Semana passada, graças a um equívoco da Livraria Cultura, eu comprei o meu primeiro Harlequin. Não, não foi um romance de banca... não mandaria importar essas coisas... Eu tinha sondado o preço da versão mangá publicada pela Dark Horse do livro Harlequin "Holding on to Alex". Quando vi as críticas na internet, decidi não comprar, não confirmei o pedido, mas a Cultura trouxe assim mesmo e minha curiosidade foi maior.
Começarei com as partes positivas... A arte é muito boa, foi esse um dos motivos pelos quais o mangá tinha me chamado a atenção, dentre os outros da coleção. A desenhista japonesa, Misao Hoshiai, é o que dá algum alento ao mangá. Ela não é nenhuma Kyouko Ariyoshi, a autora do magnífico Swan, mas não faz feio. A idéia de usarem tinta violeta em toda a arte do mangá também é legal. Explicando, a coleção Harlequin da Dark Horse é dividida por cores, suponho que as outras também usem este recurso. Bem, terminaram os elogios...
A primeira coisa a pontuar é que o mangá é mais fino que a média americana e custa o mesmo preço. Não recomendo, então trocar uma edição americana de um mangá de primeira linha, por coleção Harlequin... Só para afixionados, em especial para os fãs da autora do romance, Margaret Way. Falando da história em si, a primeira coisa a pontuar é que ela parece saída do backlash do pós-Segunda Guerra, com todo o machismo grosseiro travestido de romantismo que pode enganar a alguns, mas que, no fim das contas só visam transformar as mulheres em "rainhas do lar", fazendo com que elas larguem suas carreiras e abram espaço para que os homens possam crescer e brilhar sozinhos. E que fique bem claro que quem define o que é "ser rainha" é o homem, o senhor do castelo, e que você é uma mulher má se não aceitar direitinho esse papel. Ainda tentei relevar, imaginei que o livro pudesse ter uns trinta, quarenta anos, mas quando chequei a data do livro, 1997, não deu. Quando encontrar qualquer coisa assinado por essa Senhora (*será que é mulher mesmo?*), Margaret Way, eu passo longe.
Mas vamos ao que interessa, a história! Austrália, fazenda riquíssima bem longe das grandes cidades, jogos de pólo (*assim, coisa no melhor estilo novela podre do Manoel Carlos*), uma heroína órfã de nome Alex, e o objeto do desejo do sete anos mais velho, Scott. Alex é adotada aos dez anos pela tia de Scott que também o criou. Scott, o herdeiro de tudo, trata a moça como irmãzinha, até que ela cresce, ele percebe, os dois começam a namorar, transam e ele propõe que se casem em um mês, afinal, ele a escolheu para ser SUA RAINHA. Que honra, não? Começa aí o drama.
Alex quer ser bailarina clássica, tem talento e está com uma audição marcada em Sidney. O apaixonadíssimo Scott a chama de traidora, mulher sem coração, diz que ela está trocando o amor dele e da tia idosa pela fama e fortuna, que Sidney é muito longe, que ele jamais a perdoará, etc, etc. Só faltou bater nela. Engraçado é que ele até diz que ela está fazendo isso para "competir com ele", mostrar que pode ter uma carreira sem ele. Tão fofo, né? Nenhuma sombra de insegurança, machismo ou egoísmo. Detalhe, o cara tem um jatinho, Sidney deve ficar a meia hora da fazendinha dele...
Alex não recua, vira uma grande bailarina. Três anos depois, a tragédia (*Castigo Divino?*): ela sofre um acidente no palco, rompe os ligamentos, quebra o tornozelo e vai ter que enfrentar uma longa recuperação. Daí, aparece o tal Scott para buscá-la "por ordem da tia" para que ela se recupere na fazenda. Ele a trata mal, diz que está de casamento marcado com uma mulher que merece tudo o que ele tem a oferecer e aceita ser "sua rainha". Muito doce, né? Nossa Alex, de míseros 23 aninhos, começa a se questionar sobre o fato de ter jogado, por egoísmo, sua ÚNICA chance de ser feliz fora. Afinal, Scott era seu DESTINO e a amava.
Não preciso dizer que Alex se recupera, Scott mostra um ciúme doentio pelo fisioterapeuta e de tudo que não seja "ele" na vida da moça, eles reatam, ele chuta a noiva fútil (*assim, sem maiores cuidados*), a mulher rejeitada tenta matar Alex, ela se salva graças ao seu talento como bailarina (*dá um grande salto e cai nos braços de Scott*). Ele propõe casamento de novo, diz que precisa de uma mulher "forte" como ela para gerir a fazenda. Ela não pensa duas vezes, aceita e diz que pode dançar ali mesmo... Onde?! Deve estar se referindo a sala de estar ou ao quarto de dormir, tamanho o ciúme do sujeito.
Enfim, se isso é o padrão Harlequin de herói sexy e heroína independente, eu rejeito. Obviamente, estarei sendo preconceituosa, afinal, o livro foi muito enxugado para caber no mangá... Mas se a mensagem é essa, não mudou muito. E é de 1997!!!! Até o filme Sinfonia Interrompida, que tem semelhanças de plot (*a heroína é australiana, é cantora lírica, o marido a chantageia para que ela largue a carreira porque a dele é muito mais importante, ela fica aleijada, etc*) com esse livro, me parece mais moderno e tem um protagonista menos machista. Só para constar, o filme é de 1955.
Bem, como umas amigas falam muito bem desses livros, decidi dar outra chance, afinal, são muitas autoras, essa Margaret Way pode ser um dos ovos podres. Dei preferência para um que tivesse o selo Harlequin na capa, embora eu saiba que a maioria pertence à editora. Enfim o título é "Por Amor ou Por Justiça" (Wild Justice) e a autora é Gail Ranstrom. Como meu tempo é curto e não devo carregá-lo para ler no ônibus, não sei quanto tempo levarei para terminar. Se me decepcionar de novo, muito provavelmente consolido minha visão negativa a respeito desse tipo de literatura. E mais, torcerei para que mangás Harlequin não saiam por aqui, pois vai que coisas como "Holding on to Alex" viram sinônimo de shoujo mangá na cabeça de um monte de gente.
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