segunda-feira, 20 de abril de 2009

Dekasseguis enfrentam choque cultural no retorno ao Brasil



Eu tenho postado aqui algumas matérias sobre a situação dos brasileiros no Japão. Eu acredito que além de informar sobre shoujo e outros artigos culturais, é preciso tratar do mundo real, também. Há uma matéria hoje no G1 - que parece ser parte de uma série - sobre o choque do retorno e os danos especialmente para as crianças. Vale a leitura.
Dekasseguis enfrentam choque cultural no retorno ao Brasil

Efeitos podem levar à depressão e ao suicídio em alguns casos.
Crianças têm dificuldade para se adaptar à escola brasileira.
Marcelo Cabral Do G1, no Paraná

A volta dos dekasseguis ao Brasil não tem apenas um impacto econômico. Após passarem vários anos imersos em uma sociedade com costumes, práticas, regras e tradições diferentes da brasileira, muitos deles enfrentam um choque cultural na hora em que desembarcam no país natal.

O efeito, segundo especialistas, afeta tanto os adultos quanto as crianças e pode ter um final trágico, se não forem adotadas providências a tempo.

“Quando se tem grana no Japão, vive-se muito bem e se tem um padrão de consumo muito elevado. Quando o dekassegui retorna, muitas vezes sem ter guardado nada, ele é obrigado a aceitar uma diminuição em sua renda. Nem todo mundo consegue lidar bem com isso. É um sentimento de derrota, que afeta muitos dos que voltam, explica Cláudio Suzuki, presidente do Instituto Tomodati de Maringá (PR).

“Ao voltar, o dekassegui se decepciona com algumas imagens saudosistas imaginárias que ficaram durante os anos no Japão, como alegria, sol, carnaval e praia. Além disso, nesse período os amigos se mudaram ou criaram outros grupos. Então, ele fica muito isolado, completa Kiyoharu Miike, presidente da Associação Brasileira de Dekasseguis (ABD).

“Houve até casos onde isso afetou a saúde mental das pessoas. Em geral, o dekassegui depende muito que a família dê suporte”, acrescenta.

Síndrome do Regresso

Segundo Estela Okabayashi, diretora da Aliança Cultural Brasil-Japão do Paraná, muitos dekasseguis sofrem da chamada "síndrome do regresso", expressão cunhada pelo psicólogo Décio Nakagawa.

“Ele fica dentro do quarto o tempo todo, isolado. Vai se fechando, com medo de sair, medo de pessoas diferentes, medo de tudo. Não querem mais comer e começam a definhar fisicamente. Sofrem tonturas, náuseas, dores de cabeça”, descreve ela.

“A maioria se nega a fazer terapia, dizendo que é bobagem, que é apenas efeito do fuso horário, mas elas estão na verdade tentando se encontrar. Isso pode levar à depressão profunda e até ao suicídio em alguns casos”, lamenta. De acordo com Estela, o choque gerado pela crise também atinge os brasileiros que ainda não retornaram. “Lá no Japão, os brasileiros são hoje os líderes em criminalidade de delinqüência entre os estrangeiros. Chegaram a haver filas de brasileiros para comer sopa. Agora, cidades e províncias estão criando programas de emergência social para tentar amenizar o problema”, afirma.

Crianças em depressão

Mas os efeitos do choque cultural não se limitam aos adultos. Stella Cristina Fuzii, professora de português em uma escola para dekasseguis em Londrina (PR), se diz especialmente preocupada com as crianças que estudaram por muito tempo em escolas japonesas.

“O problema não é apenas a língua portuguesa, que elas conhecem muito pouco. Elas não tiveram aulas de geografia ou história do Brasil, por exemplo. Quando voltam, essas crianças se dão conta que não sabem nada sobre o Brasil, que não têm quaisquer referências”.

Segundo Stella, os efeitos sobre as crianças são muito acentuados. “Ao perceber essa barreira, a auto-estima baixa e eles podem entrar em depressão. Eles passam a se achar burros, pois não entendem o que é ensinado na escola. Nesse estágio, é necessária a ajuda de psicólogos ou psiquiatras, mas os parentes muitas vezes recusam dizendo que filho não é louco”, analisa.

Quem vivenciou esse problema foi Sílvia – que preferiu omitir o sobrenome -, uma brasileira que ficou no Japão desde 1995, na região de Hamamatsu com o marido e os dois filhos.

Ao voltar para o Brasil ela percebeu que seu filho menor chegava a morder a gola da camisa devido à ansiedade de não entender o que os colegas da escola falavam. Já a filha mais velha fala constantemente em “voltar para casa”, no Japão.

Clima diferente

Além das matérias formais, os especialistas resssaltam a diferença do “clima” entre as crianças nas escolas brasileiras com a formação cultural que se recebe no Japão.

“Pelo contato com a sociedade japonesa, a maioria dessas crianças são muito tímidas, organizadas e formais, ao contrário da maioria dos colegas daqui no Brasil”, diz a professora Stella.

Para Estela Okabayashi, “humildade e respeito à cultura do silêncio são confundidos com timidez e introversão. Muitas entram em depressão, por não entenderem os modos de convívio daqui”.

“Assim, essa é uma geração sem identidade, uma geração de apátridas. No Japão, eles são tratados como estrangeiros, mesmo tendo traços orientais. Aqui, eles também se sentem estrangeiros dentro do próprio país”, diz a diretora da Aliança Cultural.

De acordo com a professora Stella, “muitas crianças acabam tendo que regressar ao Japão, porque não se adaptam mesmo ao Brasil. As famílias com filhos deveriam pensar bem antes de fazer essas constantes viagens entre os países. As crianças são as que mais sofrem”.

2 pessoas comentaram:

Achei a matéria super interessante. Eu sempre pensei no choque cultural que era quando iam pra lá mas jamais tinha pensado na volta, realmente deve ser bem complicado.

Nasci no Japão e vivi 14 anos lá e eu entendo o quanto é difícil.No meu caso eu tive a "sorte" de não ter estudado em escola japonesa,portanto o choque não foi tão grande assim.Mas tenho alguns amigos e parentes que se estabeleceram por lá e não pensam mais em voltar para o Brasil e alguns até compraram casa por lá, mas agora com a crise...

Meus pais ainda estão lá e tiveram de mudar pro apartamento de um parente pra economizar.Há pouco tempo minha mãe veio ao Brasil e ficou chocada com a realidade daqui.Ela me disse que aqui as pessoas tem que "pensar" mais do que no Japão, embora aqui ainda se tenha a vantagem de falar português.

A questão da identidade cultural é um problema que eu também enfrentei,já que no Japão as pessoas me rotulavam de brasileira e aqui muitas vezes quando descobrem que eu morei lá me falam que eu sou japonesa e custam a entender por mais que eu explique.

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