é aquilo, apesar de longa e problemática, a terceira parte do livro tem excelentes momentos, como o drama de Rochester até que Jane volte para ele, o retorno da heroína, a sensação de completude que finalmente Rochester sente com a esposa que é sua igual, a recuperação da visão de um dos olhos...
A autora conhece o material original muito bem, ela consegue escrever sobre ele com facilidade. Cada capítulo, aliás, começa com uma citação do original. O problema é que ela não teve um bom editor, alguém que fosse lá e dissesse “corte isso, corte aquilo, e por aí vai”. Assim, eu na me conformo quando alguém continua um livro depois que seus protagonistas morrem. O livro não era sobre Rochester? Mas a cena da morte de Jane nos braços do marido, algo composto pela autora deste livro, foi muito, muito tocante. E realista, porque eu estava acompanhando o drama da perda de uma pessoa querida exatamente naquele momento. A autora também dá tons feministas a uma das filhas de Jane e Rochester, a moça, que tinha o mesmo nome da mãe, queria ser enfermeira seguindo os passos de Florence Nightingale. Só não esperem nada de muito brilhante aqui, aliás, o desfecho da moça foi no mínimo frustrante para mim.
O problema mesmo, aquela parte do livro para a qual eu daria duas estrelas é a primeira. Se eu tivesse começado a ler o livro do início, talvez tivesse largado. Falo sério! Essa parte é longa, cheia de incongruências e cheia de descrições de cenas de sexo que se torna algo desagradável. Pontos positivos, talvez, somente o retrato que a autora faz do pai e do irmão de Rochester. Gente detestável. A mãe de Rochester, a babá do garoto, até Grace Poole também são OK. Eu, aliás, não vi problema na autora ter desenhado uma amizade infantil entre Rochester e Grace Poole, já que ambos tiveram a mesma ama de leite, a mãe da menina. O problema foi achar que Grace Poole merecia capítulos só dela, um dramalhão somente dela, e, claro, cenas de sexo (desagradáveis) só para ela. Por que não um livro a parte já que a autora queria discutir a personagem? Afinal, é coisa demais: um pai abusador; uma mãe amorosa que morre cedo; a paixão juvenil por Rochester; a tentativa de estupro por parte do pai; o casamento com um homem mais velho, bom, mas que poderia ser pai da menina de 15 anos. Enfim, entenderam o que eu disse?
Outro problema é que a autora cisma de pintar Rochester como um donzelo que queria se guardar virgem para o casamento. Eu brinquei com Crepúsculo, porque efetivamente, em plena Regência, essa história de um rapaz, rico, bem nascido, sem fortes sentimentos religiosos, e solto no mundo (*ou quase*), desejar ser casto deveria ser algo muito pouco usual. Mas a autora acha que isso tem grande apelo. De repente, ela acreditava que Rochester era uma espécie de Príncipe Albert (*marido da Rainha Vitória*) que não deu certo... Só que exatamente por isso, ela não consegue me convencer se Rochester é devasso ou não. Ele diz ser, ter muitos pecados, blá-blá-blá, mas nessa primeira parte o que eu vejo é um sujeito muito cheio de problemas e frustrações.
Ao mesmo tempo em que a autora quer construir um Rochester puro que é traído e arrastado para o inferno, ela quer descrever cenas de sexo ad nauseam. É aí que ela pisou na bola feio e traiu o original. Quem conhece o livro sabe que Rochester foi enganado no casamento com Bertha. Ele pouco falou com ela, sempre acompanhado. Isso era normal para a época, havia gente mesmo que só conhecia o cônjuge no dia do casamento. É somente por conta disso que o protagonista não percebe que a futura esposa tinha problemas mentais. Só que no livro de Tara Bradley, Bertha procura o virginal Rochester em seu quarto durante a noite e os dois chegam a manter relações sexuais. Rochester teve tempo suficiente com a doida antes do casamento para desconfiar que as coisas estavam erradas, coisa que no livro não aconteceu.
O casamento com Bertha e a permanência na América foram bem infernais para personagem, isso o livro já deixava bem claro. O problema é a forma o Rochester de Tara Bradley trabalha a questão. Ele é ignorado, desacatado por todo mundo, inclusive os escravos, é traído na cara dura pela louca da Bertha, e por aí vai. Quando tem um casinho rápido com uma escrava, uma situação consensual (*se é que se pode escrever algo assim sobre uma relação entre pessoas em situação tão desigual*), a ama-escrava de Bertha arma um ecândalo horroroso e ao invés de baixar “o Leôncio” em Rochester, o que temos é a personagem acuada. Assim, e depois tome longos capítulos mostrando a relação de Rochester com Céline – a atriz cabeça de vento prostituída desde a infância, Giacinta – a cortesã experiente e adepta do “sexo criativo”, e Klara – a loura submissa e fria na cama. Mas eu não larguei o livro... Foi um custo. Adèle – bebê e criança pequena – oferece algumas cenas interessantes, mas, no geral, essa parte do livro é intragável.
Como foi a leitura no tablet? No início apanhei um pouco, continuo preferindo o papel, mas ler no computador não é ruim. Nem sempre o índice ficava evidente, o registro era de “posições” e, não, de páginas. Assim, tudo isso dificultava um pouquinho. Mas há a possibilidade de buscar palavras e expressões, o Kindle permite associar o dicionário e consultar definições, com o acesso à internet eu podia pesquisar de imediato. É tudo muito prático e livros digitais economizam muito espaço, para dizer o mínimo. Depois disso, já peguei alguns livros para reler, mas tenho que me aperfeiçoar no uso do aparelho.
Recomendo este livro? Sinceramente? Só para fãs de Jane Eyre. Como escrevi, ele tem bons momentos, mas é tão desequilibrado, tão desnecessariamente longo e com tantas cenas de sexo de mau gosto, que sei lá. Não sei se a segunda parte do livro e algumas cenas da terceira compensam a primeira parte. E, claro, o livro deveria ser sobre Rochester e, não, sobre um monte de personagens originais, ou inventados pela autora...
1 pessoas comentaram:
Ola eu nao tenho posso possibilidade de comprar o livro na amazon poderia me enviar é que gostei da sua resenha
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