domingo, 29 de janeiro de 2012

Respondendo um E-Mail



Em 14 de janeiro, por causa desse post aqui, a Laís me enviou o seguinte e-mail (*coloquei o print aí em cima*):
Olah, Valéria

Eu tentei postar esse texto nos comentários, mas nãos sei porque não estou conseguindo, então aí vai:

realmente esse é um dos aspectos das HQs americanas que fez com que eu só me interessasse por quadrinhos quando descobri os mangás. Até mesmo o desequilibrio entre o número de personagens principais masculinos e femininos nos desenhos me irritava quando criança.


houve uma polêmica recente na página do Deviantart (comunidade artística online) da revista Ação Magazine (http://acaomagazinefan.deviantart.com/) a respeito de um concurso cujo tema era: "elfas peitudas". E eu gostaria muito de saber a sua opinião sobre isso, Valéria!


Obrigada,

Oo-de-Lali
Ponto 1: Não respondi o e-mail até hoje, porque estava mal na época, porque tinha uma conexão indigente e porque fiquei guardando para, talvez, fazer um post. Eu estou na comunidade da Ação Magazine no Facebook e acompanhei a fundação do grupo no Deviantart. Trata-se de um grupo fundado e gerenciado pelos fãs da revista e não é propriamente da revista. Isso precisa ficar claro, pois ainda que os editores e autor@s da Ação Magazine possam apoiar a comunidade, eles não são responsáveis pelo que se faz lá. Acredito que só fariam alguma intervenção se ela ameaçasse de alguma forma a publicação, a imagem da revista de uma forma muito explícita. Se qualquer forma, por desencargo de consciência, quando voltei para casa (*26/01*), perguntei direto ao Alexandre sobre essa história e ele confirmou o que eu já sabia: o concurso foi promovido pelos fãs.

Ponto 2: A segunda questão é o tal concurso em si. Realmente, não vejo graça nessa coisa das "elfas peitudas", mas há quem ache. Mulheres e meninas peitudas é algo que está cada vez mais presente nos materiais japoneses e não somente para garotos, mas em alguns shoujo/josei, também. Pegue a maioria dos mangás da Kayono e confirme. Com isso, não estou dizendo que a coisa em si não seja machista, porque ela é, mas que é uma questão – essa influência norte americana, esse fetiche por seios exagerados – muito presente no material que é produzido no Japão hoje. E aqui no Brasil, também. Vide o aumento espantoso das cirurgias de implante de silicone. Isso é fruto, na maioria dos casos, de uma cerência provocada por esse bombardeio de padrões de beleza irreais e mesmo alienígenas.

Ponto 3: Agora, uma das frases do texto do concurso é um problema: "A intenção verdadeira deste concurso é homenagear, de certa forma, a mulher em geral, sua feminilidade e sensualidade. Ao mesmo tempo, conhecer novos traços, usar a criatividade, e principalmente, entrar num clima de descontração.". Essa sentença parece reduzir "a mulher em geral" (*assim, porque isso existe, uma natureza única que faz com que nós mulheres a um modelo só*) na sua "feminilidade e sensualidade" à elfas peitudas é, sim, muito ofensivo. Acredito, mesmo que é fruto muito mais da imaturidade, do bombardeio de imagens das várias mídias, do que propriamente de uma necessidade de objetificar as mulheres. Mas, claro, isso está dado, está caracterizado no próprio concurso. E quem quiser que diga que sou uma chata por não achar graça nessa brincadeira toda, eu realmente não me importo.

Ponto 4: Mas vamos a algo muito importante. Não sei, Laís, se você é leitora da Ação Magazine e isso esteja incomodando muito você, isso te toque pessoalmente. Agora, a Ação Magazine, à princípio, foi pensada para um público masculino adolescente. Eles são o alvo, não as meninas. No entanto, se eles tiverem um número grande de leitoras que participem do fórum, que escrevam cartas, que mandem roteiros para os concursos, enfim, que não tenham medo de se expressar, duvido muito que a revista não vai se tornar mais elástica e que concursos ou brincadeiras como a da "elfa peituda" deixem de ser comuns mesmo entre os fãs da revista. Um dos problemas que a gente percebe, e isso não é culpa das mulheres, mas da cultura machista que tenta nos roubar a voz, nos dizendo das mais diferentes maneiras que o que temos a dizer não é importante, que devemos nos calar, é que as leitoras das revistas, dos blogs, as ouvintes dos podcasts raramente se manifestam. Daí, fica parecendo que nós não existimos como público, nesse caso, público consumidor, que dá dinheiro para a editora. Esse para mim é o ponto chave, conhecendo algumas pessoas que estão na direção da Ação Magazine, eu tenho certeza que eles não vão desprezar vocês. Eles querem atingir as leitoras, também, mas a gente precisa dizer o que deseja ler. Percebem? Ação positiva é participar mais desses círculos e possibilitar, talvez, uma mudança de mentalidade. É isso o que eu recomendo às leitoras da Ação Magazine que se sentirem incomodadas pelo concurso. Demonstrem a insatisfação, mas sem serem injustas com a revista ou perderem de vista que se trata de uma brincadeira, ela é ofensiva, mas é preciso fazer com que os sujeitos reflitam sobre isso, porque eles mesmos devem achar que estão fazendo um elogio à "mulher em geral" e "sua feminilidade e sensualidade".

Agora uma outra coisa, por conta de uma conversa que tive com o Alexandre no Twitter para esclarecer a coisa do concurso, o @Macotim começou a me mandar uma série de mensagens expressando o que ele achava do concurso. Sei que ele não fez por mal, mas parecia até que eu tinha escrito criticando o concurso, coisa que estou fazendo somente agora. Para melhor esclarecer, seguem as mensagens que ele me enviou (*comecem a ler de baixo para cima*):


Ponto 5: Só vou comentar um Twitt desses tantos, aquele em que o @Macotim coloca o seguinte ""escrever pra esclarecer o caso", pq? qual a diferença se o concurso fosse ideia do Lancaster ou dos leitores?". Bem, primeiro, eu preciso escrever porque a Laís me perguntou e porque você veio me bombardear desnecessariamente no Twitter. Isso me deu uma clareza maior do quanto os sujeitos não conseguem perceber que reduzir mulheres a peitos e bundas é um problema, e não importa quem começou com essa história. Quanto à diferença entre o concurso ser dos fãs ou da revista, oras, se uma revista que eu acompanho reduzisse as mulheres a peitos e bundas, eu realmente ficaria aborrecida e largaria de comprá-la, além, claro, de escrever um post enorme aqui e em outros lugares falando do assunto. Resumindo, seria como virar as costas para as mulheres, admitir publicamente que essa bobagem de "elfas peitudas" é engraçado, ou seja, seria péssimo para a imagem da revista. Será que se o concurso fosse sobre "elfos pintudos" ou sobre formar casais yaoi com as personagens da revista seria engraçado da mesma forma? Duvido. Mas, sendo coisa dos fãs, é relevável, ser coisa da revista é falta de profissionalismo e visão de mercado. Mas não foi coisa da revista, então, não faz sentido fazer tempestade em copo d'água por isso.

8 pessoas comentaram:

Sempre leio os posts do Shoujo Café, porém não tenho o hábito de comentar (coisa que devo mudar), mas como gosto muito de shonen, me coloquei no lugar da autora do e-mail e foi inevitável escrever... As mulheres que são leitoras da revista não podem demonstrar e justificar o motivo de não ter gostado da brincadeira, só porque o público alvo são os garotos?
Ficou claro que a iniciativa não partiu da revista, mas é necessário que os leitores entendam que faz toda a diferença saber deste detalhe (o que poderia fazer muitas leitoras descontentes pararem de comprar) e se possível refletirem um pouco sobre o assunto. Achei ótimo a Valéria dizer que talvez não fosse engraçado para os meninos, um concurso sobre "Elfos pintudos" ou "Casais Yaoi"... Foi uma forma prática de colocá-los no lugar das leitoras.

Parabéns pelo blog, Valéria.
Marcella M./Campinas-SP

Pois é, Marcella, obrigada pelo feedback. O que eu acho é que as meninas que lêem precisam mostrar que existem. Participar das comunidades, reclamar lá, mostrarem que esse tipo de abordagem não está agradando. Calar é que é o problema.

Achei interessantes os twits do menino, numa defensiva de quem entende plenamente como e porquê aquilo é ofensivo. Se realmente percebesse como inocente não tinha se preocupado tanto...

Ah, garotos!
Sonham tanto com peitos e bundas, que acabam fazento todos acreditar que só isso importa!
Até as mulheres se deixam enganar, a acabam investindo tempo, dinheiro e arriscando a própria saúde para desenvolver esses "atributos".
Chega a ser irônico que uma das minhas personagens preferidas seja a Nielle, de Holy Avenger, reconhecida de longe pela sua "comissão de frente"; ainda assim, era a personalidade dela, alegre, expansiva, carinhosa e leal que me cativaram. Além de ser poderosa e super bem resolvida.
Infelizmente, sei que ela não é popular entre os garotos por causa dessas qualidades.
Infelizmente, também, como bem mencionado no post, o público alvo da revista é jovem, masculino, e naturalmente imaturo (por causa da pouca idade), e tende a repetir padrões, a "ir na onda".
Se as garotas não se manifestarem, eles nunca vão sequer desconfiar que podem estar perdendo pontos com a mulherada por causa desse comportamento.

Vou postar aqui tb o comentário que fiz no facebook, acho que é pertinente e bobagem ficar só lá. ^^

Sobre isso de nós leitoras nos manifestarmos mesmo quando a publicação não é direcionada para nós, lembro de quando eu tinha 14 anos e comprava uma revista de video game que era muito machista, eles usavam termos desnecessários que objetificavam as mulheres, bem do tipo "a peituda", "a gostosa", e falavam que tal jogo era bonitinho e fácil, bom pra crianças e mulheres... essas coisas. Eu fiquei revoltada e mandei uma carta reclamando, dizendo que eles tb tinham leitoras e que merecíamos respeito. Eles chegaram a publicar minha carta dizendo que, obviamente, não tinham nada além de profundo respeito pelas mulheres, mas acontecia que meninas como eu, gamers, eram a minoria. De qualquer forma, depois disso a revista começou a pegar mais leve, não sei se realmente minha reclamação teve algo a ver. Mas acabou que logo ela foi cancelada. =P Mas d equalquer maneira, quero só ilustrar que concordo com a Valéria, e se nos sentimos incomodadas devemos nos manifestar. Apesar de que, hj em dia eu faça isso bem menos do que quando era adolescente, shame on me!

ótimo post Valéria, concordo integralmente com tudo que expôs.

Aliás, foi graças ao Shoujo Café que tive conhecimento do movimento nos EUA das leitoras de DC e Marvel em relação a este tema polêmico, e infelizmente fui mal interpretada por meus amigos que entendem que nós mulheres para darmos o troco temos de adentrar tais revistas como roteiristas/desenhistas/etc e sexualizar os homens... ou seja, instaurar uma guerra de sexos. Sem contar que os comentários beiraram o absurdo culpando o mercado, que as mulheres é que tem de buscar seu espaço, blablabla...

Olha, com todo respeito a quem pensa assim, mas só porque os homens estão dirigindo ou focam público masculino isso NÃO DÁ DIREITO a ofenderem as mulheres!! Se fossem nazistas eles poderiam fazer piadas racistas só porque estão liderando revistas?!

Mas de fato, temos de nos mover E ENQUANTO a indústria de revistas em quadrinhos brasileiras está no começo e mostrarmos que somos a maioria e é bom ter cuidado [XD] Não vamos mais engolir pornografia disfarçada por censura etária! Se é pornográfico é e pronto, se é voltado a determinado público e não tende ao pornográfico NÃO deve usar a mulher como objeto e pronto!
é o que penso.
[e depois deste post... vou começar a dar uma passadinha nesse grupo e também dar checadas no Ação Magazine, mesmo que nada tenha haver e eu respeite muito o trabalho do Lancaster, o admiro muito na verdade]

É veru, Valéria, temos de estar presentes e representar bem nossa posição na sociedade [claro, que é o mesmo que assumir uma briga e tanto><].

"Mudar leis é fácil... Mudar idéias humanas é o complexo."

Wow...sua explanação do assunto foi irretocável, Valéria!
Eu também penso como vc,por mais que uma determinada mídia seja direcionada a um público alvo,isso não significa que ela ficará APENAS entre este público, cabe ai uma boa dose de bom senso, mesmo pra não espantar qualquer público extra que a revista poderia angariar.
Particularmente, não acho ruim que se façam mulheres voluptuosas, mas deve haver mais na personagem que somente peitos e bunda/coxas. Se SÓ tem isso não é mulher; é um chester!!

PS: fiquei perplexa com a resposta esperneante do 'menino'! Me fez lembrar da infância, de quando meu primo se jogava no chão, cheio de birra porque não queria que eu brincasse com os Comandos em Ação dele! Me espanta ver como as pessoas esperneiam ainda hoje!!
Conseguiram me afastar da ideia de comprar a revista.

Onçana, o concurso não é da revista, mas dos fãs da revista. A Ação Magazine não é responsável por ele, entende.

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