De volta ao lar, dei uma olhada na Época da semana e vi esta matéria sobre o fascínio do Japão. Mais um artigo celebrando os 100 anos de imigração japonesa no Brasil. Para a seção ÍCONES DE UMA PAIXÃO, ir até a página da revista.
O Japão está na moda
No ano do centenário da imigração, cresce o número de jovens não-descendentes que aprendem japonês e consomem desenhos, quadrinhos e games orientais
Tânia Nogueira
O baiano Vagner Pereira, de 21 anos, nunca teve contato pessoal com um japonês ou descendente de japonês. Morador de Salvador, lembra-se, no máximo, de ter tido um colega de escola de origem oriental. Isso não o impede de declarar uma forte identidade com o povo japonês. Pereira diz que tem vários amigos virtuais japoneses e fala com entusiasmo da história e da cultura do Japão. Pereira é exemplo de um comportamento que tem se disseminado Brasil afora: jovens não-descendentes de japoneses que cultuam o País do Sol Nascente. Em todas as capitais, o Japão se tornou mania entre grupos de adolescentes e jovens adultos. Eles comem yakisoba, praticam artes marciais, vestem roupas típicas e procuram imiscuir-se à colônia, freqüentando festas de clubes nipônicos e até feiras tradicionais. Montam comunidades no Orkut em que demonstram seu apreço. A comunidade Amo o Japão e sua cultura tem 32 mil membros.
Em várias cidades do país, feiras e convenções de admiradores dos quadrinhos (mangás) e dos desenhos animados (animes) japoneses atraem milhares de pessoas. A maior delas, a Anime Friends, em São Paulo, reuniu 70 mil pessoas em 2007. Uma das grandes atrações dessas feiras são os “cosplays”: gente comum, na maioria das vezes adulto, que se fantasia de super-herói e age e gesticula como seus personagens favoritos. O evento Tokyogaqui, atualmente em São Paulo, já atraiu mais de 5 mil visitantes em três semanas. Um andar inteiro do Sesc da Avenida Paulista é dedicado à cultura pop japonesa, com mangás, animes, videokês e “cosplayers”. Na semana passada, a bailarina Elisa Ohtake fez uma apresentação intitulada “Fique em silêncio no escuro com um bando de japonesinhos e destrambelhe-se com um bando de japonesinhos”.
O mangá costuma ser a porta de entrada dos ocidentais para a cultura nipônica. Os animes e os games também atraem os jovens. A paixão de Pereira teve início na 5ª série. Um dia, um amigo lhe mostrou uma reportagem sobre animes. Pouco tempo depois, esse mesmo colega lhe deu um mangá. Logo o garoto estava devorando e colecionando histórias sobre guerreiros ninjas, princesas e monstros tenebrosos. “Eu me vejo nas histórias”, diz ele. O rapaz cita Keiratô, personagem do mangá, e o anime Love Hina. O herói luta há três anos para entrar numa universidade federal do Japão. “Os mangás valorizam a luta pelas coisas boas”, diz Pereira, que está tentando entrar na universidade.
Muitos jovens, por sinal, citam a integridade de valores como um dos grandes atrativos não só dos mangás, como da cultura japonesa em geral. Para a pesquisadora Sonia Luyten, que em 1989 defendeu uma tese de doutorado sobre mangás na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (USP), a explicação para o sucesso dos quadrinhos (e da cultura) japoneses é bem menos romântica. “Nos anos 1990, com a economia fortalecida, o Japão investiu pesado na indústria do entretenimento visando à exportação”, diz. “Eles apostaram no tripé quadrinhos, desenhos animados e games. O que vemos hoje é o resultado de uma grande ação de marketing. Jovens do mundo inteiro se interessam pelo Japão.”
Uma vez conquistado pelos mangás, animes e games, o passo seguinte na trajetória dessa febre nipônica costuma ser a ampliação desse interesse para aspectos da cultura tradicional ou da cultura pop do Japão. Uns fãs se envolvem com as artes marciais, outros ficam fanáticos pela música J Pop (estilo que vai de um pseudo-hardcore a um popzinho açucarado).
O que antes parecia um país distante e complicado, para a geração da internet se tornou próximo. Prova disso é o número de não-descendentes que se dedicam ao estudo da língua japonesa. Segundo o Centro Brasileiro de Língua Japonesa (CBLJ), entidade que forma professores do idioma, as escolas de língua japonesa se multiplicaram pelo Brasil. Não estão mais concentradas apenas em São Paulo e no Paraná, onde vive a maior parte da colônia. Hoje, 20 mil pessoas estudam japonês no Brasil, e 30% delas não têm nenhuma ascendência nipônica. Em 1965, eram 22 mil estudantes. “Quase não havia não-descendentes entre eles; só não representavam 0% porque sempre houve um ou outro homem de negócios que precisava da língua”, diz Yoshikazu Niwa, secretário-administrativo do CBLJ. Em algumas regiões, o número de não-descendentes estudando japonês é maior que o de descendentes. Em 2007, a vencedora s do concurso anual de oratória em japonês foi Ivana Soares Bandeira, uma não-descendente de Manaus. Nos testes de proficiência da língua aplicados pelo Centro, 15% dos aprovados são não-descendentes. Segundo Akiko Kurihara, coordenadora pedagógica da Aliança Cultural Brasil-Japão, no bairro da Liberdade, em São Paulo, a maior parte dos alunos não-descendentes estuda para ler os mangás no original.
A imagem pop do Japão surgiu nos anos 80, na era dos yuppies e sua paixão por sushis e ikebanas.
A imagem pop do Japão, que hoje atrai tanto os ocidentais, surgiu nos anos 80. Nessa época, o sushi virou mania. Costureiros japoneses, como Kenzo, começaram a se destacar. Era chique ter ikebana (arranjos florais) em casa, dormir em tatame, tomar saquê. Esse comportamento começou com os yuppies da Bolsa de Nova York e se espalhou pelo mundo. “Depois dos anos 80, a imagem do Japão ficou associada à tecnologia e à cultura pop”, diz Christine Greiner, professora de Comunicação e Semiótica da PUC de São Paulo, autora do livro O Teatro Nô e o Ocidente (Editora Annablume).
“Estamos tendo um revival até dos karaokês”, diz Luís Evandro, diretor do documentário Strangers in the Night, sobre karaokês. Depois de ter sido moda nos 80, o karaokê foi colocado de lado pelos ocidentais durante os anos 90. Hoje, voltou a fazer sucesso. Em clubes da Liberdade, não é raro encontrar modelos, artistas, estilistas. “O brega feito pela pessoa certa vira descolado”, diz Evandro.
Revival dos anos 80 ou resultado de uma ação de marketing, jovens de todo o país citam diferentes razões para seu interesse pelo Japão. A curitibana Kemoly Buco, de 13 anos, passou a prestar atenção à cultura japonesa pouco depois de começar a jogar badminton, há quatro anos, já que há muitos descendentes entre os praticantes do esporte olímpico. Kemoly vai a feiras tradicionais, participa de comunidades na internet, afirma que um dia estudará o idioma e diz que, até hoje, só ficou com meninos japoneses. “Eles são lindos”, diz. “Bonitos por natureza. O formato dos olhos é extremamente charmoso. Além disso, são inteligentes. Sabem conversar sobre vários assuntos.”
Quando um adolescente diz conversar, em boa parte das vezes pode-se ler “teclar”. Há várias comunidades no Orkut de meninas de outras origens que buscam namorados descendentes de japoneses. Foi por meio de uma comunidade dessas que a estudante gaúcha Manuele Peglow, de 17 anos, conheceu o analista de sistemas paulistano Daniel Shim, de 28. Morando na Liberdade, em São Paulo, há cinco anos, Manuele diz que entrou na comunidade Branquinhas & Mestiços/Japas! depois de ir a um encontro real do grupo com uma amiga “louca por japoneses”. “Lá eu fiz amizades”, diz. “Então, entrei na comunidade para manter o contato com as pessoas.” Nessa comunidade, conheceu Daniel e marcou um encontro. Diz que não é o charme dos olhos puxados o que mais a atrai. “Busquei pelo caráter”, afirma. “Os japoneses são queridos. Sérios. Não têm essa história de curtição, de ficar.” Shim concorda. “Essa coisa de a gente ter de fazer sempre tudo o que é certo é muito forte em nossa cultura”, afirma.
Da terceira geração de brasileiros, no entanto, como boa parte dos descendentes dos imigrantes japoneses, Daniel Shim perdeu muitos dos laços com as tradições do país de seus antepassados. Seis anos e meio trabalhando como operário no Japão não o fizeram menos brasileiro. Aprendeu a falar japonês, mas não demonstra interesse especial pela história ou pela cultura do país. Segundo ele, o interesse dos não-descendentes pela comunidade é visível em toda parte. “Quando eu era mais novo, nas baladinhas da colônia não tinha ninguém de fora”, diz. “Hoje, está mais misturado. Diminuiu o preconceito dos dois lados. Mas não parei para pensar no motivo.”
O Japão está na moda
No ano do centenário da imigração, cresce o número de jovens não-descendentes que aprendem japonês e consomem desenhos, quadrinhos e games orientais
Tânia Nogueira
O baiano Vagner Pereira, de 21 anos, nunca teve contato pessoal com um japonês ou descendente de japonês. Morador de Salvador, lembra-se, no máximo, de ter tido um colega de escola de origem oriental. Isso não o impede de declarar uma forte identidade com o povo japonês. Pereira diz que tem vários amigos virtuais japoneses e fala com entusiasmo da história e da cultura do Japão. Pereira é exemplo de um comportamento que tem se disseminado Brasil afora: jovens não-descendentes de japoneses que cultuam o País do Sol Nascente. Em todas as capitais, o Japão se tornou mania entre grupos de adolescentes e jovens adultos. Eles comem yakisoba, praticam artes marciais, vestem roupas típicas e procuram imiscuir-se à colônia, freqüentando festas de clubes nipônicos e até feiras tradicionais. Montam comunidades no Orkut em que demonstram seu apreço. A comunidade Amo o Japão e sua cultura tem 32 mil membros.
Em várias cidades do país, feiras e convenções de admiradores dos quadrinhos (mangás) e dos desenhos animados (animes) japoneses atraem milhares de pessoas. A maior delas, a Anime Friends, em São Paulo, reuniu 70 mil pessoas em 2007. Uma das grandes atrações dessas feiras são os “cosplays”: gente comum, na maioria das vezes adulto, que se fantasia de super-herói e age e gesticula como seus personagens favoritos. O evento Tokyogaqui, atualmente em São Paulo, já atraiu mais de 5 mil visitantes em três semanas. Um andar inteiro do Sesc da Avenida Paulista é dedicado à cultura pop japonesa, com mangás, animes, videokês e “cosplayers”. Na semana passada, a bailarina Elisa Ohtake fez uma apresentação intitulada “Fique em silêncio no escuro com um bando de japonesinhos e destrambelhe-se com um bando de japonesinhos”.
O mangá costuma ser a porta de entrada dos ocidentais para a cultura nipônica. Os animes e os games também atraem os jovens. A paixão de Pereira teve início na 5ª série. Um dia, um amigo lhe mostrou uma reportagem sobre animes. Pouco tempo depois, esse mesmo colega lhe deu um mangá. Logo o garoto estava devorando e colecionando histórias sobre guerreiros ninjas, princesas e monstros tenebrosos. “Eu me vejo nas histórias”, diz ele. O rapaz cita Keiratô, personagem do mangá, e o anime Love Hina. O herói luta há três anos para entrar numa universidade federal do Japão. “Os mangás valorizam a luta pelas coisas boas”, diz Pereira, que está tentando entrar na universidade.
Muitos jovens, por sinal, citam a integridade de valores como um dos grandes atrativos não só dos mangás, como da cultura japonesa em geral. Para a pesquisadora Sonia Luyten, que em 1989 defendeu uma tese de doutorado sobre mangás na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (USP), a explicação para o sucesso dos quadrinhos (e da cultura) japoneses é bem menos romântica. “Nos anos 1990, com a economia fortalecida, o Japão investiu pesado na indústria do entretenimento visando à exportação”, diz. “Eles apostaram no tripé quadrinhos, desenhos animados e games. O que vemos hoje é o resultado de uma grande ação de marketing. Jovens do mundo inteiro se interessam pelo Japão.”
Uma vez conquistado pelos mangás, animes e games, o passo seguinte na trajetória dessa febre nipônica costuma ser a ampliação desse interesse para aspectos da cultura tradicional ou da cultura pop do Japão. Uns fãs se envolvem com as artes marciais, outros ficam fanáticos pela música J Pop (estilo que vai de um pseudo-hardcore a um popzinho açucarado).
O que antes parecia um país distante e complicado, para a geração da internet se tornou próximo. Prova disso é o número de não-descendentes que se dedicam ao estudo da língua japonesa. Segundo o Centro Brasileiro de Língua Japonesa (CBLJ), entidade que forma professores do idioma, as escolas de língua japonesa se multiplicaram pelo Brasil. Não estão mais concentradas apenas em São Paulo e no Paraná, onde vive a maior parte da colônia. Hoje, 20 mil pessoas estudam japonês no Brasil, e 30% delas não têm nenhuma ascendência nipônica. Em 1965, eram 22 mil estudantes. “Quase não havia não-descendentes entre eles; só não representavam 0% porque sempre houve um ou outro homem de negócios que precisava da língua”, diz Yoshikazu Niwa, secretário-administrativo do CBLJ. Em algumas regiões, o número de não-descendentes estudando japonês é maior que o de descendentes. Em 2007, a vencedora s do concurso anual de oratória em japonês foi Ivana Soares Bandeira, uma não-descendente de Manaus. Nos testes de proficiência da língua aplicados pelo Centro, 15% dos aprovados são não-descendentes. Segundo Akiko Kurihara, coordenadora pedagógica da Aliança Cultural Brasil-Japão, no bairro da Liberdade, em São Paulo, a maior parte dos alunos não-descendentes estuda para ler os mangás no original.
A imagem pop do Japão surgiu nos anos 80, na era dos yuppies e sua paixão por sushis e ikebanas.
A imagem pop do Japão, que hoje atrai tanto os ocidentais, surgiu nos anos 80. Nessa época, o sushi virou mania. Costureiros japoneses, como Kenzo, começaram a se destacar. Era chique ter ikebana (arranjos florais) em casa, dormir em tatame, tomar saquê. Esse comportamento começou com os yuppies da Bolsa de Nova York e se espalhou pelo mundo. “Depois dos anos 80, a imagem do Japão ficou associada à tecnologia e à cultura pop”, diz Christine Greiner, professora de Comunicação e Semiótica da PUC de São Paulo, autora do livro O Teatro Nô e o Ocidente (Editora Annablume).
“Estamos tendo um revival até dos karaokês”, diz Luís Evandro, diretor do documentário Strangers in the Night, sobre karaokês. Depois de ter sido moda nos 80, o karaokê foi colocado de lado pelos ocidentais durante os anos 90. Hoje, voltou a fazer sucesso. Em clubes da Liberdade, não é raro encontrar modelos, artistas, estilistas. “O brega feito pela pessoa certa vira descolado”, diz Evandro.
Revival dos anos 80 ou resultado de uma ação de marketing, jovens de todo o país citam diferentes razões para seu interesse pelo Japão. A curitibana Kemoly Buco, de 13 anos, passou a prestar atenção à cultura japonesa pouco depois de começar a jogar badminton, há quatro anos, já que há muitos descendentes entre os praticantes do esporte olímpico. Kemoly vai a feiras tradicionais, participa de comunidades na internet, afirma que um dia estudará o idioma e diz que, até hoje, só ficou com meninos japoneses. “Eles são lindos”, diz. “Bonitos por natureza. O formato dos olhos é extremamente charmoso. Além disso, são inteligentes. Sabem conversar sobre vários assuntos.”
Quando um adolescente diz conversar, em boa parte das vezes pode-se ler “teclar”. Há várias comunidades no Orkut de meninas de outras origens que buscam namorados descendentes de japoneses. Foi por meio de uma comunidade dessas que a estudante gaúcha Manuele Peglow, de 17 anos, conheceu o analista de sistemas paulistano Daniel Shim, de 28. Morando na Liberdade, em São Paulo, há cinco anos, Manuele diz que entrou na comunidade Branquinhas & Mestiços/Japas! depois de ir a um encontro real do grupo com uma amiga “louca por japoneses”. “Lá eu fiz amizades”, diz. “Então, entrei na comunidade para manter o contato com as pessoas.” Nessa comunidade, conheceu Daniel e marcou um encontro. Diz que não é o charme dos olhos puxados o que mais a atrai. “Busquei pelo caráter”, afirma. “Os japoneses são queridos. Sérios. Não têm essa história de curtição, de ficar.” Shim concorda. “Essa coisa de a gente ter de fazer sempre tudo o que é certo é muito forte em nossa cultura”, afirma.
Da terceira geração de brasileiros, no entanto, como boa parte dos descendentes dos imigrantes japoneses, Daniel Shim perdeu muitos dos laços com as tradições do país de seus antepassados. Seis anos e meio trabalhando como operário no Japão não o fizeram menos brasileiro. Aprendeu a falar japonês, mas não demonstra interesse especial pela história ou pela cultura do país. Segundo ele, o interesse dos não-descendentes pela comunidade é visível em toda parte. “Quando eu era mais novo, nas baladinhas da colônia não tinha ninguém de fora”, diz. “Hoje, está mais misturado. Diminuiu o preconceito dos dois lados. Mas não parei para pensar no motivo.”
2 pessoas comentaram:
Oi Valéria! Adorei a matéria! Aliás, adoro seu blog. Visito há puco tempo, mas vejo sempre que possível!
Também não tenho nenhuma descendência niponica, mas adoro tudo que se remeta ao Japão, principalmente os mangás, animes e as músicas!!!
Parabéns pelo blog!!!
Muito interessante essa matéria.
Já tinha lido sobre o investimento do Japão no marketing.
Parabéns!
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