Na quarta-feira, eu fui assistir o longa-metragem dinamarquês que ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro chamado Hævnen ou In a Better World (Em um Mundo Melhor). Curiosamente, “Hævnen” – plural de “hævn” – significa vinganças. Eu estava tentando fazer analogias com o inglês e imaginei que poderia ser o mesmo que “Heaven”, Céu/Paraíso em um sentido religioso... Muito curioso, porque, apesar de ter ido ao cinema achando que veria um filme sobre bullying, o que assisti foi um filme sobre vingança (s) e perdão, um filme sobre cura interior, um filme sobre família. E Hævnen é muito bonito, muito bem dirigido, e em alguns momentos me deixou em uma angústia profunda, já que descemos ao inferno e eu tinha medo que ficássemos por lá... Mas não foi bem assim.
É preciso pontuar, também, que a cada ano, toda vez que o Brasil indica um filme medíocre à seleção do Oscar, alguns críticos estrelinhas vêm com aquela ladainha de “os americanos gostam de filmes com criancinhas”, para justificar nossa própria incompetência ou as máfias que impedem que bons filmes nacionais sejam indicados. Pois bem, quem for ver Hævnen com essa idéia imbecil na cabeça, achando que é a mesma coisa que um fraquinho O Ano que Meus Pais Saíram em Viagem de Férias (*a versão drama piegas e cheio de inconsistências com criancinha que o comitê brasileiro indicou anos atrás*) não vai encontrar o que espera. Ter crianças não torna Hævnen um dramalhão choroso, ou um filme “fofo”, muito longe disso, é um filme que discute questões éticas profundas e o protagonista, apesar do grande tempo de exposição dos dois meninos – Christian (Markus Rygaard) e Elias (Markus Rygaard ) – em tela, é Anton (Mikael Persbrandt), um médico que trabalha em Darfur, no Sudão, quase uma sucursal do inferno aqui na Terra.
A história básica do filme é a seguinte: Anton é um médico sueco que trabalha em um campo de refugiados no Sudão. Além dos problemas cotidianos – falta de recursos, uma quantidade enorme de pessoas a serem atendidas, a miséria circundante, a falta de esperança – ele volta e meia recebe uma mulher grávida que teve seu ventre aberto à faca, pois o senhor da guerra local costuma apostar com seus capangas qual é o sexo da criança e abrir o ventre da gestante para comprovar se acertou, ou não. Em casa, na Dinamarca, seu casamento está desmoronando, pois ele cometeu adultério e sua esposa Marianne, também médica, não consegue perdoá-lo. Seu filho mais velho, Elias, é um garoto afetuoso e inteligente, mas sofre bullying na escola e os educadores parecem não ter nenhuma vontade de resolver a questão. É aí que a vida dessa família se cruza com a de Christian, um menino que acabou de perder a mãe de câncer em Londres e tem muita dificuldade em superar a questão. De volta à Dinamarca com o pai, Christian se torna o melhor amigo de Elias e uma espécie de “anjo vingador”. Já Anton acaba se deparando com uma situação das mais terríveis, quando o senhor da guerra aparece em seu hospital de campanha precisando de sérios cuidados médicos. Atendê-lo? Deixá-lo morrer? Qual deve ser a decisão do médico?
Hævnen começa no Sudão e com Anton, o médico sueco. Como escrevi lá no primeiro parágrafo, ele é indubitavelmente o protagonista. Basta olhar o trailer. E não tive como não simpatizar com ele. É o tipo de sujeito que, sem recorrer em nenhum momento a qualquer fala religiosa, exercita os valores cristãos até o seu limite ou simplesmente é ético e busca agir com cordialidade até o limite das suas forças. Por conta disso, a agressão que sofre na Dinamarca, onde é discriminado por um sujeito truculento por ser sueco, em nada se compara à violência que ele vê cotidianamente no Sudão. Ele levou dois tapas na cara e um empurrão, porque foi apartar uma briga entre seu filho caçula – um garotinho muito fofinho – e um outro menininho. O pai da outra criança simplesmente bate em Anton, porque “encostou” em seu filho, e depois espanca o filho na frente de todo mundo, porque o garoto “sempre arruma briga”. Exemplo vem de casa, não é mesmo?
Anton deveria ter chamado a polícia pelo menos, ao não fazer isso, ele se diminui ainda mais diante dos filhos e de Christian e abre espaço para que os meninos queiram se vingar do valentão. Naquele momento não colou muito a desculpa de que por não se zangar, por não retribuir de forma violenta, ele na verdade venceu. Pode ser muito evoluído, eu posso entender o argumento, mas é muito complicado para meninos de 12 anos, especialmente quando um deles sofria bullying regularmente. O que o pai estava pedindo então era que Elias continuasse se deixando espancar estoicamente todos os dias? Complicado... E o menino diz que se o pai se comportasse de forma mais máscula, sua mãe iria gostar... Apesar dos sorrisos, foi uma seqüência muito tensa.
Escrevi “sofria bullying”, porque neste momento a coisa já estava resolvida. Quando começa o filme, até sugestionada pelos resumos mal escritos, eu acreditei que os pais eram ausentes e não percebiam que o filho sofria bullying. Lembrei do menino Zangieff, e, por sentir simpatia por Anton, senti antipatia imediata por Marianne (Trine Dyrholm), a esposa que não perdoa a traição (*ainda não sabia o motivo do divórcio neste momento*), como se ela não percebesse o sofrimento do filho. Os dois percebem, os dois são presentes, os dois vão até a escola, mas a escola é negligente. Não sei se aquilo é um retrato “fiel”, mas foram os profissionais da educação mais imbecis que já vi na ficção. Eles sabem que Elias é agredido, que seu pneu de bicicleta é esvaziado e/ou rasgado todos os dias, mas culpam o menino por ser anti-social, seus pais por estarem se separando, e argumentam que não há provas contra o agente das agressões, um moleque grandalhão que tem uma gangue (*achei curioso que em dinamarquês parece ser “mafia” a palavra aplicada*).
O drama de Elias parece não ter fim, salvo se os pais o mudarem de escola, algo que cogitam, até que Christian chega. Christian vem com o pai, Claus (Ulrich Thomsen), de Londres para morar com a avó depois da perda da mãe. Ele parece maduro e responsável, mas, na verdade, é um menininho cheio de ódio e que não conseguiu colocar para fora o sofrimento pela perda da mãe. Mas na escola, ele resolve rapidinho o problema do bullying, afinal, como ele bem coloca para o pai, se ele deixasse o aprendiz de marginal local bater nele uma segunda vez, iria apanhar todos os dias. Levando-se em consideração a equipe de educadores locais, seria assim mesmo. E eu não tive como não simpatizar com ele. Christian é tão pequeno quanto Elias, mas pega o chefão da gangue sozinho e lhe dá uma surra para valer com a bomba da bicicleta. E ainda o ameaça com uma faca. Pronto!
Curiosamente, a polícia é chamada e arma-se um circo. Mas tanto Christian quanto Elias ficam firmes e não entregam um ao outro. Nasce a amizade entre os dois. A faca fora escondida e tudo termina sendo tratado como um incidente infeliz. O grandalhão que espancava os meninos nunca mais encosta a mão neles e tudo parece bem, até que percebemos que Christian se vê como um “anjo vingador”. E, na sua sanha de vingança, seu desejo de fazer com que os maus sejam punidos, ele leva as coisas até as últimas conseqüências. Por conta disso, depois do incidente com Anton, ele arrasta Elias para uma aventura criminosa – explodir a van do sujeito que estapeou seu pai – que dá o tom do final do filme.
E então temos o inferno absoluto. No Sudão, Anton tem que lidar com o senhor da guerra e tomar uma atitude drástica da qual não consegue se envergonhar, enquanto Elias, pela internet, tenta avisar ao pai do perigo que corre. Já a relação de Christian com seu pai, vai de mal a pior, pois o menino o culpa pela morte da mãe, por ter desistido, por desejar que ela morresse (*para não sofrer mais*). Sinceramente? Eu não consigo lamentar o fim do senhor da guerra. E vou dar o spoiler dessa parte, quem quiser pode saltar para o próximo parágrafo. Enfim, por respeito a Anton, tanto a equipe médica, quanto os refugiados, aceitam que o senhor da guerra seja tratado. O homem estava com uma das pernas quase perdida, cheia de bichos. O médico sueco diz que é seu dever tratá-lo, mas se recusa a confraternizar e expulsa os homens armados do hospital. Quando o monstro está podendo andar de muletas, ele vai até a área onde são feitas as cirurgias e vê uma menina – 11, 12 anos no máximo – que acabou de morrer. Anton está muito abalado, mais que de costume, e o bandido comenta “big knife, small pussy”. Não sei se isso quer dizer que a menina foi estuprada ou era uma sugestão do marginal, porque ele diz para o médico que um de seus capangas poderia gostar de brincar com o cadáver... Enfim, Anton perde o controle e retira a sua “proteção”. O sujeito é linchado pela multidão. Anton se sente culpado por não se sentir culpado... Ele é um sujeito realmente muito evoluído e a julgar pela matéria que a Record mostrou sobre a Suécia, talvez os suecos sejam assim mesmo, ou o país fique em um universo paralelo. Eu sou solidária com a personagem, ele levou seu senso de dever e ética até o limite. Só que, exatamente por conta disso, ele não conseguiu falar com o filho na véspera da grande besteira que ele e Christian iriam fazer.
Antes do fim, volto para Marianne. Ela é a única personagem feminina importante do filme, já que a mãe de Christian está morta, a avó do menino mal tem falas, e o mesmo vale para a professora, a diretora, as enfermeiras. Se eles, ou alguma delas têm nome, eu não saberia lembrar, mas de Marianne é impossível esquecer. Eu a julguei mal, achei que ela fosse uma mãe alienada ou ausente. Isso não é verdade. Ela se comunica muito melhor com o filho caçula, ainda uma criança pequena, mas não com o filho pré-adolescente. Talvez a razão disso é o fato dela ser explosiva. Quando confrontada com os professores de Elias, ela quase voa no pescoço deles, já Anton é o conciliador. Quando ela encontra a faca nas coisas do filho, ela vai direto à casa de Christian. Elias tem medo do que a mãe pode fazer, já que ela vai direto ao ponto, sem rodeios, e não é mansa e tranqüila como o pai. E, sim, o menino lamenta que ela não perdoe o pai. O caso da traição é só mencionado. Não se diz quando, ou com qual tempo, Anton traiu a mulher. E, bem, por mais simpático que Anton, a personagem, possa ser, traição é algo sério e perdoar não deve ser nada fácil, ainda que, desde o início, fique claro que eles se amam e se amam muito. Retornando ao ponto, Marianne é uma das personagens mais ricas do filme.
Para terminar, eu repito que o filme te leva ao inferno, seja ele no Sudão, na Dinamarca, ou dentro da cada uma das personagens, mas traz a gente de volta em segurança. Temi pelo final de Christian e de Anton principalmente na parte final do filme, e, pelo menos para mim que valorizo a redenção, Hævnen foi muito melhor do que o esperado. Se o nome do filme é “Vinganças”, no final prevalece o “Perdão”, e isso depois de quase tudo ser colocado a perder. A diretora, Susanne Bier, dirigiu muito bem os atores, especialmente as crianças. Salvo pelos professores muito babacas, o filme é muito crível e mostra que a barbárie pode estar em qualquer lugar, não somente em lugares sabidamente terríveis como Darfur. É também um filme que fala sobre a família, de como é necessário diálogo, de como a internet e os games violentos podem ser a saída para muitos adolescentes que sofrem. E veja que eles não são culpados pelo comportamento do menino Christian, só são sintoma da sua angústia e solidão. É na internet que ele compra a faca, que aprende a fazer a bomba... O filme também mostra que os filhos podem errar mesmo quando têm pais amorosos, como Anton e Marianne, simplesmente, porque isso pode, sim, acontecer, mas que quando os valores e exemplos são sólidos, a perda nunca será total. Quem assistir o filme irá entender do que eu estou falando. E recomendo muito Hævnen ou Em um Mundo Melhor, porque o nome internacional nem é tão ruim assim, pois a mensagem é que podemos tornar o mundo um pouco melhor com nossas ações individuais, ainda que não sejamos tão bons e evoluídos quanto o Anton.
É preciso pontuar, também, que a cada ano, toda vez que o Brasil indica um filme medíocre à seleção do Oscar, alguns críticos estrelinhas vêm com aquela ladainha de “os americanos gostam de filmes com criancinhas”, para justificar nossa própria incompetência ou as máfias que impedem que bons filmes nacionais sejam indicados. Pois bem, quem for ver Hævnen com essa idéia imbecil na cabeça, achando que é a mesma coisa que um fraquinho O Ano que Meus Pais Saíram em Viagem de Férias (*a versão drama piegas e cheio de inconsistências com criancinha que o comitê brasileiro indicou anos atrás*) não vai encontrar o que espera. Ter crianças não torna Hævnen um dramalhão choroso, ou um filme “fofo”, muito longe disso, é um filme que discute questões éticas profundas e o protagonista, apesar do grande tempo de exposição dos dois meninos – Christian (Markus Rygaard) e Elias (Markus Rygaard ) – em tela, é Anton (Mikael Persbrandt), um médico que trabalha em Darfur, no Sudão, quase uma sucursal do inferno aqui na Terra.
A história básica do filme é a seguinte: Anton é um médico sueco que trabalha em um campo de refugiados no Sudão. Além dos problemas cotidianos – falta de recursos, uma quantidade enorme de pessoas a serem atendidas, a miséria circundante, a falta de esperança – ele volta e meia recebe uma mulher grávida que teve seu ventre aberto à faca, pois o senhor da guerra local costuma apostar com seus capangas qual é o sexo da criança e abrir o ventre da gestante para comprovar se acertou, ou não. Em casa, na Dinamarca, seu casamento está desmoronando, pois ele cometeu adultério e sua esposa Marianne, também médica, não consegue perdoá-lo. Seu filho mais velho, Elias, é um garoto afetuoso e inteligente, mas sofre bullying na escola e os educadores parecem não ter nenhuma vontade de resolver a questão. É aí que a vida dessa família se cruza com a de Christian, um menino que acabou de perder a mãe de câncer em Londres e tem muita dificuldade em superar a questão. De volta à Dinamarca com o pai, Christian se torna o melhor amigo de Elias e uma espécie de “anjo vingador”. Já Anton acaba se deparando com uma situação das mais terríveis, quando o senhor da guerra aparece em seu hospital de campanha precisando de sérios cuidados médicos. Atendê-lo? Deixá-lo morrer? Qual deve ser a decisão do médico?
Hævnen começa no Sudão e com Anton, o médico sueco. Como escrevi lá no primeiro parágrafo, ele é indubitavelmente o protagonista. Basta olhar o trailer. E não tive como não simpatizar com ele. É o tipo de sujeito que, sem recorrer em nenhum momento a qualquer fala religiosa, exercita os valores cristãos até o seu limite ou simplesmente é ético e busca agir com cordialidade até o limite das suas forças. Por conta disso, a agressão que sofre na Dinamarca, onde é discriminado por um sujeito truculento por ser sueco, em nada se compara à violência que ele vê cotidianamente no Sudão. Ele levou dois tapas na cara e um empurrão, porque foi apartar uma briga entre seu filho caçula – um garotinho muito fofinho – e um outro menininho. O pai da outra criança simplesmente bate em Anton, porque “encostou” em seu filho, e depois espanca o filho na frente de todo mundo, porque o garoto “sempre arruma briga”. Exemplo vem de casa, não é mesmo?
Anton deveria ter chamado a polícia pelo menos, ao não fazer isso, ele se diminui ainda mais diante dos filhos e de Christian e abre espaço para que os meninos queiram se vingar do valentão. Naquele momento não colou muito a desculpa de que por não se zangar, por não retribuir de forma violenta, ele na verdade venceu. Pode ser muito evoluído, eu posso entender o argumento, mas é muito complicado para meninos de 12 anos, especialmente quando um deles sofria bullying regularmente. O que o pai estava pedindo então era que Elias continuasse se deixando espancar estoicamente todos os dias? Complicado... E o menino diz que se o pai se comportasse de forma mais máscula, sua mãe iria gostar... Apesar dos sorrisos, foi uma seqüência muito tensa.
Escrevi “sofria bullying”, porque neste momento a coisa já estava resolvida. Quando começa o filme, até sugestionada pelos resumos mal escritos, eu acreditei que os pais eram ausentes e não percebiam que o filho sofria bullying. Lembrei do menino Zangieff, e, por sentir simpatia por Anton, senti antipatia imediata por Marianne (Trine Dyrholm), a esposa que não perdoa a traição (*ainda não sabia o motivo do divórcio neste momento*), como se ela não percebesse o sofrimento do filho. Os dois percebem, os dois são presentes, os dois vão até a escola, mas a escola é negligente. Não sei se aquilo é um retrato “fiel”, mas foram os profissionais da educação mais imbecis que já vi na ficção. Eles sabem que Elias é agredido, que seu pneu de bicicleta é esvaziado e/ou rasgado todos os dias, mas culpam o menino por ser anti-social, seus pais por estarem se separando, e argumentam que não há provas contra o agente das agressões, um moleque grandalhão que tem uma gangue (*achei curioso que em dinamarquês parece ser “mafia” a palavra aplicada*).
O drama de Elias parece não ter fim, salvo se os pais o mudarem de escola, algo que cogitam, até que Christian chega. Christian vem com o pai, Claus (Ulrich Thomsen), de Londres para morar com a avó depois da perda da mãe. Ele parece maduro e responsável, mas, na verdade, é um menininho cheio de ódio e que não conseguiu colocar para fora o sofrimento pela perda da mãe. Mas na escola, ele resolve rapidinho o problema do bullying, afinal, como ele bem coloca para o pai, se ele deixasse o aprendiz de marginal local bater nele uma segunda vez, iria apanhar todos os dias. Levando-se em consideração a equipe de educadores locais, seria assim mesmo. E eu não tive como não simpatizar com ele. Christian é tão pequeno quanto Elias, mas pega o chefão da gangue sozinho e lhe dá uma surra para valer com a bomba da bicicleta. E ainda o ameaça com uma faca. Pronto!
Curiosamente, a polícia é chamada e arma-se um circo. Mas tanto Christian quanto Elias ficam firmes e não entregam um ao outro. Nasce a amizade entre os dois. A faca fora escondida e tudo termina sendo tratado como um incidente infeliz. O grandalhão que espancava os meninos nunca mais encosta a mão neles e tudo parece bem, até que percebemos que Christian se vê como um “anjo vingador”. E, na sua sanha de vingança, seu desejo de fazer com que os maus sejam punidos, ele leva as coisas até as últimas conseqüências. Por conta disso, depois do incidente com Anton, ele arrasta Elias para uma aventura criminosa – explodir a van do sujeito que estapeou seu pai – que dá o tom do final do filme.
E então temos o inferno absoluto. No Sudão, Anton tem que lidar com o senhor da guerra e tomar uma atitude drástica da qual não consegue se envergonhar, enquanto Elias, pela internet, tenta avisar ao pai do perigo que corre. Já a relação de Christian com seu pai, vai de mal a pior, pois o menino o culpa pela morte da mãe, por ter desistido, por desejar que ela morresse (*para não sofrer mais*). Sinceramente? Eu não consigo lamentar o fim do senhor da guerra. E vou dar o spoiler dessa parte, quem quiser pode saltar para o próximo parágrafo. Enfim, por respeito a Anton, tanto a equipe médica, quanto os refugiados, aceitam que o senhor da guerra seja tratado. O homem estava com uma das pernas quase perdida, cheia de bichos. O médico sueco diz que é seu dever tratá-lo, mas se recusa a confraternizar e expulsa os homens armados do hospital. Quando o monstro está podendo andar de muletas, ele vai até a área onde são feitas as cirurgias e vê uma menina – 11, 12 anos no máximo – que acabou de morrer. Anton está muito abalado, mais que de costume, e o bandido comenta “big knife, small pussy”. Não sei se isso quer dizer que a menina foi estuprada ou era uma sugestão do marginal, porque ele diz para o médico que um de seus capangas poderia gostar de brincar com o cadáver... Enfim, Anton perde o controle e retira a sua “proteção”. O sujeito é linchado pela multidão. Anton se sente culpado por não se sentir culpado... Ele é um sujeito realmente muito evoluído e a julgar pela matéria que a Record mostrou sobre a Suécia, talvez os suecos sejam assim mesmo, ou o país fique em um universo paralelo. Eu sou solidária com a personagem, ele levou seu senso de dever e ética até o limite. Só que, exatamente por conta disso, ele não conseguiu falar com o filho na véspera da grande besteira que ele e Christian iriam fazer.
Antes do fim, volto para Marianne. Ela é a única personagem feminina importante do filme, já que a mãe de Christian está morta, a avó do menino mal tem falas, e o mesmo vale para a professora, a diretora, as enfermeiras. Se eles, ou alguma delas têm nome, eu não saberia lembrar, mas de Marianne é impossível esquecer. Eu a julguei mal, achei que ela fosse uma mãe alienada ou ausente. Isso não é verdade. Ela se comunica muito melhor com o filho caçula, ainda uma criança pequena, mas não com o filho pré-adolescente. Talvez a razão disso é o fato dela ser explosiva. Quando confrontada com os professores de Elias, ela quase voa no pescoço deles, já Anton é o conciliador. Quando ela encontra a faca nas coisas do filho, ela vai direto à casa de Christian. Elias tem medo do que a mãe pode fazer, já que ela vai direto ao ponto, sem rodeios, e não é mansa e tranqüila como o pai. E, sim, o menino lamenta que ela não perdoe o pai. O caso da traição é só mencionado. Não se diz quando, ou com qual tempo, Anton traiu a mulher. E, bem, por mais simpático que Anton, a personagem, possa ser, traição é algo sério e perdoar não deve ser nada fácil, ainda que, desde o início, fique claro que eles se amam e se amam muito. Retornando ao ponto, Marianne é uma das personagens mais ricas do filme.
Para terminar, eu repito que o filme te leva ao inferno, seja ele no Sudão, na Dinamarca, ou dentro da cada uma das personagens, mas traz a gente de volta em segurança. Temi pelo final de Christian e de Anton principalmente na parte final do filme, e, pelo menos para mim que valorizo a redenção, Hævnen foi muito melhor do que o esperado. Se o nome do filme é “Vinganças”, no final prevalece o “Perdão”, e isso depois de quase tudo ser colocado a perder. A diretora, Susanne Bier, dirigiu muito bem os atores, especialmente as crianças. Salvo pelos professores muito babacas, o filme é muito crível e mostra que a barbárie pode estar em qualquer lugar, não somente em lugares sabidamente terríveis como Darfur. É também um filme que fala sobre a família, de como é necessário diálogo, de como a internet e os games violentos podem ser a saída para muitos adolescentes que sofrem. E veja que eles não são culpados pelo comportamento do menino Christian, só são sintoma da sua angústia e solidão. É na internet que ele compra a faca, que aprende a fazer a bomba... O filme também mostra que os filhos podem errar mesmo quando têm pais amorosos, como Anton e Marianne, simplesmente, porque isso pode, sim, acontecer, mas que quando os valores e exemplos são sólidos, a perda nunca será total. Quem assistir o filme irá entender do que eu estou falando. E recomendo muito Hævnen ou Em um Mundo Melhor, porque o nome internacional nem é tão ruim assim, pois a mensagem é que podemos tornar o mundo um pouco melhor com nossas ações individuais, ainda que não sejamos tão bons e evoluídos quanto o Anton.
0 pessoas comentaram:
Postar um comentário