terça-feira, 4 de maio de 2010

Livro de Fernando Morais vira filme com atores japoneses



Não conheço a obra do diretor, nem li o livro do Fernando Morais sobre a Shindo Renmei, de japoneses que matavam os que ofendiam a honra do Japão ou acreditavam na derrota do país na Segunda Guerra Mundial. Preciso pegar o livro e, bem, assistirei este filme com certeza. A matéria é longa, mas, como era somente para assinantes, coloquei na íntegra no post. É possível ler um trecho do roteiro e íntegra da entrevista com os dois atores japoneses aqui.

"Corações Sujos" vira thriller de amor

Baseado em livro-reportagem de Fernando Morais, filme de ficção tem protagonistas japoneses e será falado em japonês Diretor Vicente Amorim diz que longa não será sobre Shindo Renmei, grupo de nacionalistas, e sim sobre casal de imigrantes

FERNANDA EZABELLA
ENVIADA ESPECIAL A CAMPINAS


A rua é de terra batida e as casas são de madeira. O cheiro é de feno, cocô de cavalo, e o barulho, de grilos. Os habitantes são brasileiros e imigrantes japoneses, numa cidade do interior de São Paulo, em 1946. A tranquilidade, no entanto, será logo perturbada por uma série de assassinatos, trama do filme "Corações Sujos", com estreia prevista para 2011.

"Por incrível que pareça, aqui são as cenas urbanas do filme", diz o diretor Vicente Amorim no set de filmagens, em uma fazenda repleta de construções de época, em Tanquinho, distrito de Campinas. Haverá ainda "cenas rurais" na Fazenda Tozan e outras em Paulínia. O longa-metragem é baseado no livro homônimo de Fernando Morais, sobre um capítulo pouco conhecido e bastante sangrento da história da imigração japonesa no país. O elenco é liderado por japoneses, e o filme será 70% falado em japonês.

Mas, enquanto o livro de Morais é uma investigação da organização nacionalista Shindo Renmei, de japoneses que matavam os que ofendiam a honra do Japão ou acreditavam na derrota do país na Segunda Guerra Mundial, o filme será uma história de amor entre dois imigrantes, com estrutura de thriller e os atentados terroristas como pano de fundo.
"O filme não é sobre a Shindo Renmei", avisa Amorim, diretor do drama "O Caminho das Nuvens" (2003) e da produção internacional "Um Homem Bom" (2008). "Quando resolvi fazer um filme sobre pessoas, e não sobre organizações, a Shindo Renmei deixou de ser importante. Usamos alguns personagens do livro, amalgamamos vários deles e criamos os nossos", continua o diretor, que narra a rotina das filmagens num blog e no Twitter.

Tradução simultânea

O protagonista é Takahashi (Tsuyoshi Ihara), fotógrafo imigrante casado com Miyuki (Takako Tokiwa), professora de uma escola clandestina, já que naquela época, após o Brasil entrar na guerra apoiando os Aliados, ensinar japonês era proibido. Ele é ligado a um grupo de vitoristas -japoneses que acreditam na vitória do Japão- e é convocado para vingar a bandeira do país, depois que um policial brasileiro a usa para limpar a bota. O caso é baseado num episódio verídico e deflagra os assassinatos na colônia, com Takahashi à frente.

A Folha acompanhou um dia das filmagens, quando Miyuki dá milho às galinhas, em estado catatônico, na sequência de um dos crimes do filme. Ela sente que está perdendo o marido, que deixa de ser um japonês pacato e vira um homem extremamente perturbado.

Para dar conta de dirigir os atores japoneses, que nada falam de português, Amorim conta com uma tradutora em cena, Nilva Kurotsu. "Para os jovens que não conheciam [esse capítulo da imigração], o filme será um ponto de partida. Para os que participaram, bom, tem quem não gostaria que tocasse no assunto", disse Nilva.

Atores são celebridades no Japão

DA ENVIADA A CAMPINAS

Esta é a primeira vez que a atriz Takako Tokiwa, 38, e o ator Tsuyoshi Ihara, 46, visitam o Brasil. Ambos sabiam da grande colônia japonesa no país, mas não do episódio retratado em "Corações Sujos", quando imigrantes japoneses passaram a se vingar dos que acreditavam na derrota nipônica na Segunda Guerra. "Ver esse filme será como abrir uma caixa de Pandora para os japoneses", disse Ihara em entrevista por e-mail.

"Teremos a oportunidade de acompanhar um fato histórico que a maioria da nação desconhece. E certamente ficaremos assustados." De acordo com os produtores de "Corações Sujos", ambos são celebridades no Japão, o que deve ajudar a vender o filme no mercado externo. Tokiwa é famosa na TV, enquanto Ihara ganhou mais fama ao fazer "Cartas de Iwo Jima", de Clint Eastwood.

"Ambos ["Corações" e "Cartas'] são sobre a guerra, obviamente. Mas nenhum dos dois, no fundo, a tem como tema principal. São filmes que discutem as escolhas que fazemos durante situações extremas." Tokiwa disse que ficou impressionada com o profissionalismo dos brasileiros. "Nós, atores japoneses, temos uma necessidade muito grande de introspecção antes das cenas. E fomos respeitados." (FE)

Veterano da TV, Ken Kaneko é o único ator japonês residente no Brasil

DA ENVIADA A CAMPINAS

Ken Kaneko, 75, é outro japonês com papel de peso em "Corações Sujos". Mas, ao contrário dos oito conterrâneos do elenco, Kaneko mora há 50 anos no Brasil e já foi visto por aqui em filmes nacionais, programas e comerciais de TV.

Ele veio ao Brasil nos anos 60, como pintor, para participar da Bienal de Artes e outros salões, o que segue fazendo, seja como artista ou curador. No fim dos anos 70, foi chamado para ser cenógrafo de "Gaijin -°Os Caminhos da Liberdade" (1980), de Tizuka Yamasaki, do qual também participou como ator, assim como na continuação, "Gaijin - Ama-me Como Sou" (2005), e filmes dos Trapalhões e programas da Globo. "No meu primeiro trabalho na Globo, eu fiz um contrabandista muambueiro. A sociedade japonesa veio dizer: "Você está fazendo vergonha de japonês". Eles iam me boicotar", lembra, entre risadas. "Mas isso já faz 30 anos, japonês mudou."

Em "Corações Sujos", ele faz o camponês Matsuda. O filme começa em sua casa, numa festa, quando policiais invadem o local, tiram a bandeira japonesa estendida e um deles a usa para limpar a bota. "Sou o único que pode falar duas línguas, às vezes misturo um pouco", diz. "TV sempre debochou de japonês. Esse filme não, mostra a pureza do coração japonês." (FE)

2 pessoas comentaram:

Olha, isso aí é um tabu feio. Mas acho um desperdício transformar em romance o que poderia render uma grande história de ação misturada com thriller político. Os nossos cineastas têm vergonha de cinema de gênero, a ponto de, quando eles tem a oportunidade de mexer nesse tipo de manancial, quererem estragar tudo suavizando com "algo mais", basta ver a desgraça que eles fizeram em "Besouro".

Eu li esse livro duas vezes (dificilmente eu faço isso) e dei uns três de presente... Que bacana!

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