sábado, 18 de dezembro de 2010

Comentando o filme O Garoto de Liverpool



Hoje, finalmente assisti o filme inglês Nowhere Boy, aqui no Brasil, O Garoto de Liverpool. O filme cobre parte da adolescência de John Lennon, o início de sua carreira musical, e trata da influência poderosa de duas mulheres em sua formação, Julia, a mãe que não o criou, mas que estimulou seu talento musical o quanto pode, e Mimi, a tia disciplinadora que o educou e, muitas vezes, não soube expressar todo o amor que sentia pelo sobrinho-filho. Eu gosto da música dos Beatles, mas não sei praticamente nada sobre a vida dos membros do grupo, não sou fã de nenhum deles em especial e não fico deprimida a cada aniversário de morte de Lennon, como meu marido. Para vocês terem uma idéia, minha maior referência sobre o início da carreira do grupo é outro filme, Os Cinco Rapazes de Liverpool... Lembro que quando o Stu morreu, fiquei arrasada. Enfim, mas eu me interessei pelo filme logo que fiquei sabendo dele, e não me decepcionei. As interpretações foram convincentes (*tanto Kristin Scott Thomas, como Anne-Marie Duff, foram indicadas ao BAFTA – o equivalente inglês do Oscar – de atriz coadjuvante*), em alguns momentos o filme comove e faz pensar, há algumas referências ao futuro dos Beatles que até uma nulidade em música como eu é capaz de perceber (*devo ter perdido várias*), e a trilha sonora é nota dez. Mas vamos comentar...

O protagonista do filme é Aaron Perry Johnson, o garoto de Kick-Ass. E, sim, ele me convenceu de que é um grande ator, já que ele está totalmente diferente do nerd que quer ser super herói. Espero que tenha um futuro cheio de papéis importantes e interessantes pela frente. Ele não carrega o filme nas costas, afinal, ele está contracenando com Kristin Scott Thomas, mas ele está brilhante como Lennon, ou melhor dizendo, já que eu não sei bem como Lennon era, como o adolescente brilhante, inconformado, destrutivo em alguns momentos, e que quer fazer as pazes com seu passado. Quem foi seu pai? Por que sua mãe biológica não o criou? Será que os flashes que ele tem de sua infância remota e seus pesadelos querem dizer alguma coisa? E, quando tudo se explica, quando toda a roupa suja é lavada, o filme coloca na boca do rapaz uma fala que, talvez, só pudesse ser usada pelo Lennon mais velho, algo do gênero “De que vale perder tempo tentando odiar a quem amamos tanto”?

O outro destaque do filme, claro, é Kristin Scott Thomas como Mimi, a tia que criou o rapaz. E o filme – que usou as memórias da irmã de Lennon – coloca Mimi como a responsável por ter dado a primeira guitarra ao rapaz. Há uma controvérsia em torno disso, e a Wikipedia – que concorda em quase tudo com o filme – diz que foi a mãe de Lennon quem lhe deu o instrumento. No filme, ela o ensina a tocar banjo. Mimi encarna uma mulher forte, rígida, que tenta a todo custo conter seus sentimentos. A seqüência da morte do marido, o querido tio de Lennon, é que desenha a personalidade da personagem para a platéia. Mimi parece dura, insensível, mas só é contida, e ama muito o rapaz. E, como eu disse, o filme está mais a favor dela do que da mãe de Lennon, Julia.

Anne-Marie Duff interpreta a mãe de Lennon, uma mulher avançada demais para a sua época e pintada, de certa forma, como leviana. Afinal, ela “abandonou” o filho (*parece que na vida real, Mimi denunciou a irmã para a assistência social*) e o filme, através de Mimi, a culpa pelo fracasso de seu casamento. Julia, no entanto, é a grande incentivadora do talento de Lennon e quem mais torce pelo rapaz. A personagem oscila entre a euforia e a depressão. Outra surpresa foi ver Thomas Brodie Sangster no filme. Dia desses estava me perguntando por aonde andaria o menininho talentoso de Nanny McPhee e A Última Legião. Pois é, ele continua talentoso, ainda com físico de adolescente (*ainda dá para saber se será um homem bonito ou não*) e faz Paul McCartney no filme. Uma das boas coisas de Nowhere Boy é investir uns bons minutos do filme em mostrar a na amizade de Lennon e Paul. Eu realmente não sei se o filme foi fiel, mas a representação do estabelecimento da amizade entre os adolescentes me pareceu muito bem construída.

Pontos fracos? Bem, achei o menino Paul McCartney muito maduro para os seus 15 anos (*é a idade quando ele aparece em tela*). Talvez por não saber quase nada da vida dele, esteja julgando mal, mas se ele realmente era próximo daquilo, era um sujeito muito centrado e bom conselheiro, especialmente quando Lennon parecia ser o inverso. É interessante a cena na qual Lennon diz que Paul não tem cara de músico de rock e ele retruca com algo como “Porque não saio por aí fazendo besteira? Não me visto de forma XXX? A mim interessa a música. Esse é o meu negócio”. Se mais artistas pensassem desse jeito... Agora, o que me incomodou foi o tom incestuoso da relação entre Lennon e a mãe. A coisa era tão explícita, as provocações da mulher madura (*e quase uma estranha no filme*) em relação ao adolescente. Corta-se de uma cena de intimidade entre mãe e constrangido filho no sofá, para Lennon fazendo sexo com uma namoradinha no parque... não poderia ser mais escancarado ou a classificação indicativa do filme ia subir para 18 anos. E o ciúme de Lennon se derrama para cima de Paul, que é, também, assediado pela mãe do protagonista. O filme é dúbio em relação ao assédio de Julia à Paul, que é um cavalheiro, afinal, ela é muito pouco convencional, mas a sugestão de incesto é real, sem outra possibilidade de interpretação a meu ver. Acho que foi desnecessário. Poderiam ter mostrado mais o quanto era repressora a educação inglesa, assim, a revolta de Lennon em relação à escola ficaria mais bem ilustrada. Há castigos corporais, mas eles não são mostrados, ficam somente subentendidos. Aliás, sendo tão mal aluno, como é que Lennon conseguiu ir para a faculdade?

O filme termina com a ida dos Beatles para Hamburgo. Assim, só três Beatles aparecem, John, Paul, e George. O menino que faz George Harrison aparece muito pouco. Aliás, eu sempre achei o George o Beatle mais bonito... e o menino que escolheram é feinho toda a vida. Também me surpreendi em um determinado momento... Se conhecesse a biografia de Lennon não tomaria o susto. Enfim, não posso comentar, ou seria um grande spolier. Também não sei se Paul realmente ensinou o Lennon a tocar guitarra. Meu marido, que sabe muito mais de Beatles que eu, diz que tinha lido o contrário.

É isso, gostei muito do filme. A crítica eu tinha lido na Folha de São Paulo (*não vou procurar o filme, mas recomendo a crítica do Cabine Celular*), tinha dito que o filme era morno, lento, e um monte de outras coisas desabonadoras. Eu discordo, é um belo filme, com grandes interpretações e que, a meu ver, ajudou a mostrar o grande talento de Aaron Perry Johnson. A trilha sonora também ajudou bastante e o tema musical do filme é muito marcante. Pena que tão pouca gente deve assistir. Minha sala, hoje, estava quase vazia. Eram somente onze pessoas comigo. Aqui em Brasília o filme está há três semanas em cartaz. Eu achava que não ia durar tanto. Sorte minha que fui assistir. Meu marido ficou me enrolando, dizendo que iria junto e, na hora H, deu para trás. Disse que iria ficar deprimido... Eu duvido. O filme é muito otimista, pois mostra o início e, não, o fim dos Beatles. Além disso, defende que os membros de uma família, gente que se ama, deve buscar a compreensão, deve aprender a perdoar. E, claro, cumpriu a Bechdel Rule. Eu não tenho como reclamar..

4 pessoas comentaram:

Neste fim de semana li em uma revista este filme como dica e foi quase profidencial ler agora no teu blog sobre. Quero muito assistir!

Valéria, não sei se tem alguma coisa a ver ou se o filme mostra (ainda não o assisti), mas o Paul McCartney perdeu a mãe aos 14 anos de idade. Você acha que pode ser por conta disso que o filme o retrata como um adolescente bastante maduro para a sua idade?

Esse é o principal motivo, sim, Bárbara.

Uma detalhe que eu adorei, apesar de bobo, assim que abre-se a primeiríssima cena do filme, o acorde ilustre de "A Hard Day's Night" toca.

De resto, achei o filme com uma visão imaginativa sobre a personalidade juvenil de John. Os fatos/acontecimentos são reais, mas achei que as personagens foram criações. Especialmente a mãe dele, Julia.. que viagem! Ela é retratada como uma desequilibrada, fogosa e bipolar. Hein? Só pra dar um contraste à Mimi, né? Questão criativa.

As atuações foram saborosas e o figurino/cenografia, então! Um deleite.

Quanto à maturidade de Paul (o ator parece um nenê.. tudo bem que Paul parecesse mesmo um nenê, mas tava DEMAIS), acho que deu essa impressão pelos poucos momentos que escolheram pinçá-lo na estória contada, sempre realçando contrastes (no caso, à figura de John).

Shotton aparecer foi legal.
A sequência do primeiro show, na feira, pra quem lê avidamente biografias da banda, foi memorável.

Correram adoidado o período da faculdade até a ida pra Hamburgo. De Stu e da transfomação filosófica de Lennon na faculdade, nem sombra.

Não acredito que o jovem Lennon soubesse explicitar tão bem o tumulto emocional pelo qual passava frequentemente como o filme tenta mostrar, mas isso é detalhe.

Gostei do filme, mas como apêndice e entretenimento.

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