quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Clara e Francisco de Assis no cinema - Post surgido da falta absoluta de notícias



Normalmente não comento aqui (*mas está faltando notícia*), mas eu estudo as franciscanas, já li e falei tanto de Clara e Francisco de Assis que às vezes acho que são meus coleguinhas. Como vai acontecer uma semana de estudos medievais na UnB, o tema é longa duração, e me vejo obrigada a participar, decidi falar sobre as representações de Clara de Assis no cinema, como a santa medieval é apropriada e apresentada. Tenho na minha coleção pessoal quatro filmes sobre Francisco de Assis, sim, porque são sobre ele e não sobre Clara:


1. Francesco, Giullare di Dio (1950) do Roberto Rosselini – Acho de longe a versão mais bonita da vida de Francisco de Assis, muito fiel às fontes, com belíssima fotografia, uma ambientação naturalista (*Idade Média suja*), e interpretações emocionantes. Quer dizer, salvo Clara de Assis que parece uma santa no altar. Um ícone mesmo, branca, fria, distante.


2. Francis of Assisi (1961) do Michael Curtiz – Típico filmão biografia hollywoodiano, feito no momento em que Kennedy tinha sido eleito e era preciso mostrar para o americano médio que os católicos poderiam ser gente boa também. É da mesma leva que nos deu El Cid e O Homem que não Vendeu a sua Alma. Idade Média limpa, baseado em romance, acompanha Francisco nas Cruzadas (*coisa que os outros filmes não fazem ou só citam de passagem*), tem uma Clara (Dolores Hart) muito bonita (*parece uma pin up*) e muito ativa, também. O filme foge das fontes, inventa muita coisa, mas tem uma Clara de Assis muito legal. Detalhe é que a atriz terminou virando freira pouco depois de fazer o filme. Para quem acredita a conversão foi fruto das leituras intensas que ela fez para conhecer mais a personagem.


3. Fratello Sole, Sorella Luna (1972) do Franco Zeffirelli – De todos os filmes sobre Francisco e Clara, porque ela está no título e na capa, acho o mais chatinho. Tudo é tão fofo, tão bonito, tão flower Power que me parece a versão Barbie da vida de Francisco de Assis. Gosto do Franco Zeffirelli, ou melhor, de alguns filmes dele, mas Irmão Sol, Irmã Lua não consegue me convencer e cativar.


4. Francesco (1989) de Liliana Cavani – Esse foi o que eu mais assisti, porque a gente costumava discutir na época da graduação, exibir nas semanas de Idade Média no cinema, e eu geralmente passo para meus alunos na faculdade. Adoro o filme, realista, denunciando as injustiças sociais, com uma Idade Média verossímil, interpretações marcantes e uma Clara próxima daquilo que eu imagino ao ler as fontes, ainda que forcem um pouco ao colocá-la interagindo com os frades. Liliana Cavani também se preocupa em mostrar a angústia espiritual de Francisco. Meus alunos de teologia amam, especialmente a seqüência longuíssima em que Francisco quer ouvir a voz de Deus enquanto escreve a sua regra. Detalhe é que Francisco de Assis foi interpretado – e muito bem – pelo Mickey Rourke, e houve reações insólitas em algumas exibições por causa disso. E Clara é Helena Bonham Carter, quando ela era ótima, não agora quando faz umas interpretações esquisitas como a Bellatrix Lestrange (*a personagem nos livros é muito diferente daquilo que ela faz... muito!*) ou Ana Bolena.
Enfim, mas eu vi alguns meses atrás que a Paulinas tinha lançado um filme chamado Chiara e Francesco. Descobri que é uma série de TV de 2007, portanto bem nova, feita para a TV italiana. Resisti, tentei baixar pela net para ver se prestava, mas não consegui. Daí, mordida de curiosidade, apesar da capinha não ajudar, fui atrás do filme. Como errei o endereço da loja (*todas as livrarias religiosas importantes de Brasília – CPAD, Paulinas, Paulus – parecem se concentrar no mesmo lugar. É típico daqui. Só a Vozes escapa.*), acabei indo parar na Paulus e descobri outro filme sobre Francisco, também feito para a TV italiana, e com um protagonsita bonitão. A capa moderninha com uma foto que parecia que Francisco de Assis estava surfando ou fazendo snow board. Vamos ver se consigo assistir isso depois.
Detectado o erro, achei a Paulinas. Acabei comprando o DVD e levando outro sobre Clara de Assis que estava na promoção. Assisti o de Clara e me arrependi de ter comprado. A produção foi feita ou bancada pelas freiras de São Damião (*o primeiro mosteiro das franciscanas*) e filmado lá. O grande mérito é usar como fonte o processo de canonização. Obviamente, nenhum dos momentos polêmicos está lá. Mas é um filme religioso, com tudo muito posado, estático, elogiando a santidade de Clara do início ao fim, sem angústias, sem grandes conflitos, bem artificial até. E, fiquei pasma, porque vem sem o áudio original italiano ou legendas. E a dublagem é daquelas ruins. Aliás, dublagem brasileira ruim virou quase regra. Mas está na coleção, pode me servir para alguma coisa.
Mas falei, falei, para chegar aqui: Clara e Francisco. Não é que o filme é interessante? É novela e os italianos fazem isso bem, com muita invenção dramática (*mas tudo até agora bem válido*), o tio da Clara promovido à vilão, uma Idade Média não tão suja quanto deveria. Mas o filme mantém com os olhos firmes nas fontes, sem cair na exaltação da santidade desde o ventre. Tanto Clara, quanto Francisco, aliás, mais ele do que ela (SEMPRE) são bem humanos e, por isso mesmo, simpáticos. Não é um Francesco, não é um Giullare di Dio, mas está bom, ou, pelo menos, o primeiro 1/3 de filme foi. Não colocaram a doença de Francisco, ainda não apareceu (*e acho que não vai mesmo*) a irmã caçula de Clara, Beatriz, mas está tudo muito interessante. E o pai e a mãe de Francisco são dois atores ótimos.
Agora o problema. Escolheram para Clara e Francisco um parzinho tão bonito (*o tal Ettore Bassi é mais que bonito, lembra os jogadores da seleção italiana da copa de 1990 que meus colegas do primeiro ano vendiam por preços exorbitantes para as meninas tietes*) que hipnotiza quem assiste e colocaram umas situações tão românticas que fica difícil não imaginar que os dois estejam apaixonados um pelo outro. Eu particularmente não consigo imaginar Clara e Francisco como par romântico, vejo uma amizade e um companheirismo imenso, duas pessoas unidas por um mesmo ideal, serem pobres como Cristo foi pobre em um momento de intensa espiritualidade. Agora, qualquer um que coloque os olhos no par e nas cenas (*até agora*) de Clara e Francisco fica torcendo pelo primeiro beijo. O ar fica carregado de tensão, aquela mesma sensação dos filmes indianos, eu diria. E mais, o primeiro encontro dos dois foi digno de romance Harlequin, com uma Clara menina encontrando, no calor da batalha, um Francisco cavaleiro muito bonito e gentil.
Enfim, escrevi um monte de bobagem, porque não tenho o que postar no blog hoje. E, também, porque precisava comentar. Coloquei o trailer de Clara e Francisco aí no post. Confirmem se não é um Francisco de Assis bonito demais para ser verdade. Aliás, acho que boa parte da energia para produzir esse post veio exatamente da forte impressão que esse sujeito me causou.


12 pessoas comentaram:

Acho que da lista o único que eu vi foi o de 1961 (e eu nem sabia que a atriz tinha virado freira depois do filme O:, interessante isso não?), mas eu não gosto muito de filme religioso, então eu só realmente me interessei pelo filme até metade, antes de ele voltar das cruzadas e encontrar Deus, e aliás eu fiquei com a impressão de que a Clara tinha uma quedinha pelo Francisco, e que o fato dela ter virado freira teve como grande influência o fato do Francisco ter virado Frade D: (mas vai ver eu entendi errado S:).
Quanto ao Franco Zeffirelli, tem horas que ele acerta e horas que ele erra feio, a versão de Romeo e Julieta parece ser muito interessante e verossimia (eu até cheguei a assistir, mas eu nunca achei muita graça na história de Romeo e Julieta, mas o primeiro livro que eu tentei ler na vida foi Romeo e Julieta, então eu acabei odiando a história assim como o livro e isso me afastou da literatura em si por vários anos D:), mas com certeza meu filme favorito dele ainda é Storia di una capinera (não é nada conhecido, mas ainda sim esse filme me emocionou tanto que conseguiu entrar na coleção dos meus filmes favoritos), mas quando eu vi Jane Eyre dele eu não consegui entender como o diretor que conseguiu fazer um filme tão emocionante como o citado acima acabou acabando com a história de Jane Eyre (que por sinal deveria ser melhor e mais emocionante, dado que a história original é melhor), eu não sei, mas eu acabei achando aquele filme uma droga D:.

Mary, se puder assista Francesco da Liliana Cavani. Não é um filme religioso, é um filme sobre uma personagem que segue a vida religiosa. O de 1961 eu acho fraquinho, mas simpático.

Meu filme favorito do Zeffirelli também é Storia di una capinera. Amo, amo, amo. E como aquilo é triste e como o Zeffirelli pode ser Zeffirelli exatamente por causa disso. Haha!

Eu assisti o Jane Eyre dele com grandes expectativas e que fiasco!!!!

Bem, a Clara "real" se inspira em Francisco, disso não há dúvida. Mas se você olhar esse Clara e Francisco... fica parecendo que é paixão, e que os dois se amam mesmo. E o cara que faz o Francisco... Ai, ai...

Fiquei surpresa de ver alguém comentando. :D Valeu. ^_^

Dos citados aqui o unico que lembro de ter visto, a muitooooo tempo atraz, foi justamente Irmão Sol, Irmã Lua.

Mas li muito sobre ele (a Clara quase sempre aparece apenas como parte do contexto), inclusive em um livro sobre os templarios que estou lendo atualmente, é mencionada a ida dele a cruzada.

Sobre o clima romantico da serie italiana, eu só não gosto pq reforça a ideia de que mulheres e homens não podem ser amigos de fato, e tb o cliche do amor sufocado pela religião.

anderson, é essa a idéia que me incomoda também. Amizade entre homens e mulheres não existe. Isso é reforçado o tempo inteiro. No entanto, está além das minhas forças não achar muito bonito esse par do filme italiano.

Mas é como falei. Vejo Clara e Francisco como dois idealistas e grandes amigos. Não percebo nada além disso. Mas saber, saber, só convocando o espírito deles e batendo um papo. ;)

Então, pelo que vc descreveu alem da beleza do casal tem a atmosfera criada na serie. Ai deve ficar dificil mesmo.

E sobre invocar espiritos, me inclua fora dessa ^^

Minha professora orientadora, a primeira, é que costumava brincar com isso quando começava alguém com aquele do "o que fulano pensou quando...". Só assim. ^_^

Dando aula em faculdade teológica não posso brincar com isso. Tenho uma imagem a manter.

Eu tinha um professor de historia que falava algo assim, quando a gente questionava alguma coisa (a gente digo eu e mais 2 ^^), que ele era medium e tinha conversado com fulavo na noite passada.

Tenho espiritas na familia ..alias minha familia é tão ecletica religiosamente falando (e etnicamente tb) que só falta mulçumanas e hindus (e depois da caminhos da india não tenho certeza desse ultimo).

Por motivos óbvios não ligo para o cueca, mas entendo o espírito da coisa. Com uma Clara como essa, não há como um homem possa ser santo.

Alexandre, se quiser te passo o filme depois. Curioso é que a Clara é muito bonita, a mãe da Clara é uma italiana que deveria ter sido uma beldade quando jovem, já para a Inês, irmã de Clara, escolheram uma menina tão diferente que não parece parente. E, claro, não é de longe bonita como as duas.

Sim, verdade. Mas essas coisas dependem muito de testes de filmagem. As vezes o ator "pegou" o personagem melhor do que todo mundo. Mas aí é achismo mesmo.

De repente a menina foi a melhor opção pro papel, pura e simplesmente.

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